sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

DEUS NÃO DESISTE DO SER HUMANO

Missa do 4º. dom. do advento – Palavra de Deus: 2Samuel 7,1-5.8b-12.14a.16; Romanos 16,25-27; Lucas 1,26-38.


No último dia 16, nove integrantes do Talibã, movimento fundamentalista islâmico, entraram numa escola do Paquistão administrada pelo Exército e mataram 132 crianças e adolescentes. O porta-voz do Talibã justificou o ataque, dizendo: “Queremos que eles (os pais) sintam a nossa dor”. Nós não precisamos visitar o Oriente Médio para nos dar conta do quanto o ser humano tem se desumanizado, seja por causa das injustiças sociais, da luta pelo poder ou do fanatismo religioso. Aqui mesmo no Brasil, devido à violência, à injustiça, à impunidade e à corrupção, é cada vez maior o número de pessoas que dizem não acreditar mais no ser humano.  
Embora a própria Escritura afirme que Deus também chegou ao ponto de ter se arrependido de criar o ser humano (cf. Gn 6,6), porque “viu que a maldade do homem era grande sobre a terra, e que era continuamente mau todo projeto de seu coração” (Gn 6,5), o Evangelho deste 4º. domingo do advento narra o momento na história da salvação em que Deus decide enviar seu Filho ao mundo, permitindo que Ele se fizesse pessoa humana no seio de Maria. Se por estar ferido e querer se vingar o ser humano quer que o seu semelhante sinta a sua dor, Deus escolheu se fazer humano por dois motivos: primeiro, para mostrar que Ele veio redimir o ser humano da sua dor; segundo, porque Ele quis assumir em Si mesmo a dor de cada ser humano. Decidindo gerar seu Filho no ventre de Maria, Deus revela que nunca desistirá do ser humano, quem quer que seja ele.
“O anjo Gabriel foi enviado por Deus... a uma virgem” (Lc 1,26). A iniciativa de salvar a humanidade é sempre de Deus, e o caminho que Ele escolhe para realizar a salvação é sempre surpreendente: uma virgem se tornará mãe, sem ter tido relação com um homem. A ausência do homem é proposital: Deus quer deixar claro que a obra é d’Ele e não nossa. Por isso, logo que assumiu seu ministério, o Papa Francisco disse que nós precisamos nos deixar surpreender por Deus. Ele entra em nosso cotidiano, como entrou no de Maria, e sua proposta provoca uma reviravolta em nossa vida, em nossos planos humanos, limitados pela visão estreita que temos de nós mesmos e da vida.
Diante da perturbação de Maria com essa visita inesperada de Deus em sua vida, o anjo lhe diz: “Não tenhas medo, Maria, porque encontraste graça diante de Deus” (Lc 1,30). O medo tem tomado cada vez mais conta do nosso coração. O termômetro do medo se chama ansiedade, uma ansiedade que surge em nós sempre que, consciente ou inconscientemente, nos sentimos ameaçados por algum perigo, real ou imaginário. Sentimos medo do ser humano, medo do mundo em que vivemos, medo do futuro, medo de fracassarmos, de não darmos conta da vida. Mas o Evangelho diz que Deus está conosco, que Ele acredita em nós, que Ele não desistiu da humanidade, mas quer salvá-la a partir da nossa abertura à Sua graça.
            “Eis que conceberás e darás à luz um filho...” (Lc 1,31). Apesar da ideologia do aborto, a qual afirma que cabe à mulher decidir sobre o seu corpo – como se o filho que ela está gerando fosse um órgão do seu corpo e não uma vida, uma pessoa; apesar da esterilidade; apesar de tantos filhos desejados, mas nunca gerados e de tantos filhos gerados, mas não desejados; apesar do medo de se gerar filhos num mundo como o nosso; apesar de todos os entraves físicos, psicológicos ou emocionais que estancam a vida dentro de nós, Deus acredita em nossa fecundidade; Ele sabe que somos capazes de ir além, de transcender o momento presente e de nos tornar grávidos de um futuro que ainda não se pode ver, mas que se deve esperar.
“O Espírito Santo virá sobre ti, e o poder do Altíssimo te cobrirá com sua sombra” (Lc 1,35). Quanto mais nos sentimos cobertos pela sombra do terrorismo, da violência, da injustiça e da maldade dos homens, mais precisamos nos refugiar em Deus, como faz o salmista: “Piedade de mim, ó Deus, tem piedade de mim, pois eu me abrigo em ti; eu me abrigo à sombra de tuas asas, até que passe o perigo” (Sl 57,2). O Espírito Santo é espírito de força, de fecundidade, de luz, de alegria, de vida. Ele nos faz experimentar que, verdadeiramente, “para Deus nada é impossível” (Lc 1,37). Ele nos faz cantar: Por que tenho medo, se nada é impossível para ti? (3x) Por que ficar triste, se nada é impossível para ti? (3x) Nada é impossível para ti! (2x) Porque duvidar, se nada é impossível para ti? (3x) Nada é impossível para ti! (2x) (Adriana, Nada é impossível para ti).
            Enfim, se a iniciativa é de Deus, a resposta é nossa. E Maria responde: “Eis aqui a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra!” (Lc 1,38). Nós estamos aqui como servos do Senhor ou como pessoas que querem se servir do Senhor? Quando ouvimos a sua Palavra, esperamos até que ela se cumpra em nós? Permitimos que a Palavra se cumpra em nós? O Pai poderia ter enviado seu Filho já adulto, mas escolheu este longo caminho da Encarnação: a fecundação, a gestação, o parto etc., até que Jesus se tornasse adulto e começasse o anúncio do Evangelho. Todo esse longo e demorado processo é um questionamento para cada um de nós: Eu confio no tempo de Deus para mim? Deixo-me surpreender por Ele? O que fala mais alto em mim: a crença de que a humanidade não tem mais jeito ou a certeza de que Deus nunca desiste do ser humano? Permito que o Espírito Santo me fecunde com a Sua graça? Aceito ficar debaixo da Sua sombra o tempo que for necessário? Acolho a Palavra de Deus de modo a esperar nela e a permitir que se realize em minha vida

                                            Pe. Paulo Cezar Mazzi

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