Missa dos fiéis
defuntos. Palavra de Deus: Isaías 25,6a.7-9; Romanos 8,14-23; Mateus 25,31-46.
O
que existe depois da morte? Segundo Jesus acabou de nos dizer, depois da morte
existe um encontro entre nós e Ele. É o momento em que a Luz da Verdade, que é
Jesus, clareia toda a nossa história de vida, revelando não somente os nossos
atos, mas com qual intenção fizemos aquilo que fizemos. Por isso, o momento
depois da morte é também o momento da justiça, o momento do julgamento. Aquela
justiça que muitas vezes não encontramos no mundo, devido à corrupção e à
impunidade; aquela justiça que tantos esperaram de Deus e “não veio” – e por
isso muitos deixaram de crer em Deus – aquela justiça se dará neste encontro de
cada ser humano com o Filho de Deus, a quem o Pai concedeu o poder de julgar
segundo a verdade e a justiça.
Sabemos
que Jesus não veio para condenar a humanidade, mas sim para salvá-la. No
entanto, cada ser humano pode, na sua liberdade, se condenar ou se salvar, na
medida em que rejeita ou acolhe a oferta de salvação que Jesus Cristo nos traz.
No entanto, para surpresa nossa, o nosso julgamento não consistirá em verificar
se observamos normas, regras ou mandamentos, mas como tratamos o nosso próximo,
sobretudo aquele que precisa de nós.
Neste
Evangelho, Jesus revela que, antes de nos encontrarmos definitivamente com Ele
após a morte, esse encontro já se deu inúmeras vezes durante a nossa vida
terrena: “Eu tive fome e me destes de comer... Eu tive fome e não me destes de
comer...” (Mt 25,35.42). Numa época de forte individualismo e de indiferença
para com a dor dos outros, Jesus nos deixa conscientes de que a salvação não é
uma questão entre nós e Deus, mas entre nós, o nosso próximo e Deus. Assim como
Deus é misericórdia – se deixa afetar pela dor do outro – assim devemos ser
misericordiosos. “O julgamento será sem misericórdia para quem não pratica a
misericórdia. Mas a misericórdia triunfa sobre o julgamento” (Tg 2,13). Quem
pratica a misericórdia não teme o julgamento.
Um
cuidado devemos ter, quando pensamos na ajuda aos necessitados. Segundo Madre
Teresa de Calcutá, a pergunta de Deus para nós, no momento do julgamento, não
será: “Quantas coisas boas você fez na sua vida?”, mas será: “Quanto amor você
colocou naquilo que fez?”. Também o apóstolo Paulo afirma: “Ainda que eu desse
todos os meus bens aos pobres (...), seu eu não tivesse amor, isso de nada me
serviria” (1Cor 13,3).
Neste
dia de Finados, o profeta Isaías nos oferece uma imagem do Céu: ele é como “um
banquete de ricas iguarias” (Is 25,6), preparado para todos os povos, porque
Deus quer que toda a humanidade seja salva (cf. 1Tm 2,4). A Eucaristia que
celebramos neste dia não é apenas para pedir perdão a Deus pelos pecados dos
que partiram desta vida, mas, sobretudo, para proclamar a nossa fé n’Aquele que
“não é o Deus dos mortos, mas dos vivos, pois para Ele todos vivem” (Lc 20,38),
n’Aquele que “eliminará para sempre a morte, e enxugará as lágrimas de todas as
faces... Este é o nosso Deus, esperamos nele, até que nos salvou” (Is 25,9).
Renovando
nosso encontro com Jesus e nossa fé em Deus Pai, nós nos alegramos pelo
Espírito Santo que nos foi dado, por meio do qual podemos não somente clamar,
mas também proclamar: “Abá, ó Pai!” (Rm 8,15). Assim como Jesus, na proximidade
da sua morte, disse aos discípulos: “Eu não estou sozinho; o Pai está comigo”
(Jo 16,32), assim o Espírito Santo nos consola com a certeza de que, quer
estejamos vivos, quer tenhamos morrido, continuamos a pertencer ao Pai (cf. Rm
14,8); estamos, portanto, guardados pelas Suas mãos e no Seu coração.
Mesmo
que tenhamos que enfrentar “os sofrimentos do tempo presente”, nós os
enfrentamos com confiança, sabendo que eles nos abrirão para “a glória futura
que será revelada em nós” (Rm 8,18). Se a nossa presença no cemitério nos faz
tomar consciência (deveria fazer) de que a nossa fé em Deus nunca nos impedirá
de morrer, ela também deve nos tornar mais conscientes ainda do gemido que se
encontra no mais profundo do nosso ser, gemido que expressa a nossa pertença a
Deus e o desejo do nosso corpo ser abraçado pela ressurreição de Cristo.
Pe. Paulo Cezar Mazzi