Missa do 2º dom. quaresma 2020. Palavra
de Deus: Gênesis 12,1-4a; 2Timóteo 1,8b-10; Mateus 17,1-9.
Nosso rosto expressa nosso estado de
espírito: se estamos alegres ou tristes, animados ou desanimados, firmados na
esperança ou entregues ao desespero, confiantes em Deus ou sentindo-nos
abandonados a nós mesmos, tudo isso fica visível em nosso rosto. Além disso,
nosso corpo também fala: nossa postura e nosso estado de saúde física expressam
como estão nossas emoções.
Antes de presenciarem a
transfiguração de Jesus, antes de verem seu rosto e seu corpo radiantes de luz,
Pedro, Tiago e João estavam desfigurados devido a medo, preocupação, angústia e
até mesmo a um certo desânimo. Jesus lhes havia advertido a respeito do
sofrimento de cruz que o esperava em Jerusalém (cf. Mt 16,21), além de
torná-los conscientes de que, se quisessem ser seus discípulos, eles também
teriam que renunciar a si mesmos, tomarem cada um a sua própria cruz e segui-Lo
(cf. Mt 16,24). Essas palavras de Jesus jogaram um banho de água fria nos
discípulos, a ponto de deixá-los desfigurados.
Mas não são apenas os sentimentos
“negativos”, por assim dizer, que nos desfiguram, isto é, que fazem nosso rosto
e nosso corpo expressarem pessimismo perante a vida. No mundo de hoje há
situações concretas que desfiguram a vida de muitas pessoas, como doenças,
desemprego, fome, violência, drogas, perda de sentido da vida, conflitos,
separações, luto etc. Contudo, Jesus quer chamar a nossa atenção para a maneira
como lidamos com esses problemas, além de nos convidar a ser uma presença de
transfiguração na vida das pessoas que estão desfiguradas à nossa volta.
A transfiguração de Jesus se deu
sobre uma alta montanha. Essa alta montanha não se refere somente a um lugar,
mas a uma atitude: desde o Antigo Testamento, a montanha se tornou o lugar onde
o homem encontra Deus. Jesus, ao subir à montanha com Pedro, Tiago e João, quis
ensiná-los a interpretar os acontecimentos da própria vida à luz de Deus.
Diante de todo acontecimento que nos perturba, tira a nossa paz e nos enche de
angústia, precisamos nos colocar na presença de Deus e pedir a sua luz, sabendo
que Ele faz com que tudo concorra para o nosso bem quando o amamos (cf. Rm
8,28). Até mesmo as coisas ruins podem servir aos propósitos de Deus em vista
da nossa salvação!
Na medida em que, como Jesus, buscamos em Deus
uma interpretação mais profunda para a situação que estamos enfrentando, uma
luz começa a surgir dentro de nós e vai tomando conta de tudo, modificando o
nosso estado emocional e físico. Desse modo, o nosso rosto, que antes
expressava medo e angústia, agora irradia paz e confiança. Essa luz que
transfigurou Jesus serviu para que os três discípulos enxergassem que, por
detrás da desfiguração que Jesus sofreria na cruz, estava a transfiguração da
ressurreição. Isso significa que não devemos nos assustar com situações que num
primeiro momento nos desfiguram – elas são como dores de parto, para fazerem
vir à luz o nosso melhor, para que em meio à nossa maior escuridão brilhe a luz
da presença de Deus que tudo transforma.
Embora não entendessem ao certo o
que estava acontecendo, Pedro, Tiago e João foram envolvidos por uma nuvem
luminosa. Essa imagem já apareceu no Antigo Testamento como sinal visível da
presença de Deus junto ao seu povo, quando este saiu do Egito em direção à
Terra Prometida. A nuvem luminosa ia à frente do povo, clareando e indicando o
caminho (cf. Ex 13,21). Pela transfiguração de Jesus, Deus quer nos ensinar que
uma existência feita dom, como a de Jesus, não é fracassada – mesmo se termina
na cruz. A vida plena e definitiva espera, no final do caminho, todos aqueles
que, como Jesus, forem capazes de colocar a sua vida ao serviço dos irmãos.
Estando os três discípulos envolvidos
pela nuvem luminosa, a voz de Deus se pronuncia: “Este é o meu Filho amado, em
quem me comprazo. Escutai-o!” (Mt 17,5). Só existe um caminho que torna
possível transformar nossa desfiguração em transfiguração: escutar Jesus.
Devemos escutá-lo, seja quando nos fala a partir nossas das vitórias – momentos
de transfiguração – seja quando nos fala a partir dos nossos fracassos –
momentos de desfiguração; seja quando nos fala enquanto Crucificado como quando
nos fala enquanto Ressuscitado.
O próprio Jesus, vendo os discípulos
muito assustados, caídos com o rosto por terra, “chegou perto deles e,
tocando-os, disse: ‘Levantai-vos e não tenhais medo’” (Mt 17,7). Não devemos
ter medo quando enfrentamos momentos de desfiguração, pois Jesus nos toca para
infundir em nós força e confiança. Como cristãos, continuaremos a ser atingidos
pela sombra escura da desfiguração que pesa sobre todos os homens, mas não
temos medo e não desanimamos, porque mantemos os nossos olhos fixos na meta da
nossa vida cristã, que é o encontro com Cristo transfigurado. Ele, que “não só destruiu
a morte, como também fez brilhar a vida e a imortalidade por meio do Evangelho”
(2Tm 1,10), “transfigurará nosso corpo humilhado, conformando-o ao seu corpo
glorioso, pela força que lhe dá poder de submeter a si todas as coisas” (Fl
3,21). É nessa verdade que repousam a nossa fé e a nossa esperança, princípios
da nossa transfiguração espiritual.
Oração: Senhor Jesus, hoje Tu me
convidas a subir contigo à montanha, para apresentar a Deus aquilo que
desfigura a minha vida e a vida da humanidade. Perdoa-me pelas vezes em que
minha fé e minha esperança se desfiguraram ao me deparar com a cruz que cabia a
mim enfrentar. Ainda que eu tenha que caminhar em meio a situações de
escuridão, que a luz gloriosa da Tua face resplandeça sobre mim e me mantenha
firme na certeza de que a doação da minha vida em favor da humanidade é
fundamental para que ela seja transfigurada. Que a nuvem luminosa da presença
do Pai se faça sentir na vida de toda pessoa que se encontra desfigurada neste
momento. Que a Tua voz de Ressuscitado possa ecoar em mim e, por meio de mim,
em todas as situações que necessitam conhecer a vida e a imortalidade do
Evangelho. Com firme confiança eu aguardo pela Tua vinda gloriosa, momento em
que meu corpo humilhado será transfigurado e conhecerá a verdade da
ressurreição e da vida eterna. Amém!
Pe. Paulo Cezar
Mazzi
obrigado, P. Paulo, pelos comentários muito pertinentes por serem muito existenciais e iluminadores de nosso itinerário com o olhar fixo em Jesus
ResponderExcluirPor nada, querido irmão. Deus o abençoe! Forte abraço!
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