Missa do 5º dom.
quaresma. Palavra de Deus: Ezequiel 37,12-14; Romanos 8,8-11; João 11,1-45.
A pandemia do novo coronavírus tem
nos colocado diante da realidade da morte. Segundo site da BBC, até na manhã do dia 26 deste mês o novo coronavírus havia deixado 22.038 mortos em todo o mundo, sendo que 487.985 pessoas estão infectadas em todo o mundo. Exatamente diante desse contexto, a Palavra de Deus nos traz uma
promessa: “Ó meu povo, vou abrir as vossas sepulturas... e quando eu abrir as
vossas sepulturas e vos fizer sair delas, sabereis que eu sou o Senhor” (Ez
37,12-13). A ciência e a tecnologia têm os seus limites. A inteligência e o
poder humanos têm os seus limites. O dinheiro tem os seus limites. Esse limite
se chama “sepultura”. Ali está – ou estava? – o ponto final da história de cada
ser humano.
Quando o povo de Israel se sentia
morto em sua esperança, no exílio da Babilônia, Deus lhe enviou o profeta
Ezequiel para ressuscitá-lo na fé e na esperança. A sepultura será aberta, o
que foi enterrado será desenterrado, o que morreu ressuscitará! De fato, com a
ascensão de Ciro, o rei persa, o poder destrutivo da Babilônia foi desfeito e o
povo de Israel pôde voltar à sua terra, reconstruir o seu país e voltar a
viver. Foi, sem dúvida, uma espécie de ressurreição.
Mas a profecia de Ezequiel não se
resumia a uma simples retomada da vida terrena. Ela apontava para algo muito
maior, algo que só pudemos conhecer e experimentar na pessoa de Jesus Cristo,
nosso salvador. Desse modo, o Evangelho nos fala do amor de Jesus por três
irmãos: Marta, Maria e Lázaro, um amor tão profundo que a doença de Lázaro é
comunicada a Jesus com essas palavras: “Senhor, aquele que amas está doente”
(Jo 11,3). De muitas partes do mundo tem subido ao céu essa oração. Muitos
estão doentes; muitos estão com câncer; muitos estão contaminados com o covid
19; muitos estão adoecidos mentalmente... Talvez a nossa oração hoje seja esta:
“Senhor, a humanidade, a qual tanto amas, está doente!”
As doenças nos impõem uma urgência.
Precisamos rapidamente de cura! A ciência e a medicina trabalham na urgência de
encontrarem um tratamento, uma cura, uma vacina para o covid 19. Mas, apesar da
urgência da cura para Lázaro, “Jesus ficou ainda dois dias no lugar onde se
encontrava” (Jo 11,6). Essa estranha atitude de Jesus nos ensina que nossas
urgências não têm o poder de pressionar Deus. Ele age no tempo certo, no
momento exato, momento estabelecido segundo o seu desígnio de amor e salvação
para cada ser humano. Além disso, Jesus permite que Lázaro morra para nos dizer
que ele não veio alterar o curso natural da vida. “Se temos esperança em Cristo
somente para esta vida, somos os mais dignos de compaixão de todos os homens”
(1Cor 15,19).
Nossa fé e nossa esperança em Cristo
não podem parar na morte, nem muito menos serem enterradas dentro de uma
sepultura. Cristo tem, sem dúvida, o poder de curar, de intervir e de impedir a
morte, mas, ainda que Ele decida não fazê-lo, nós continuaremos a crer e a
afirmar que a nossa esperança n’Ele vai muito além de uma cura física, muito
além de alguns anos a mais que Ele nos permita viver neste mundo. Nossa
esperança em Cristo é a ressurreição, a vida eterna! Eis porque Jesus disse
abertamente aos seus discípulos: “Lázaro está morto. Mas por causa de vós,
alegro-me por não ter estado lá, para que creiais” (Jo 11,14-15). Jesus não
impediu a morte de Lázaro por nossa causa, para que quando a morte atingir o
nosso corpo, ela não atinja a nossa alma, a nossa fé e a nossa esperança em
Cristo!
“Quando Jesus chegou, encontrou
Lázaro sepultado havia quatro dias” (Jo 11,17). Para um judeu conhecedor da
Sagrada Escritura, a esperança durava, no máximo, até o terceiro dia após a
morte (cf. Os 6,2). O “quarto dia” é o sepultamento definitivo da esperança. Quantos
de nós estamos vivendo o “quarto dia” naquilo que diz respeito ao
relacionamento afetivo ou à intervenção de Deus em alguma situação de crise, de
sofrimento, de destruição? Para quantas pessoas na face da terra o “quarto dia”
já aconteceu? A morte da pessoa amada, o fim do casamento, a sequela provocada
por um acidente são fatos consumados... São marcas que jamais serão apagadas da
suas histórias de vida.
No entanto, Aquele que fala conosco
no Evangelho de hoje é o mesmo que disse a Marta: “Teu irmão ressuscitará... Eu
sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, mesmo que morra, viverá” (Jo
11,23.25). Não há “quarto dia” que impeça Jesus de agir. Não há acontecimento
nesta vida que não tenha sido alcançado pela morte e ressurreição de nosso
Senhor. Assim, Jesus pergunta a respeito da sepultura de Lázaro: “Onde o
colocastes?” Responderam: “Vem ver, Senhor”. E Jesus chorou (Jo 11,34-35). Hoje
somos nós que precisamos dizer a Jesus onde sepultamos nossa fé e nossa
esperança; onde enterramos nossos sonhos e nossa alegria. Precisamos levar
Jesus até nossas sepulturas e permitir que Ele chore diante delas. Sim, Jesus
chora junto com a humanidade que chora. Jesus chora a morte não só de tantos
inocentes, mas também daqueles que morreram por terem levado uma vida
autodestrutiva. Mas as lágrimas de Jesus têm o poder de penetrar o chão duro da
nossa existência e despertar dentro dele a vida que adormece profundamente, a
vida que precisa ser acordada!
Ao
chegar diante do túmulo de Lázaro, Jesus disse: “Tirai a pedra!”... Tiraram
então a pedra. Jesus levantou os olhos para o alto e disse: “Pai, eu te dou
graças porque me ouviste. Eu sei que sempre me escutas...”. Tendo dito isso,
exclamou com voz forte: “Lázaro, vem para fora!” (Jo 11,43). Jesus nos convida
hoje a retirarmos a pedra, a abrirmos uma passagem para que a ressurreição da
nossa fé, da nossa esperança e do nosso amor aconteça. Sua palavra precisa de alguma
abertura da nossa parte, para que possa chegar àquilo que enterramos dentro de
nós. Ao mesmo tempo, Ele nos envia ao mundo para que possamos dizer às pessoas
que decidiram se enterrar vivas: “Venham para fora!” Hoje Jesus diz à Itália e
aos inúmeros outros países atingidos pelo coronavírus: “Venha para fora!” Venha
para fora o teu amor, a tua solidariedade! Venha para fora a tua consciência de
ser frágil e mortal! Venham para fora as tuas lágrimas e o teu cuidado com a
própria vida e com a vida do teu semelhante!
Ao
final desta reflexão, recordemos essa verdade tão importante, revelada pelo
apóstolo Paulo: nosso corpo está “ferido de morte por causa do pecado”, mas
nosso espírito “está cheio de vida, graças à justiça”, isto é, graças à
justificação que Cristo nos concedeu na sua cruz. Enquanto estivermos neste
mundo terreno, teremos que lidar com a doença e a morte, mas não nos deixaremos
abater, pois cremos na força do Espírito Santo que nos habita. “E, se o
Espírito daquele que ressuscitou Jesus dentre os mortos mora em vós, então
aquele que ressuscitou Jesus Cristo dentre os mortos vivificará também vossos
corpos mortais por meio do seu Espírito que mora em vós” (Rm 8,11).
Pe.
Paulo Cezar Mazzi
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