quinta-feira, 20 de abril de 2017

RESPIRAR O SOPRO DO SENHOR RESSUSCITADO

Missa do 2º. dom. da páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 2,42-47; 1Pedro 1,3-9; João 20,19-31.

Na sua primeira aparição aos discípulos como Ressuscitado, Jesus quis mostrar-lhes as marcas da crucificação, presentes em seu Corpo glorificado. Essas chagas nos lembram que Jesus nos amou até o fim (cf. Jo 13,1). Além disso, elas nos ensinam que a ressurreição não consiste na transferência da alma para outro corpo, mas na glorificação daquele mesmo corpo que lutou em favor da vida, e nessa luta se feriu de morte. É por isso que nós, cristãos, cremos na “ressurreição da carne”. 
            As chagas do Senhor Ressuscitado nos remetem para as palavras do apóstolo Paulo: “Incessantemente e por toda a parte trazemos em nosso corpo as marcas da morte de Jesus, a fim de que a vida de Jesus seja também manifestada em nosso corpo” (2Cor 4,10). Quais chagas ou cicatrizes estão presentes em seu corpo, em sua alma, em seu espírito? Como você interpreta suas cicatrizes? Você se orgulha ou sente vergonha delas? Nossas marcas têm uma história; nossas cicatrizes têm um por quê. Embora vivamos na cultura do “esteticamente correto”, não é sensato tentar eliminar de nós aquilo que temos de mais autêntico, de mais humano, de mais nobre, que é a luta por um mundo melhor, pelo bem da nossa família, pela santificação da nossa Igreja, pela preservação do meio-ambiente, pela justiça em nosso ambiente de trabalho, pela defesa dos mais fracos.
            Por duas vezes, o Evangelho menciona que as portas do lugar onde os discípulos se encontravam estavam fechadas. O nosso Papa Francisco tem insistido que as portas da Igreja devem estar sempre abertas, seja para acolher aqueles que a procuram, seja para ir atrás daqueles que dela se afastaram ou que dela nunca se achegaram. Quando nos fechamos numa atitude defensiva em relação a um mundo que direta ou indiretamente ataca os valores do Evangelho, corremos o risco de falhar em nossa missão: “Sem experimentar o Senhor Ressuscitado entre nós, vivemos como uma igreja fechada, com medo do mundo... Com as ‘portas fechadas’ não se pode ouvir o que acontece lá fora. Não é possível captar a ação do Espírito no mundo... Uma Igreja sem capacidade de dialogar é uma tragédia, porque a missão de todo discípulo de Jesus é realizar o diálogo de Deus com o ser humano” (J.A. Pagola).
            O Senhor Ressuscitado nos comunica sua alegria, sua paz e seu Espírito. Assim como Ele, nós temos que enfrentar sérios obstáculos, seja na vivência da nossa própria fé, seja no anúncio do Evangelho em vista da salvação da humanidade. Por isso, precisamos acolher este sopro de Jesus Ressuscitado; precisamos viver deste sopro! Precisamos nos encher da sua alegria, da sua paz e da força do seu Espírito, mantendo no coração suas palavras: “No mundo tereis tribulações, mas tende coragem: eu venci o mundo!” (Jo 16,33). Jesus não nos quer abatidos, desanimados ou intimidados em nossa fé por causa das feridas – as nossas próprias e/ou as da Igreja; o Ressuscitado nos ensina que a fé sempre será uma luta, um combate, e quem entra nesse combate sairá vitorioso e igualmente ferido.
            Eis, portanto, a correção de Jesus dirigida a Tomé e a cada um de nós hoje: “Não sejas incrédulo, mas crê!” (Jo 20,27). Sem a fé, não existe páscoa; sem a fé, ninguém passa da morte para a vida; ninguém ressuscita. Só a fé nos faz obter aquilo que cremos: a nossa salvação (cf. 1Pd 1,9). Tomé impôs condições para crer no Senhor Ressuscitado: “Se eu não vir... Se eu não puser o dedo (...), não acreditarei” (Jo 20,25). Quais são as condições que você costuma impor a Deus para crer? Se a ciência não comprovar, se a dor não passar, se o problema não desaparecer, se a cruz não for eliminada, se o sofrimento não for embora, se os absurdos não deixarem de existir... “não acreditarei”.
            Jesus disse a Tomé: “Felizes os que creram sem terem visto!” (Jo 20,29). Felizes os que, mesmo não tendo todas as perguntas respondidas ou todos os problemas resolvidos, mesmo sendo expostos ao fogo das provações, continuam a caminhar, a crer e a confiar, suportando o processo necessário de purificação da própria fé (cf. 1Pd 1,7). Felizes os que, convivendo com pessoas que decidiram abrir mão da sua fé, continuam a declarar: “Eu sei em quem depositei a minha fé” (2Tm 1,12).
            Foi por causa da fé no Senhor Ressuscitado que os primeiros cristãos perseveraram na escuta da Palavra, na Eucaristia, na oração e na partilha fraterna, colocando em comum seus bens materiais, segundo as necessidades de cada um. Nessa mesma fé, tomavam a refeição diária com alegria e simplicidade de coração (cf. At 2,42-46). Quando cremos na ressurreição, cremos que a vida pode ser diferente, e por isso reagimos ao desânimo e à inconstância por meio da perseverança; reagimos ao egoísmo e ao individualismo através da partilha; reagimos à insatisfação crônica que não se sacia com coisa alguma através da alegria e da simplicidade de coração.
            Diferente de Tomé, nós não podemos ver nem tocar o Senhor Ressuscitado, mas podemos suplicar-Lhe hoje que nos conceda mais uma vez a sua alegria, a sua paz e o seu Espírito, cumulando-nos da força da sua ressurreição: Creio em ti, Ressuscitado, mais que São Tomé, mas aumenta na minh’alma o poder da fé! Guarda a minha esperança, cresce o meu amor. Creio em ti, Ressuscitado, meu Deus e Senhor!

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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