Missa do Natal. Palavra de Deus: Isaías 9,1-6; Tito 2,11-14 ; Lucas 2,1-14; Isaías 52,7-10; Hebreus 1,1-6; João 1,1-18.
“O ser humano caiu, mas Deus desceu. O ser humano caiu miseravelmente, mas Deus desceu misericordiosamente” (Santo Agostinho).
Natal é descida. Em seu Filho Jesus Cristo, Deus Pai desceu até onde cada ser humano estava caído. Deus desceu para nos fazer subir do abismo em que nos jogamos ou fomos jogados: o abismo do pecado, da dor, do sofrimento, da depressão, da falta de sentido para a vida. “Eu habito em lugar alto e santo, mas estou junto com o humilhado e desamparado, a fim de animar os espíritos desamparados, a fim de animar os corações humilhados" (Is 57,15).
Natal é luz: “Para os que habitavam nas sombras da morte, uma luz resplandeceu. Porque
nasceu para nós um menino, foi-nos dado um filho” (Is 9,1b.5). O nascimento de
Jesus é comparado ao “Astro das alturas” (o Sol), por meio do qual Deus nos
visita, “para iluminar os que se encontram nas trevas e na sombra da morte” (Lc
1,79). Por mais que fujamos, a sombra da morte sempre parece nos alcançar, por meio
de uma doença, de uma perda, de um sofrimento que nos joga numa situação de
escuridão, onde não enxergamos luz, saída, sentido. Mas Jesus é “a luz
verdadeira que ilumina todo homem” (Jo 1,9). Ele mesmo se definiu como “a luz
do mundo” (Jo 8,12). Mas é preciso que cada ser humano decida deixar as trevas
em que se encontra e caminhar na direção da luz. Não nos esqueçamos desse alerta
do próprio Jesus: “A luz veio ao mundo, mas os homens preferiram as trevas,
porque suas obras eram más. Pois quem faz o mal odeia a luz e não vem para a
luz” (Jo 3,19-20).
“Luz que vem do alto, luz que traz a vida, vem
brilhar em nós, ó luz divina!”
Natal é graça: “A graça de
Deus se manifestou trazendo a salvação para todos os homens” (Tt 2,11), cumprindo
a promessa feita em Is 52,10: “Todos os confins da terra hão de ver a salvação
que vem do nosso Deus”. Jesus é a manifestação do amor gratuito de Deus, que
nos salva pela graça e não pelo mérito (cf. Ef 2,5.8). Seu amor ama a todos,
mas principalmente os que não se sentem ou não são de fato amados pelo mundo.
Sua salvação não é oferecida como um prêmio a quem se esforça ou é impecável na
sua conduta, mas é como o sol que oferece seus raios gratuitamente sobre bons e
maus e como a chuva que se derrama gratuitamente sobre justos e injustos (cf.
Mt 5,45). Jesus nasceu para todos, porque Deus quer que todos sejam salvos (cf.
1Tm 2,4) e também porque todos necessitam ser salvos.
“Eis que já chegou quem devia vir. Deus está
conosco: Emanuel, Shekinah! Deus nos visitou, Deus desceu do céu. Céus e terra
cantam este dia. Deus desceu do céu e nos visitou. Em seu Filho Santo nos
salvou. Graça de Natal, graça fraternal, dentro de Maria ele habitou” (Shekiná,
Pe. Zezinho).
Natal é manjedoura: “Maria deu
à luz o seu filho primogênito. Ela o enfaixou e o colocou na manjedoura” (Lc
2,7). A manjedoura é o lugar onde se coloca comida para os animais. Aquele que
teve por primeiro berço uma manjedoura veio nos ensinar que “nem só de pão vive
o homem” (Mt 4,4) e que devemos nos esforçar “não pelo alimento que se perde,
mas pelo alimento que dura para a vida eterna” (Jo 6,27). Além disso, a
manjedoura nos faz uma advertência: “O boi conhece o seu dono, e o jumento
aquele que o alimenta, mas o meu povo não me reconhece como seu Deus” (cf. Is
1,3). Nós celebramos o Natal como cristãos ou como pagãos, cujo deus é o
estômago? O consumismo perverteu o sentido do Natal ao substituir o essencial
pelo excesso e pelo desperdício.
“Quantas vezes quis tudo pra mim: o poder, o saber,
a riqueza... Quão mesquinho parece teu Reino se rejeito as migalhas da mesa”
(Irmã Míria Kolling).
Natal é hoje: “Hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós um Salvador, que é o Cristo
Senhor” (Lc 2,11). Aquele cujo nascimento celebramos hoje prometeu estar
conosco todos os dias (cf. Mt 28,20), e deseja estar hoje em nossa casa (cf. Lc
19,5): “Eis que estou à porta e bato: se alguém ouvir a minha voz e abrir a
porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele comigo” (Ap 3,20-21). Jesus
está presente em nosso presente, nos orientando com sua Palavra, nos
alimentando com sua Eucaristia e nos sustentando com a força do seu Espírito.
“Procuro abrigo nos corações; de porta em porta
desejo entrar. Se alguém me acolhe com gratidão, faremos juntos a refeição. Se
alguém me acolhe com gratidão, faremos juntos a refeição”.
Natal é paz na terra: “Glória a Deus
no mais alto dos céus, e paz na terra aos homens por ele amados” (Lc 2,14).
Jesus nasceu para derrubar os muros da inimizade e construir pontes de
reconciliação. “Ele é a nossa paz” (Ef 2,14). “Como são belos, andando sobre os
montes, os pés de quem anuncia e prega a paz” (Is 52,7). Natal pede
reconciliação, reaproximação, perdão. Por isso, o Natal nos coloca uma pergunta
e nos faz um desafio. A pergunta é: “Onde está teu irmão?” (Gn 4,9); o desafio
é: “Não se esconda daquele que é a sua própria carne” (cf. Is 58,7).
“Onde há ofensa que dói, que eu leve o perdão; onde
houver a discórdia que eu leve a união e tua paz!”.
Natal é Palavra: “Muitas vezes
e de muitos modos falou Deus outrora aos nossos pais, pelos profetas; nestes
dias, que são os últimos, ele nos falou por meio do Filho” (Hb 1,1). Jesus é a
Palavra definitiva do Pai para cada filho Seu na face da terra, Palavra que desperta
a vida em quem está morto, porque faz passar da morte para a vida aquele que a
escuta e nela crê (cf. Jo 5,25): “Nela estava a vida, e a vida era a luz dos homens”
(Jo 1,4).
O nascimento de Jesus é descrito como o momento no qual “a Palavra se fez carne
e habitou entre nós” (Jo 1,14). Carne é o ser humano na sua fragilidade mais
profunda, na sua miséria, na sua mortalidade. Jesus é a Palavra que Deus dirige
a cada um de nós quando fazemos a nossa experiência mais profunda de sermos
carne. Quando pecamos, essa Palavra nos diz: “Filho, teus pecados estão
perdoados” (Mc 2,5). Quando nos perdemos, essa Palavra nos diz: “Eu vim
procurar e salvar o que estava perdido” (cf. Lc 19,10). Quando sofremos
tribulações, essa Palavra nos diz: “No mundo vocês terão tribulações, mas
tenham coragem: eu venci o mundo!” (Jo 16,33).
“Eu
guardarei tua Palavra em meu coração. Na tribulação invocarei teu santo Nome,
Jesus. A tua destra me sustenta. Da Aliança não esquecerei. Tua Palavra me
alimenta: não vacilarei. Leva-me às águas profundas, aviva-me de novo, Senhor!
Leva-me às águas profundas e fala ao meu coração!” (Tony Allysson, Águas
profundas).
Natal é,
enfim, tornar-se humano, amar ser
humano, não desistir de ser humano, voltar a ser humano: “Neste Natal, faça
como Deus: torne-se humano!” (Jung Mo Sung, teólogo coreano).
Pe. Paulo
Cezar Mazzi
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