segunda-feira, 11 de junho de 2012

RECONCILIAR-ME COMIGO MESMO

O nosso maior desafio é nos reconciliar com nossa história de vida, o que significa nos reconciliar com o nosso passado. Muitas pessoas reclamam de terem nascido numa determinada época ou de terem tido determinados pais. Ora, não existe uma época ideal para nascer, assim como não existem pais ideais. Por mais que a época seja favorável ou os pais sejam ótimas pessoas, todo mundo carrega consigo algumas feridas do passado. Porém, toda ferida pode ser curada. Nós não podemos escolher a nossa infância, mas podemos fazer um trabalho de reconciliação com ela. Algum dia teremos que nos reconciliar com tudo o que vivemos e sofremos. O que pode nos ajudar nessa tarefa de reconciliação com a nossa história de vida é saber que nós até podemos não ser responsáveis pelas coisas que nos aconteceram no passado, mas somos responsáveis pela maneira como nos posicionamos diante delas hoje.
Eu preciso olhar com carinho para aquilo que não gosto, para aquilo que contrasta com a imagem que faço de mim mesmo, para minha impaciência, para minha angústia, para minha pouca autoestima. Este é um processo que se prolonga por toda a vida. Pois mesmo quando pensamos há muito nos ter reconciliado conosco, sempre aparecerão fraquezas que nos aborrecerão, que preferiríamos negar. Então, é preciso recomeçar a aceitar mais uma vez tudo o que existe em nós.
            Reconciliar-me com meu próprio eu significa reconciliar-me com as minhas sombras. Para C.G.Jung a sombra é constituída por tudo aquilo que nós não permitimos, que excluímos de nossa vida por não corresponder à nossa autoimagem. O ser humano, segundo Jung, tem duas polaridades: a razão e os sentimentos, o amor e o ódio, a disciplina e o deixar-se levar.  É bastante natural que nós, durante a primeira metade da vida, desenvolvamos principalmente um destes pólos, e com isto negligenciemos o outro. A parte negligenciada é então jogada na zona sombria. Mas ela não morre. No mais tardar, na metade da vida, seremos desafiados a enfrentar a sombra e a nos reconciliar com ela. Senão, adoecemos; senão surgirá em nós um conflito e seremos dilacerados interiormente.
            Precisamos aceitar que em nós não existe apenas amor, mas também ódio, não existem apenas anseios espirituais, mas também áreas onde não queremos que Deus habite. Aquele que não enfrenta a própria sombra acaba por projetá-la inconscientemente no outro. Admitir a existência da sombra em nós exige humildade. Humildade vem de húmus, terra, e significa que devemos aceitar nossa própria natureza terrena, aceitar o húmus que existe em nós.

Anselm Grün, Perdoa a ti mesmo, pp.39-41

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