sexta-feira, 14 de abril de 2017

HÁ ALGUM PROPÓSITO NO SEU SOFRER?

Celebração da Paixão e Morte do Senhor. Palavra de Deus: Isaías 52,13 – 53,12; Hebreus 4,14-16; 5,7-9; João 18,1 – 19,42.

Pense nessas duas perguntas: 
1) Como lidar com o sofrimento? 
2) Como evitar o sofrimento?
Qual delas tem mais importância para o mundo atual? E para você?
Embora o profeta Isaías não tenha falado diretamente de Jesus, nós podemos facilmente reconhecê-lo na sua profecia como um “homem familiarizado com o sofrimento” (Is 53,3). Ora, sabemos que Jesus nunca procurou o sofrimento para si, mas também não fugiu dele quando se deparou com pessoas que estavam sofrendo. Pelo contrário; Ele foi ao encontro das pessoas que sofriam.
Existem sofrimentos em nossa vida que são consequência de atitudes erradas que tomamos, assim como existem sofrimentos que são consequência não daquilo que nos acontece, mas da maneira como lidamos com aquilo que nos acontece. Além disso, existem sofrimentos que são consequência da nossa fidelidade a Deus, quando procuramos levar uma vida coerente, pautada na retidão e na justiça. Por isso, quando estamos vivenciando uma experiência de dor, precisamos nos perguntar o quanto aquela dor é responsabilidade nossa, o quanto é consequência de injustiças que existem em nossa sociedade e o quanto ela é consequência da nossa fidelidade a Deus.
É verdade que nós procuramos o quanto possível não sofrer. Para isso, nos apoiamos na medicina, na ciência, em filosofias de vida e em igrejas ou religiões que prometem um alívio, uma libertação do sofrimento, como se fosse realmente possível passar pela vida sem sofrer. Mas hoje a Palavra do Senhor nos convida a olhar para o sofrimento, procurando compreender o que ele pode nos dizer, ensinar, corrigir ou aperfeiçoar. Assim, o profeta Isaías nos apresenta a figura do Servo sofredor. “Diante dele, os reis se manterão em silêncio” (Is 52,15). O sofrimento costuma tirar as nossas palavras, pois não conseguimos “explicá-lo”. Além disso, quando vemos a maneira digna como alguém lida com a dor às vezes nos calamos, envergonhados pela maneira como lidamos com a nossa dor.  
Este homem, este Servo, “cresceu diante do Senhor, como raiz em terra seca” (Is 53,2). Eis algo surpreendente: é possível crescer também na dor! É possível crescer na aridez, na experiência do sofrimento! “Ele não tinha beleza, não tinha aparência que nos agradasse” (Is 53,2). Pois é. Deus muitas vezes nos fala por meio de acontecimentos desagradáveis! Assim, quando nos deixamos levar por uma sociedade que supervaloriza a estética, a aparência, e despreza aquilo que não tem beleza, acabamos por não conseguir enxergar Deus no rosto de alguém coberto de dores e cheio de sofrimentos.
Numa época onde as pessoas gostam de culpabilizar os outros pela sua infelicidade, uma época também de grande indiferença para com o sofrimento alheio, somos desafiados a nos dar conta da nossa parcela de responsabilidade no sofrimento que, de várias formas, atinge a humanidade: “ele foi ferido por nossos pecados, esmagado por nossos crimes” (Is 53,5). Ao invés de cobrarmos de Deus uma intervenção miraculosa, que erradique de uma vez por todas o sofrimento da face da terra, precisamos nos perguntar se estamos fazendo a nossa parte para não criar ou não alimentar situações injustas que continuem a causar sofrimento às pessoas.
Melhor do que ninguém, Jesus, o Servo Sofredor, pode nos ajudar a lidar com o sofrimento. Ele é agora o nosso intercessor diante do Pai, o intercessor “capaz de se compadecer de nossas fraquezas, pois ele mesmo foi provado em tudo como nós” (Hb 4,15). Portanto, podemos estar certos de que nenhuma dor, nenhum sofrimento, nenhum absurdo pelo qual possamos passar é estranho ou desconhecido de Jesus. Com ele podemos aprender a não negar o nosso sofrimento, mas a apresentá-lo ao Pai na oração, de modo que, no fim, prevaleça não a nossa repulsa instintiva diante da dor, mas a submissão dessa repulsa diante da vontade de Deus, caso o sofrimento que nos cabe enfrentar esteja ali para a nossa correção, a nossa santificação ou para contribuir de alguma forma com a redenção da humanidade.
“Permaneçamos firmes na fé que professamos” (Hb 4,14). Ao invés de abandonar a fé, por causa de determinado sofrimento, precisamos aprender a nos abandonar nas mãos de Deus: “Em vossas mãos entrego o meu espírito, porque vós me salvareis, ó Deus fiel. Como um vaso espedaçado, a vós eu me confio, e afirmo que só vós sois o meu Deus. Eu entrego em vossas mãos o meu destino” (Sl 31,6.13.15.16). Quando conseguimos fazer esta entrega, acabamos testemunhando esta fé: “Fortalecei os corações, tende coragem, todos vós que ao Senhor vos confiais!” (Sl 31,25).
Uma vez que no domingo de ramos pudemos meditar diversos aspectos da Paixão do Senhor, hoje podemos considerá-la apenas sob um outro aspecto: o jardim. De fato, a narrativa da Paixão de Jesus começa e termina num jardim (cf. Jo 18,1; 19,41). No livro “A Cabana” há uma cena muito significativa, quando o Espírito Santo convida um homem, atingido por um grande sofrimento, a ir com Ele a um jardim. Ao chegarem, o homem vê que o jardim é uma confusão de cores; tudo misturado, confuso, e espantosamente bonito. O homem comenta consigo: “Que confusão!”. E o Espírito lhe responde: “É exatamente isso: uma confusão! Eu gostaria que você me ajudasse a limpar todo esse terreno. Há uma coisa muito especial que eu quero plantar aqui”. E imediatamente o Espírito Santo pega uma foice e começa a destruir aquele espetáculo de cores. Ele então explica ao homem: “Devemos arrancar as raízes de todas as plantas maravilhosas que estavam aqui. Caso contrário, elas prejudicarão as sementes que iremos plantar”. No final da tarefa, o Espírito Santo explica ao homem: “Este jardim é a sua alma. Esta confusão é você! Juntos, você e eu estamos trabalhando. Para você, parece apenas uma confusão, mas eu vejo um propósito no que estamos fazendo...” (pp. 117-126 do livro A Cabana).
Devolver ao nosso Planeta a sua identidade original de jardim é uma tarefa que exige de todos nós um pouco ou muito de sofrimento. Da mesma forma, permitir que Deus, o nosso agricultor, passe o arado da sua Palavra sobre a terra da nossa alma e plante nela as sementes de uma vida nova, certamente exige de nós o suportar sofrimento. Que o Senhor nos ensine a lidar melhor com o sofrimento. Que o nosso sofrer nunca seja sem propósito. Que, enfim, confiemos no propósito de Deus de fazer nascer uma nova vida no jardim da nossa alma...

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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