quinta-feira, 23 de maio de 2019

NÃO DEFENDER-SE DA VIDA, MAS SIM DAQUILO QUE NOS INTIMIDA PERANTE A VIDA


Missa do 6º. dom. da Páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 15,1-2.22-29; Apocalipse 21,10-14.22-23; João 14,23-29.

            O ventre da mãe que ama o filho que está gerando é um lugar confortável e seguro, mas chega o momento em que o filho precisa deixar o conforto e a segurança do ventre materno e vir ao mundo, para percorrer o caminho que foi chamado a percorrer e realizar a missão para a qual foi chamado à existência. Enquanto a indústria da propaganda e do consumo, associadas à tecnologia, nos vendem produtos que prometem tornar a nossa vida sempre mais confortável, os psicólogos e palestrantes sobre motivação e liderança nos ensinam que, se quisermos crescer, temos que sair da nossa “zona de conforto”, pois ela é o maior obstáculo ao nosso amadurecimento humano e espiritual.
            Jesus está se despedindo dos seus discípulos. Ele vai voltar ao Pai e de lá enviar o Espírito Santo à sua Igreja. Justamente por ser um momento difícil para os discípulos, Jesus lhes diz: “Não se perturbe nem se intimide o vosso coração” (Jo 14,27). É como se Jesus nos dissesse: ‘Eu escolhi e formei vocês como meus discípulos não para ficarem perturbados e intimidados pelos conflitos que terão que enfrentar no mundo, mas justamente para que vocês encarem a realidade e enfrentem os desafios como pessoas que estão abertas ao crescimento, ao amadurecimento, como pessoas que desejam viver a vida com realismo, intensidade e profundidade, e não fugir dela’. O discípulo de Jesus não é alguém alienado, que vive uma espiritualidade que o afasta da realidade e que o mantém distante do sofrimento das pessoas à sua volta; pelo contrário, o discípulo de Jesus é alguém que se deixa questionar pela realidade para perceber nela o que Deus está lhe dizendo e realizar plenamente a sua missão.
            Por mais estranho que pareça, Jesus está dizendo aos discípulos que chegou a hora de fazer uma inversão. Até agora, eles estavam sendo gestados no coração do Pai e do Filho, mas a hora do parto está chegando e ela trará uma mudança importante: o Pai e o Filho passarão a habitar o coração dos discípulos por meio do Espírito Santo, capacitando-os assim para a missão. É por isso que Jesus diz: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e o meu Pai o amará, e nós viremos e faremos nele a nossa morada” (Jo 14,23). Deus não quer apenas estar perto de nós ou junto a nós; Ele deseja habitar em nós, morar em nosso coração, no coração de cada ser humano. E quando o Pai e o Filho habitam no coração humano, ele se torna pleno de paz.  
            “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; mas não a dou como o mundo” (Jo 14,27). A paz que o mundo nos promete depende de inúmeras condições externas: se tivermos saúde e dinheiro, se formos notados e valorizados pelos outros, se não tivermos dificuldades ou obstáculos, se não houver inimigos a combater e problemas a resolver, só então experimentaremos paz. Mas a paz de Jesus não depende de nenhuma circunstância externa; ela é fruto da harmonia interna conosco mesmos, com a nossa verdade e com a vontade de Deus. Santo Agostinho dizia que o nosso coração foi feito para Deus e só achará paz quando estiver em Deus. Quando o Pai e o Filho habitam em nós, nenhum acontecimento externo tira a nossa paz, mesmo porque o Pai e o Filho nos orientam e nos fortalecem diante dos desafios que a vida nos apresenta. Além disso, lembremos do discernimento de Santo Inácio de Loyola a respeito da paz: sempre que alinhamos o nosso coração à vontade de Deus, nos sentimos em paz; sempre que nos afastamos da vontade de Deus, a paz vai embora e no lugar dela vêm a perturbação, a inquietação, a ansiedade e o medo.  
            O Tempo Pascal caminha para o seu final e se encerrará com a festa de Pentecostes, na qual se deu a vinda do Espírito Santo. Por isso, hoje acolhemos com alegria esta promessa de Jesus: “o Defensor, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará tudo e vos recordará tudo o que eu vos tenho dito” (Jo 14,26). Jesus chama o Espírito Santo de “Defensor”, no sentido de que Ele estará sempre ao nosso lado nas lutas do dia a dia, orientando-nos, protegendo-nos, fortalecendo-nos. Aqui é oportuno recordar a palavra do apóstolo Paulo a Timóteo: “Deus não nos deu um espírito de medo, mas um espírito de força, de amor e de autodomínio” (2Tm 1,7). Justamente porque não é um espírito de medo, mas de força, o Defensor que Jesus nos prometeu não nos defenderá daquilo que temos que enfrentar, mas nos encherá de coragem e nos lançará para frente, para superarmos os obstáculos e continuarmos em nosso caminho de crescimento, de amadurecimento, de libertação e de santificação.   
Todo ser humano, mas sobretudo todo cristão, tem um combate a combater, e não se trata apenas de um combate em vista da sobrevivência neste mundo, mas em vista do fortalecimento da nossa fé e dos nossos passos no caminho da salvação. Justamente porque a nossa luta é espiritual, nosso Defensor é o Espírito de Deus. Ele nos ensinará aquilo que ainda temos que aprender – e nós sempre temos o que aprender! – e também nos recordará tudo aquilo que Jesus já nos ensinou, para que em cada situação possamos agir como Jesus agiria se estivesse em nosso lugar.   
Foi justamente no momento em que nos ensinou a oração do Pai nosso que Jesus afirmou: “o Pai dará o Espírito Santo aos que o pedirem” (Lc 11,13). Sendo assim, nós oramos: ‘Pai, em nome de teu Filho Jesus, pedimos a presença do Espírito Santo junto a nós, junto a todo ser humano, especialmente junto a cada coração que se encontra perturbado e intimidado diante dos problemas, das angústias, das incertezas e das ameaças do mundo atual. Confirma a graça do Teu Espírito em nós! Divino Espírito Santo, vem com a Tua força socorrer a nossa fraqueza. Tu és o nosso Defensor! Defende-nos do inimigo espiritual, que combate contra a nossa fé. Defende-nos de nós mesmos, do nosso medo, da nossa covardia, da nossa indiferença e da nossa acomodação egoísta. Defende-nos do pecado, da infidelidade, da desonestidade, da corrupção e da perda de sentido da vida. Defende-nos da violência, das guerras, da fome, do desemprego, das drogas e das doenças... Em nome de Jesus, que nos prometeu a Tua vinda, amém!     

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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