Missa do 19º dom. comum. Palavra de Deus: 1Reis 19,9a.11-13a; Romanos 9,1-5; Mateus 14,22-33.
Na Bíblia, o mar simboliza as forças
do mal, forças que o ser humano não consegue dominar. A ordem que Jesus dá aos
discípulos, de entrarem na barca e atravessarem o mar até a outra margem, se repete
em nossa história pessoal e social toda vez que a vida, por meio de algum
acontecimento inesperado, nos tira da nossa acomodação e nos diz que está na
hora de fazer uma travessia. Atravessar o mar da vida significa crescer,
tornar-se melhor, amadurecer, libertar-se de vícios ou de situações que estão
nos fazendo mal, aprofundar a nossa fé, conhecer Deus de uma maneira nova e
mais profunda etc.
Qual travessia a vida está
desafiando você a fazer nesse momento?
Sempre que tomamos a decisão de fazer o que é
certo, de enfrentarmos determinado desafio, de resolvermos determinado
problema, precisamos estar preparados para lidar com obstáculos, com ventos
contrários. Às vezes esses ventos contrários sopram dentro de nós: é a voz do
nosso medo. Outras vezes, eles sopram fora de nós: pessoas ou situações
externas se levantam para tentar nos convencer de que a travessia não dará
certo. Quando, então, somamos o nosso medo interno com as “pressões externas”,
a fome se junta com a vontade de comer e o estrago está feito: permanecemos na margem
em que estamos, e a nossa vida fica estagnada, paralisada, vazia de sentido.
Se não queremos sabotar nosso
próprio crescimento e se não queremos interromper a obra que a graça de Deus
está realizando em nós, precisamos obedecer à voz de Jesus e fazer a travessia
que nos foi proposta, sabendo que, enquanto atravessamos o mar da vida, o
próprio Jesus está em oração diante do Pai, intercedendo dia e noite em nosso
favor (cf. Hb 7,25; 9,24). Contudo, como acabou de nos mostrar o Evangelho, a
intercessão de Jesus por nós não significa que nenhum vento contrário virá em
nossa direção. Ventos contrários sempre surgirão, provocando agitação no mar da
nossa vida, e isso acontecerá para que cada um de nós verifique o quanto está levando
a sério a travessia que foi chamado a fazer. Além disso, quanto mais o vento
sopra contrário, mais precisamos nos deixar impulsionar para a frente pelo sopro
do Espírito de Deus, que nos capacita a enfrentar o que fomos chamados a
enfrentar.
“Pelas três horas da manhã, Jesus veio até
os discípulos, andando sobre o mar... ‘Coragem! Sou
eu. Não tenhais medo!’” (Mt 14,25.27). Se o mar representa as forças do mal que
nenhum ser humano domina, Jesus “anda sobre o mar”, pois ele é maior do que
todo e qualquer mal que tente nos fazer retroceder em nosso caminho de fé. Portanto,
nossos olhos não devem se fixar no vento que sopra contrário a nós, mas em
Jesus, que tem o poder se fazer calar os ventos contrários e acalmar o mar
agitado da nossa vida. Enquanto Pedro mantinha os olhos fixos em Jesus,
conseguiu caminhar sobre o mar agitado, mas ao desviar os olhos, alimentando dentro
de si mais o medo diante do vento contrário do que a fé em Jesus, começou a
afundar.
“Jesus logo estendeu a mão, segurou Pedro, e lhe
disse:
‘Homem fraco na fé, por que duvidaste?’” (Mt 14,23).
Aquilo que nos derruba não são os ventos contrários, mas uma fé fraca, sem
profundidade nem convicção, uma fé mais pautada na emoção do que na
inteligência, uma fé que não se aprofunda no conhecimento da Sagrada Escritura,
mas se alimenta de devoções superficiais e supersticiosas. Nossa fé precisa urgentemente
ser purificada, como aconteceu com o profeta Elias. Esse profeta só conseguia “sentir”
Deus quando experimentava fortes emoções, comparadas ao furacão, ao terremoto e
ao incêndio. “Mas o Senhor não estava” em nenhuma dessas experiências intensas com as quais Elias estava habituado. Somente quando o seu interior foi capaz de
silenciar a ponto de ele “ouvir o murmúrio de uma leve brisa”, é que se
encontrou com a presença de Deus. Em outras palavras, só uma fé que aprendeu a
suportar o silêncio de Deus pode ser considerada verdadeira, comprovada e capaz
de enfrentar o barulho vazio dos ventos contrários.
“O
vento sopra o quanto quer; a montanha jamais se curva diante dele” (provérbio
chinês). “Os que estavam no barco, prostraram-se diante dele, dizendo: ‘Verdadeiramente,
tu és o Filho de Deus!’” (Mt 14,31). Não são poucas as pessoas que, por muito
ou por pouco, se dobram e se quebram diante dos ventos contrários. Não é diante
deles que devemos nos dobrar, mas diante do Filho de Deus que nos quer firmes e
fiéis em nossa travessia, enfrentando o mal que há no mundo, olhando sempre
para a frente, cheios de coragem e confiantes, seja na sua intercessão em nosso
favor, seja na sua presença no barco da nossa vida.
Oremos pelos pais! Mais da metade das famílias
brasileiras não tem o pai dentro de casa. Além disso, muitos homens estão dobrados
diante do vento da desorientação, da descrença, do pessimismo, do vitimismo,
dos vícios, de comportamentos autodestrutivos; são homens cuja alegria depende
da bebida alcoólica, cuja igreja é o bar, cuja religião é o time de futebol; homens
marcadamente ausentes das nossas celebrações, talvez devido a uma Igreja pouco
masculina, excessivamente efeminada, com cujas linguagem e postura não se identificam. Rezemos pelo pai empresário,
pelo pai trabalhador, pelo pai desempregado e, de modo especial, pelo pai que
busca no Evangelho e na Eucaristia a força para enfrentar os ventos contrários e
continuar a conduzir sua família para a outra margem, em vista da salvação dos que
foram confiados aos seus cuidados.
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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