quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Dom e empenho


Missa do 18º. dom. comum. Palavra de Deus: Êxodo 16,2-4.12-15; Efésios 4,17.20-24; João 6,24-35

A nossa reflexão de hoje parte de onde havíamos parado semana passada: quando Jesus percebeu que a multidão que ele havia saciado queria proclamá-lo rei, se retirou e foi sozinho para um lugar afastado (cf. Jo 6,15). Como vimos, essa atitude de Jesus nos ensina que sempre que nós queremos que Deus resolva todos os nossos problemas, sem que façamos aquilo que é nossa responsabilidade fazer, Ele se retira.
Embora Jesus houvesse se retirado e se negado a ser uma solução mágica para os problemas da multidão, ela vai à sua procura. Mas, quando o encontra, Jesus se antecipa em dizer: “Esforcem-se não pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que permanece até a vida eterna” (Jo 6,27). Há, sem dúvida, um esforço em nossa vida: esforço em nos atualizar para não perder espaço no mercado de trabalho, esforço em tentar aumentar a renda familiar, esforço em dar mais conforto e mais segurança à família, esforço em educar e formar os filhos, esforço em cuidar da saúde etc. Mas Jesus pergunta: seu esforço está em função de quê? De algo que se perde ou de algo que permanece até a vida eterna? Você se preocupa em cuidar da sua vida espiritual tanto quanto cuida da sua vida material? Há um esforço seu em ajudar seus filhos a cultivarem valores espirituais desde pequenos? Que esforço você faz para ter um contato diário e profundo com Deus e com a Sua Palavra?
            A nossa relação com Deus é como uma moeda: de um lado está o dom; do outro lado, o empenho. O dom diz respeito a Deus: é iniciativa d’Ele nos amar, nos criar, nos libertar e nos salvar. Mas o empenho diz respeito a nós: cabe a nós o esforço em caminhar com Deus, em lidar com o cansaço próprio do caminho, em perseverar diante das dificuldades. O povo de Israel queria o dom (Terra Prometida), mas não queria o empenho (lidar com a fome e a sede no deserto). Começou, então, a se arrepender de ter deixado as panelas de carne e o pão com fartura que havia no Egito, terra da escravidão (cf. Ex 16,3).
            Quantas vezes nós abandonamos um tratamento de saúde, um caminho de conversão, um trabalho de reconstrução dos nossos relacionamentos porque aquilo exige de nós empenho? Queremos os benefícios, mas não estamos dispostos a arcar com nenhum tipo de custo. Deus sempre providencia aquilo que precisamos para não desanimarmos, para não morrermos no meio do caminho. Mas o seu dom é para somar forças com o nosso empenho e não para substituí-lo.
Jesus é o dom de salvação do Pai para cada um de nós. Qual tem sido o nosso empenho em permanecer com ele? Se Jesus esclarece que o nosso empenho consiste em crer nele, nós apresentamos nossas desculpas: “Que sinal realizas para que possamos ver e crer em ti?” (Jo 6,30). Por trás dessa pergunta, está uma exigência de garantia. É como se você se perguntasse: ‘Que garantia Jesus me dá de que vale a pena crer nele, de que ele não vai se retirar como se retirou, quando eu tentar fazer dele um ídolo, algo que controlo e manipulo a meu favor?’ A nossa tentação é a mesma daquela multidão: “Senhor, dá-nos sempre desse pão!” (Jo 6,34). Por trás da palavra “sempre” está a tentação de ter encontrado definitivamente, de não mais precisar buscar, de não mais precisar nos empenhar, porque o dom já está garantido para sempre.
            O alimento não é um fim em si mesmo. Ele nos remete para algo. Ele nos sustenta em busca de algo. Ele é dom para sustentar o nosso empenho em alcançar o que nos foi prometido. Se Jesus é o dom por excelência do Pai, o pão que desce do céu e dá vida ao mundo, a nós cabe o empenho em nos despojar do velho homem, da pessoa movida pelo egoísmo e arrastada pelas próprias paixões enganadoras, para nos revestir do homem novo, da pessoa que se empenha em caminhar segundo a verdadeira justiça, segundo a santidade do Deus que Se fez dom em Seu Filho Jesus (cf. Ef 4,22-24).
Iniciando o mês vocacional, é oportuno lembrar que em inúmeras comunidades católicas faltam padres, homens que são dom de Deus a uma Igreja que se empenha em orar e trabalhar pelas vocações. A falta de padres tem tornado escasso o alimento que permanece até a vida eterna. Nos empenhemos, portanto, em rezar e trabalhar pelas vocações, para que o Pai conceda o dom da presença sacerdotal junto aos seus filhos e filhas famintos do d”aquele que desce do céu e dá vida ao mundo” (Jo 6,33). 
                                                                                                                  Pe. Paulo Cezar Mazzi

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