quinta-feira, 26 de setembro de 2024

TRÊS GRANDES PAULADAS EM NOSSA CONSCIÊNCIA

 Missa 26º dom. comum. Palavra de Deus: Números 11,25-29; Tiago 5,1-6; Marcos 9,38-43.45.47-48

 

            Chegamos ao último domingo do mês da Bíblia. Às vezes, a Palavra de Deus, na liturgia do domingo, nos oferece um único fio condutor para a nossa reflexão, como aconteceu domingo passado: a questão da necessidade de reconhecimento e de aceitação. Hoje, não temos um único fio condutor, mas ao menos três: a questão da inveja no campo religioso, a questão do escândalo que leva as pessoas a perderem a fé e a questão das injustiças sofridas pelos pobres por causa das desigualdades sociais.

 

A inveja no campo religioso.

 

Tanto Josué (1ª leitura) quanto João (Evangelho) tiveram dificuldade em compreender que Deus é livre e age onde quer, independente de qualquer instituição religiosa. O Espírito de Deus é livre como o vento (cf. Jo 3,8) e não pode ser aprisionado por nenhuma instituição religiosa. “Deus quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade” (1Tm 2,4). Os caminhos que Ele usa para isso nunca podem ser determinados por qualquer igreja ou religião.

A inveja nasce do sentimento de inferioridade: eu me sinto menos do que o outro; por isso, qualquer coisa que ele aparente ser ou ter a mais do que eu mexe com a minha inferioridade e me faz invejar o que ele tem ou é. A cura da inveja passa pelo reconhecimento do meu valor como pessoa: eu não sou e não devo ser como o outro, pois isso cancelaria a minha originalidade e a minha unicidade. Somos todos “notas musicais”: nenhuma nota sozinha é capaz de fazer uma canção. É a originalidade de cada nota, em comunhão (harmonia) com as demais, que possibilita o nascimento da música.

Dois grandes erros precisam ser evitados, quando se trata da pluralidade religiosa do mundo atual: o relativismo – a ideia de que tudo é de Deus e tudo leva para o mesmo objetivo – e a pretensão da exclusividade – “Só a minha igreja/religião salva”.  

 

A questão do escândalo que leva à perda da fé.

 

Onde existe o ser humano, existe a possibilidade do escândalo, do erro, da falha, do pecado. Jesus não se escandaliza com o pecado de ninguém, pois ele foi humano como nós e é capaz de se compadecer das nossas fraquezas (cf. Hb 4,15). No entanto, deixa claro que quando uma atitude nossa – consciente e intencional – leva uma pessoa a perder a fé em Deus, isso terá como consequência a nossa condenação eterna. Quem “joga” uma pessoa nos braços do Maligno com o seu erro terá o Maligno por “recompensa”.

            Jesus quer nos tornar conscientes de que todos nós temos o nosso “calcanhar de Aquiles”, o nosso ponto fraco, e quem acha que nunca se tornará causa de escândalo para alguém não se conhece verdadeiramente. A única forma de se evitar causar escândalo é frustrar o próprio desejo. As expressões “cortar a mão”, “cortar o pé” e “arrancar o olho” significam dar um corte em nós mesmos – especificamente, na área do desejo. Aqui precisamos recordar mais uma vez: sentir não significa consentir. O pecado não entra no sentir, mas no consentir. Não escolhemos sentir desejo, mas temos liberdade e responsabilidade quanto ao consentir que ele nos leve a pecar e, consequentemente, a nos tornar causa de escândalo para os outros. Por que causa de escândalo? Porque o próprio Jesus garantiu: “Não há nada encoberto que não venha a ser descoberto, nem de oculto que não venha a ser revelado” (Mt 10,26).

            Se o mundo atual reduziu o sentido da vida a sentir prazer, devemos estar cientes de que frustrar o próprio desejo é uma tarefa difícil, sofrida e que pouquíssimas pessoas se disporão a enfrentar. No entanto, é a capacidade de lidar com frustração que diferencia um adulto de uma criança. Só quem é verdadeiramente uma pessoa madura, adulta, consegue dizer “não” a si mesma. Quanto mais somos pessoas infantilizadas, adultas quanto a algumas questões, mas adolescentes quanto a outras, menos capacidade – e, sobretudo, vontade – temos de frustrar determinados desejos que darão origem a escândalos, que por sua vez farão pessoas desacreditarem de nós mesmos, de Deus e da nossa Igreja.     

 

Gerar ou alimentar desigualdade social é condenar-se perante Deus.

 

São Tiago nos alerta que todo salário mal pago grita aos ouvidos de Deus! Empresários cristãos precisam se libertar da ganância desmedida do enriquecimento individual e tornar suas empresas promotoras de justiça social. A desigualdade de salários nas empresas em geral é, via de regra, absurda e gritante. Os que mais trabalham, os que mais estão expostos a riscos para a sua saúde, são os que têm os salários mais baixos. Se o enriquecimento de uma Empresa é fruto de salários miseráveis pagos aos seus funcionários, esse enriquecimento está condenado perante Deus: “Vós vivestes luxuosamente na terra, entregues à boa vida, cevando os vossos corações para o dia da matança. Condenastes o justo e o assassinastes; ele não resiste a vós” (Tg 5,5-6). Todo empresário que paga salários de fome aos seus funcionários enquanto ele mesmo vive uma vida de luxo é um assassino aos olhos de Deus.

 

Enfim, por uma questão de verdade e de justiça, lembremos que o outro lado da moeda se chama “Justiça do Trabalho”, onde muitos trabalhadores desonestos, orientados por advogados igualmente desonestos, vão reivindicar valores financeiros injustos e absurdos, “quebrando” empresários. Todas as pessoas que participam desse jogo sujo, que assassina a verdade e a justiça em nome do dinheiro, terão que prestar contas das suas atitudes perante o Justo Juiz, cuja justiça não tem como ser comprada.

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi    

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