Missa do 4º dom. do advento. Palavra de Deus: Miqueias 5,1-4a; Hebreus 10,5-10; Lucas 1,39-45.
Segundo o evangelista Lucas, a vida de
cada um de nós está inserida dentro da história da salvação, uma história que
abrange três tempos: o tempo da promessa (Antigo Testamento), o tempo do
cumprimento (Novo Testamento) e o tempo da Igreja, que se estende até a segunda
vinda do Senhor Jesus (Parusia). Nós estamos, especificamente, dentro da última
fase da história da salvação.
O tempo da promessa aparece na profecia
de Miqueias. A um povo humilhado, angustiado e com um futuro incerto, Deus
promete lhe enviar um rei humilde e bom, que vai lhe trazer prosperidade,
justiça e harmonia. Detalhe importante: esse rei não nascerá em Jerusalém, no
palácio real, onde a vida decorre no meio de intrigas, ambições, corrupções e jogos de poder; mas virá da pequena aldeia de Belém de onde veio o rei Davi, homem segundo o coração de Deus. Ele será a paz,
porque trará abundância de vida, harmonia e felicidade plena. A insignificante
Belém nos lança uma pergunta: “Onde você procura pelos sinais de Deus em sua
vida: nos acontecimentos extraordinários, ou na rotina do seu dia a dia?”.
O grande desafio do tempo da promessa é
esperar pelo seu cumprimento: “Deus deixará seu povo ao abandono, até ao
tempo em que uma mãe der à luz!” (Mq 5,2). Essa sensação de abandono se refere
a um tempo de provação e sofrimento, algo que conhecemos muito bem! No entanto,
esse abandono pode se dar também por nós, como Jesus afirma à Igreja de Éfeso:
“Você abandonou o seu primeiro amor... Recorde-se onde você caiu, converta-se e
retome a conduta de antes” (Ap 2,4-5). Nós até podemos continuar a caminhar com
Jesus, mas o fazemos sem o ardor inicial, sem um amor profundo por Ele; talvez, apenas
por medo de perder a salvação, mas não por convicção de que Ele é o nosso tudo.
O Evangelho nos traz o tempo do
cumprimento da promessa. O rei prometido já se encontra no ventre de Maria, uma
mulher simples e pobre, moradora da insignificante cidade de Nazaré. Estamos
diante da “visitação” de Maria a Isabel. Para falar da cura da esterilidade de
Sara, mulher de Abraão, a Escritura diz que “o Senhor visitou Sara, como
dissera, e fez por ela como prometera. Sara concebeu e deu à luz um filho...”
(Gn 21,1-2). Para anunciar o nascimento de Jesus, nosso Salvador, Zacarias
disse: “Bendito seja o Senhor, Deus de Israel, porque visitou e redimiu seu
povo” (Lc 1,68). Nós acolhemos as visitas de Deus, ou nos comportamos como a
cidade de Jerusalém, quando Jesus a visitou: “Não reconheceste o tempo em que
foste visitada!” (Lc 19,44)?
A visita de Maria fez com que a criança
pulasse de alegria no ventre de Isabel e ela ficasse cheia do Espírito Santo
(cf. Lc 1,41). Maria e Isabel eram primas. O Evangelho está nos convidando a
visitar nossos familiares, a romper o silêncio, a diminuir a distância, a
derrubar o muro de separação, a passar por cima do nosso orgulho, a diluir o
nosso ressentimento, a vivermos a experiência do milagre da reconciliação. Além
disso, hoje somos nós que, junto com o salmista, pedimos: “Lembra-te de mim,
Senhor, (...) visita-me com a tua salvação” (Sl 106,4). Cada um de nós
necessita ser visitado por Deus, para que a alegria da salvação seja sentida a
partir do nosso íntimo. Por isso, em sintonia com o salmo de hoje, nós
suplicamos: “Despertai vosso poder, ó nosso Deus, e vinde logo nos trazer a
salvação! (...) Visitai a vossa vinha e protegei-a!” (Sl 80,3.15).
Já meditamos sobre o tempo da promessa
(Miqueias) e o tempo do cumprimento (Evangelho). Consideremos agora o tempo da
Igreja, o nosso tempo atual. Ele se encontra na carta aos Hebreus,
convidando-nos a nos posicionar diante de Deus e da vida como Jesus se
posicionou. Desde que veio ao mundo, Jesus escolheu fazer da sua vida uma
entrega absoluta à vontade do Pai: “Eu vim, ó Deus, para fazer a tua vontade”
(Hb 10,7). Ora, a obediência a Deus implica muitas vezes em sacrificar o nosso
ego, os nossos planos, para abraçarmos os planos d’Ele a nosso respeito. O que
é que nos move, nos faz todos os dias levantar da cama e enfrentar o mundo: os
nossos interesses pessoais, as nossas realizações humanas, ou a fidelidade à
missão que o Pai nos confiou?
Para o autor da carta aos Hebreus, fazer
a vontade do Pai é fazer da própria vida uma entrega, uma oferenda, um
sacrifício: “É graças a esta vontade (escolha diária do Filho em fazer a
vontade do Pai) que somos santificados pela oferenda do corpo de Jesus Cristo,
realizada uma vez por todas” (Hb 10,10). A Eucaristia que comungamos é a
oferenda do corpo de Jesus Cristo, realizada uma vez por todas na cruz.
Comungá-la implica em fazermos da nossa vida uma oferenda ao Pai, pela salvação
dos nossos irmãos e irmãs. Quem comunga o corpo de Jesus Cristo, mas não está
disposto a se sacrificar pela salvação da família, da sociedade humana, da
Igreja, do mundo atual, não entendeu o significado da oferenda do corpo de
Cristo. Em suma, a pergunta que a Eucaristia nos coloca nunca será: “O que a
vida tem a me oferecer?”, mas sempre será: “O que eu tenho a oferecer à vida?”.
Isso significa que é a oferenda diária de nós mesmos que fará as pessoas do
nosso tempo sentirem-se visitadas por Deus e por Sua salvação.
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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