Missa do 10º. dom. comum
“Onde você está?” (Gn 3,9). Foi com esta pergunta que Deus convidou Adão a reconhecer a situação em que se encontrava, e Adão reconheceu que, depois de ter pecado, passou a sentir medo de Deus e a ter necessidade de se esconder d’Ele, assim como passou a sentir vergonha de si mesmo, da sua própria nudez. Hoje Deus dirige a mesma pergunta a cada um de nós: “Onde você está?” (Gn 3,9).
Para nos ajudar a reconhecer onde nós estamos, o Evangelho nos mostra Jesus sendo julgado de maneira errada pelos de dentro (sua família) e pelos de fora (mestres da lei). Enquanto a família de Jesus dizia que ele “estava fora de si” (Mc 3,21), os mestres da lei diziam que “ele estava possuído pelo príncipe dos demônios” (Mc 3,22). Primeiro, Jesus responde aos de fora, depois aos de dentro.
Aos de fora, Jesus diz que se ele estivesse possuído pelo príncipe dos demônios, o demônio estaria em luta contra si mesmo, como se o mal tentasse expulsar a si mesmo dos outros. A expressão que Jesus usa – “um reino dividido contra si mesmo” (Mc 3,24) – tem algo importante a nos dizer. Quando nós permitimos que os nossos desejos, as nossas paixões e as nossas emoções corram livres dentro de nós e assumam o controle da nossa vida, nós nos tornamos divididos contra nós mesmos (porque eles são ambíguos e muitas vezes contraditórios) e essa divisão nos adoece física, emocional e espiritualmente. Quando nos tornamos “um reino dividido contra si mesmo”, o mal sempre encontra a porta aberta para entrar e se apossar de nós.
O contrário disso aparece nas palavras de Jesus: “Ninguém pode entrar na casa de um homem forte, para roubar seus bens, sem antes o amarrar. Só depois poderá saquear sua casa” (Mc 3,27). Jesus é esse homem forte, que nunca se deixou “amarrar” pelo maligno. Ele nos alerta que, se muitas vezes os bens da nossa casa são roubados, é porque nós nos deixamos amarrar (seduzir) pelo maligno, entregando em suas mãos as chaves da nossa casa. Portanto, aqui volta a pergunta: “Onde você está?” (Gn 3,9). Sua situação hoje é a de um reino dividido contra si mesmo ou a de um homem forte, que não se deixa amarrar por aquele que vem saquear sua casa (sua alma, seus valores etc.)?
O que levava Jesus a expulsar o mal da vida das pessoas era o poder do Espírito Santo. Diante da acusação de que estava possuído pelo príncipe dos demônios, Jesus faz um outro alerta: “Tudo será perdoado aos homens..., mas quem blasfemar contra o Espírito Santo nunca será perdoado” (Mc 3,28-29). Como diz o salmo 130,7-8, “no Senhor se encontra toda graça e copiosa redenção. Ele vem libertar Israel de toda a sua culpa”. Deus sempre nos perdoa porque agimos por ignorância. Mas quando o Espírito da Verdade nos convence a respeito do pecado (cf. Jo 16,8), e mesmo assim nós insistimos em fazer aquilo que é mal aos olhos de Deus, não aceitando a sua correção, estamos nos colocando fora do seu perdão.
Depois de ter respondido aos de fora, Jesus agora responde aos de dentro, à sua família, que o acusava de “estar fora de si”. Diante do desejo da família de Jesus em querer controlá-lo, Jesus diz que o centro da vida dele é fazer a vontade do Pai e quem quiser ser reconhecido como sua família precisa fazer o mesmo: “Quem faz a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (Mc 3,35). Jesus sempre se moveu dentro da vontade do Pai, rejeitando todas as propostas, inclusive as mais atraentes, que não estavam de acordo com essa vontade.
Aqui, mais uma vez, cabe a pergunta: “Onde você está?” (Gn 3,9). Você está na vontade de Deus? Diante da força do nosso ego, que sempre procura satisfazer sua própria vontade, seguir seus próprios instintos, você é capaz de dizer ‘não’ a si mesmo para dizer ‘sim’ a Deus? Jesus nunca foi um reino dividido contra si mesmo, porque quem ocupava o centro da vida dele não era a ambiguidade ou a contradição dos seus desejos humanos, mas a vontade do Pai. Era isso que unificava Jesus como pessoa e lhe dava condições de expulsar da vida das pessoas a influência diabólica do mal (“diabo” significa “aquele que divide”).
Quem aprende a viver na vontade de Deus não sente medo dele, não precisa se esconder da Sua presença e não se envergonha da própria nudez. Quem busca viver na vontade de Deus não se condena por sentir desejos contrários a essa vontade, mas se alegra em ter a liberdade de administrá-los de acordo com essa mesma vontade. Quem está na vontade de Deus torna-se senhor da sua própria casa, uma pessoa com o coração unificado, cujas palavras, cujas atitudes e cuja presença fazem com que as outras pessoas possam responder por si mesmas “onde estão”, e queiram estar onde está a vontade de Deus para elas, e não mais onde o príncipe dos demônios as arrasta, adoecendo-lhes e causando divisões e fraturas dentro e fora de si mesmas. Aprendamos com Jesus a buscar, todos os dias, viver na vontade de Deus.
Pe. Paulo Cezar Mazzi
Nenhum comentário:
Postar um comentário