Celebração da Paixão
e Morte do Senhor. Palavra de Deus: Isaías 52,13 – 53,12; Hebreus 4,14-16;
5,7-9; João 18,1 – 19,42.
Pense
nessas duas perguntas:
1) Como lidar com o sofrimento?
2) Como evitar o
sofrimento?
Qual
delas tem mais importância para o mundo atual? E para você?
Embora
o profeta Isaías não tenha falado diretamente de Jesus, nós podemos facilmente
reconhecê-lo na sua profecia como um “homem familiarizado com o sofrimento” (Is
53,3). Ora, sabemos que Jesus nunca procurou o sofrimento para si, mas também
não fugiu dele quando se deparou com pessoas que estavam sofrendo. Pelo
contrário; Ele foi ao encontro das pessoas que sofriam.
Existem
sofrimentos em nossa vida que são consequência de atitudes erradas que tomamos,
assim como existem sofrimentos que são consequência não daquilo que nos
acontece, mas da maneira como lidamos com aquilo que nos acontece. Além disso,
existem sofrimentos que são consequência da nossa fidelidade a Deus, quando
procuramos levar uma vida coerente, pautada na retidão e na justiça. Por isso,
quando estamos vivenciando uma experiência de dor, precisamos nos perguntar o
quanto aquela dor é responsabilidade nossa, o quanto é consequência de
injustiças que existem em nossa sociedade e o quanto ela é consequência da
nossa fidelidade a Deus.
É
verdade que nós procuramos o quanto possível não sofrer. Para isso, nos
apoiamos na medicina, na ciência, em filosofias de vida e em igrejas ou religiões
que prometem um alívio, uma libertação do sofrimento, como se fosse realmente
possível passar pela vida sem sofrer. Mas hoje a Palavra do Senhor nos convida
a olhar para o sofrimento, procurando compreender o que ele pode nos dizer,
ensinar, corrigir ou aperfeiçoar. Assim, o profeta Isaías nos apresenta a
figura do Servo sofredor. “Diante dele, os reis se manterão em silêncio” (Is
52,15). O sofrimento costuma tirar as nossas palavras, pois não conseguimos
“explicá-lo”. Além disso, quando vemos a maneira digna como alguém lida com a
dor às vezes nos calamos, envergonhados pela maneira como lidamos com a nossa
dor.
Este
homem, este Servo, “cresceu diante do Senhor, como raiz em terra seca” (Is
53,2). Eis algo surpreendente: é possível crescer também na dor! É possível
crescer na aridez, na experiência do sofrimento! “Ele não tinha beleza, não
tinha aparência que nos agradasse” (Is 53,2). Pois é. Deus muitas vezes nos
fala por meio de acontecimentos desagradáveis! Assim, quando nos deixamos levar
por uma sociedade que supervaloriza a estética, a aparência, e despreza aquilo
que não tem beleza, acabamos por não conseguir enxergar Deus no rosto de alguém
coberto de dores e cheio de sofrimentos.
Numa
época onde as pessoas gostam de culpabilizar os outros pela sua infelicidade,
uma época também de grande indiferença para com o sofrimento alheio, somos
desafiados a nos dar conta da nossa parcela de responsabilidade no sofrimento
que, de várias formas, atinge a humanidade: “ele foi ferido por nossos pecados,
esmagado por nossos crimes” (Is 53,5). Ao invés de cobrarmos de Deus uma
intervenção miraculosa, que erradique de uma vez por todas o sofrimento da face
da terra, precisamos nos perguntar se estamos fazendo a nossa parte para não
criar ou não alimentar situações injustas que continuem a causar sofrimento às pessoas.
Melhor
do que ninguém, Jesus, o Servo Sofredor, pode nos ajudar a lidar com o
sofrimento. Ele é agora o nosso intercessor diante do Pai, o intercessor “capaz
de se compadecer de nossas fraquezas, pois ele mesmo foi provado em tudo como
nós” (Hb 4,15). Portanto, podemos estar certos de que nenhuma dor, nenhum
sofrimento, nenhum absurdo pelo qual possamos passar é estranho ou desconhecido
de Jesus. Com ele podemos aprender a não negar o nosso sofrimento, mas a
apresentá-lo ao Pai na oração, de modo que, no fim, prevaleça não a nossa
repulsa instintiva diante da dor, mas a submissão dessa repulsa diante da
vontade de Deus, caso o sofrimento que nos cabe enfrentar esteja ali para a
nossa correção, a nossa santificação ou para contribuir de alguma forma com a
redenção da humanidade.
“Permaneçamos
firmes na fé que professamos” (Hb 4,14). Ao invés de abandonar a fé, por causa
de determinado sofrimento, precisamos aprender a nos abandonar nas mãos de
Deus: “Em vossas mãos entrego o meu espírito, porque vós me salvareis, ó Deus
fiel. Como um vaso espedaçado, a vós eu me confio, e afirmo que só vós sois o
meu Deus. Eu entrego em vossas mãos o meu destino” (Sl 31,6.13.15.16). Quando
conseguimos fazer esta entrega, acabamos testemunhando esta fé: “Fortalecei os
corações, tende coragem, todos vós que ao Senhor vos confiais!” (Sl 31,25).
Uma
vez que no domingo de ramos pudemos meditar diversos aspectos da Paixão do
Senhor, hoje podemos considerá-la apenas sob um outro aspecto: o jardim. De
fato, a narrativa da Paixão de Jesus começa e termina num jardim (cf. Jo 18,1;
19,41). No livro “A Cabana” há uma cena muito significativa, quando o Espírito
Santo convida um homem, atingido por um grande sofrimento, a ir com Ele a um
jardim. Ao chegarem, o homem vê que o jardim é uma confusão de cores; tudo
misturado, confuso, e espantosamente bonito. O homem comenta consigo: “Que
confusão!”. E o Espírito lhe responde: “É exatamente isso: uma confusão! Eu
gostaria que você me ajudasse a limpar todo esse terreno. Há uma coisa muito
especial que eu quero plantar aqui”. E imediatamente o Espírito Santo pega uma
foice e começa a destruir aquele espetáculo de cores. Ele então explica ao
homem: “Devemos arrancar as raízes de todas as plantas maravilhosas que estavam
aqui. Caso contrário, elas prejudicarão as sementes que iremos plantar”. No
final da tarefa, o Espírito Santo explica ao homem: “Este jardim é a sua alma.
Esta confusão é você! Juntos, você e eu estamos trabalhando. Para você, parece
apenas uma confusão, mas eu vejo um propósito no que estamos fazendo...” (pp.
117-126 do livro A Cabana).
Devolver
ao nosso Planeta a sua identidade original de jardim é uma tarefa que exige de
todos nós um pouco ou muito de sofrimento. Da mesma forma, permitir que Deus, o
nosso agricultor, passe o arado da sua Palavra sobre a terra da nossa alma e
plante nela as sementes de uma vida nova, certamente exige de nós o suportar sofrimento.
Que o Senhor nos ensine a lidar melhor com o sofrimento. Que o nosso sofrer
nunca seja sem propósito. Que, enfim, confiemos no propósito de Deus de fazer
nascer uma nova vida no jardim da nossa alma...
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