Missa do 23º. dom. comum. Sabedoria 9,13-18; Filêmon
9b-10.12-17; Lucas 14,25-33.
Depois
de 26 anos de casamento, o casal decidiu se separar. Depois de 18 anos de vida
consagrada a Deus, o padre decidiu abandonar o ministério. Depois de 5 anos de
namoro, ela foi surpreendida pela decisão que ele tomou de terminar o
relacionamento. Depois de 2 anos de faculdade, o universitário decidiu mudar de
curso. Depois de a pessoa ter lutado tanto para conseguir aquele emprego, ela
se deu conta de que não era aquilo que estava buscando...
Por
que será que nós começamos algo e não damos conta de acabar, de concluir o
processo (cf. Lc 14,28-32)? Pode ser porque fizemos uma opção apressada, sob o
impulso da emoção; pode ser também porque, no meio do caminho, surgiu algo que
pareceu mais interessante; pode ser ainda porque não contávamos com tanta
dificuldade e com tanto sofrimento para concluir aquilo que iniciamos.
Não
há dúvida de que o nosso nível de maturidade afetiva e espiritual anda muito
baixo, rasteiro mesmo. O problema é que, para alcançar algum objetivo na vida,
nós precisamos sair da nossa “zona de conforto”, nos desacomodar, arregaçar as
mangas, lutar, renunciar, sacrificar algo aparentemente bom para alcançar algo verdadeiramente
melhor. Mas quem está disposto a fazer isso?
O livro da
Sabedoria já nos fazia esse alerta: o
corpo torna pesada a alma (cf. Sb 9,15), no sentido de que os nossos
interesses “naturais” vão, muitas vezes, no sentido oposto às nossas
necessidades espirituais. Quem só se move na direção do seu bem estar não
cresce, nem no sentido humano, nem no espiritual. Se quisermos que nossos
caminhos se tornem retos, ou seja, que as nossas escolhas sejam direcionadas
para aquilo que realmente nos importa como filhos de Deus, precisamos da
Sabedoria que vem do Espírito Santo (cf. Sb 9,17-18), para nos guiar e nos
ajudar a tomar as decisões necessárias para nosso crescimento, nossa cura, nossa
libertação; numa palavra, para nossa salvação. Neste sentido, nós hoje pedimos
como o salmista: “Ensinai-nos a contar os nossos dias, e dai ao nosso coração
sabedoria! (...) Tornai fecundo, ó Senhor, nosso trabalho” (Sl 90,12.17).
Em outras
palavras, eis o recado de Jesus para nós hoje: ‘Ou você se coloca “por inteiro” na decisão que toma, ou não tome tal
decisão, porque “pedaço”, “remendo”, “improviso” não funciona!’
Interessante que o Evangelho começa afirmando que “grandes multidões”
acompanhavam Jesus (cf. Lc 14,25). Onde as grandes multidões se reúnem hoje?
Para ver o quê? Para ouvir quem? Como Jesus não é movido pela “massa” e sabe
enxergar o coração de cada pessoa perdida, anônima ou escondida no meio da
“massa”, ele diz abertamente: “Se alguém vem a mim, me procura, me segue, mas
não se desapega das pessoas mais queridas e até mesmo da sua própria vida, não
pode ser meu discípulo. Quem não carrega a sua cruz e não caminha atrás de mim,
não pode ser meu discípulo. Qualquer um de vós, se não renunciar a tudo o que
tem, não pode ser meu discípulo” (citação livre de Lc 14,26.27.33).
Afinal de
contas, o que Jesus quer? Ele quer que você seja uma pessoa realista, que tenha
o coração voltado para o alto, para Deus, mas os pés no chão; que você enfrente
o sofrimento que cabe a você enfrentar, em vista da vocação para a qual Deus
lhe chamou. Jesus quer que você se torne uma pessoa firme e madura; que não
seja superficial, frouxa, fraca, inconstante e volúvel, uma pessoa que se
quebra diante de qualquer dificuldade e que pula fora do barco só porque o
vento está soprando contrário e há uma tempestade à sua frente. Jesus quer que
você aprenda a renunciar aos caprichos do seu ego para alcançar os valores que
verdadeiramente dão sentido à sua vida; que você entenda que não se trata de
renunciar por renunciar, mas que a renúncia está em função de redirecionar as
suas melhores energias para o verdadeiro objetivo da sua vida.
Hoje
estamos iniciando em nossa Igreja o mês da Bíblia, e a Palavra de Deus traz
importantes questionamentos para cada um de nós: Como eu me coloco no meu
relacionamento com tal pessoa, ou no meu trabalho, na minha vida profissional, ou
ainda na minha relação com Deus, na minha fé, na minha religião: por inteiro ou
pela metade? Dando tudo de mim ou apenas um pedaço meu? Como eu reajo diante
das dificuldades? Como eu lido com a minha cruz? O que eu pretendo ser, em
relação a Jesus: um verdadeiro discípulo? Um admirador? Um consumidor de Suas
bênçãos? Que tipo de “construção” eu preciso hoje retomar na minha vida, a fim
de fazer verdadeiramente a minha parte para que ela seja concluída?
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