Missa do 2º.
dom. da páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 2,42-47; 1Pedro 1,3-9; João
20,19-31.
Na
sua primeira aparição aos discípulos como Ressuscitado, Jesus quis mostrar-lhes
as marcas da crucificação, presentes em seu Corpo glorificado. Essas chagas nos
lembram que Jesus nos amou até o fim (cf. Jo 13,1). Além disso, elas nos
ensinam que a ressurreição não consiste na transferência da alma para outro
corpo, mas na glorificação daquele mesmo corpo que lutou em favor da vida, e
nessa luta se feriu de morte. É por isso que nós, cristãos, cremos na “ressurreição
da carne”.
As chagas do Senhor Ressuscitado nos
remetem para as palavras do apóstolo Paulo: “Incessantemente e por toda a parte
trazemos em nosso corpo as marcas da morte de Jesus, a fim de que a vida de
Jesus seja também manifestada em nosso corpo” (2Cor 4,10). Quais chagas ou
cicatrizes estão presentes em seu corpo, em sua alma, em seu espírito? Como
você interpreta suas cicatrizes? Você se orgulha ou sente vergonha delas?
Nossas marcas têm uma história; nossas cicatrizes têm um por quê. Embora
vivamos na cultura do “esteticamente correto”, não é sensato tentar eliminar de
nós aquilo que temos de mais autêntico, de mais humano, de mais nobre, que é a
luta por um mundo melhor, pelo bem da nossa família, pela santificação da nossa
Igreja, pela preservação do meio-ambiente, pela justiça em nosso ambiente de
trabalho, pela defesa dos mais fracos.
Por duas vezes, o Evangelho menciona
que as portas do lugar onde os discípulos se encontravam estavam fechadas. O
nosso Papa Francisco tem insistido que as portas da Igreja devem estar sempre
abertas, seja para acolher aqueles que a procuram, seja para ir atrás daqueles
que dela se afastaram ou que dela nunca se achegaram. Quando nos fechamos numa
atitude defensiva em relação a um mundo que direta ou indiretamente ataca os
valores do Evangelho, corremos o risco de falhar em nossa missão: “Sem
experimentar o Senhor Ressuscitado entre nós, vivemos como uma igreja fechada,
com medo do mundo... Com as ‘portas fechadas’ não se pode ouvir o que acontece
lá fora. Não é possível captar a ação do Espírito no mundo... Uma Igreja sem
capacidade de dialogar é uma tragédia, porque a missão de todo discípulo de
Jesus é realizar o diálogo de Deus com o ser humano” (J.A. Pagola).
O Senhor Ressuscitado nos comunica
sua alegria, sua paz e seu Espírito. Assim como Ele, nós temos que enfrentar
sérios obstáculos, seja na vivência da nossa própria fé, seja no anúncio do
Evangelho em vista da salvação da humanidade. Por isso, precisamos acolher este
sopro de Jesus Ressuscitado; precisamos viver deste sopro! Precisamos nos
encher da sua alegria, da sua paz e da força do seu Espírito, mantendo no
coração suas palavras: “No mundo tereis tribulações, mas tende coragem: eu
venci o mundo!” (Jo 16,33). Jesus não nos quer abatidos, desanimados ou
intimidados em nossa fé por causa das feridas – as nossas próprias e/ou as da
Igreja; o Ressuscitado nos ensina que a fé sempre será uma luta, um combate, e
quem entra nesse combate sairá vitorioso e igualmente ferido.
Eis, portanto, a correção de Jesus
dirigida a Tomé e a cada um de nós hoje: “Não sejas incrédulo, mas crê!” (Jo
20,27). Sem a fé, não existe páscoa; sem a fé, ninguém passa da morte para a
vida; ninguém ressuscita. Só a fé nos faz obter aquilo que cremos: a nossa
salvação (cf. 1Pd 1,9). Tomé impôs condições para crer no Senhor Ressuscitado: “Se
eu não vir... Se eu não puser o dedo (...), não acreditarei” (Jo 20,25). Quais
são as condições que você costuma impor a Deus para crer? Se a ciência não
comprovar, se a dor não passar, se o problema não desaparecer, se a cruz não
for eliminada, se o sofrimento não for embora, se os absurdos não deixarem de
existir... “não acreditarei”.
Jesus disse a Tomé: “Felizes os que
creram sem terem visto!” (Jo 20,29). Felizes os que, mesmo não tendo todas as
perguntas respondidas ou todos os problemas resolvidos, mesmo sendo expostos ao
fogo das provações, continuam a caminhar, a crer e a confiar, suportando o processo
necessário de purificação da própria fé (cf. 1Pd 1,7). Felizes os que, convivendo
com pessoas que decidiram abrir mão da sua fé, continuam a declarar: “Eu sei em
quem depositei a minha fé” (2Tm 1,12).
Foi por causa da fé no Senhor
Ressuscitado que os primeiros cristãos perseveraram na escuta da Palavra, na
Eucaristia, na oração e na partilha fraterna, colocando em comum seus bens
materiais, segundo as necessidades de cada um. Nessa mesma fé, tomavam a
refeição diária com alegria e simplicidade de coração (cf. At 2,42-46). Quando
cremos na ressurreição, cremos que a vida pode ser diferente, e por isso
reagimos ao desânimo e à inconstância por meio da perseverança; reagimos ao
egoísmo e ao individualismo através da partilha; reagimos à insatisfação
crônica que não se sacia com coisa alguma através da alegria e da simplicidade
de coração.
Diferente de Tomé, nós não podemos
ver nem tocar o Senhor Ressuscitado, mas podemos suplicar-Lhe hoje que nos
conceda mais uma vez a sua alegria, a sua paz e o seu Espírito, cumulando-nos
da força da sua ressurreição: Creio em ti, Ressuscitado, mais que São Tomé, mas
aumenta na minh’alma o poder da fé! Guarda a minha esperança, cresce o meu
amor. Creio em ti, Ressuscitado, meu Deus e Senhor!
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