Missa da 4ª. feira de cinzas. Palavra de Deus: Joel 2,12-18; 2Coríntios 5,20 – 6,2; Mateus 6,1-6.16-18
Mudanças. Algumas são boas e
necessárias para a nossa vida; outras são ruins e não desejadas por nós. A
palavra-chave neste tempo que estamos iniciando hoje – Quaresma – é CONVERSÃO.
Ela significa não apenas mudança de direção, mas mudança de mentalidade. Quando
Deus nos chama à conversão, Ele nos convida a mudar não somente a nossa forma
de compreender a vida, mas sobretudo de vivê-la, de fazer aquilo que fazemos.
Certamente cada um de nós deseja
algum tipo de mudança na sua vida. Ela pode ser necessária no campo
profissional, familiar, emocional ou mesmo espiritual. O problema é que as
mudanças que realmente transformam a nossa vida não acontecem instantaneamente,
mas se dão por meio de um processo. Esse processo está simbolizado na Bíblia
pela duração de “quarenta dias”. Deus deseja realizar mudanças em nossa vida,
mudanças que visam não simplesmente a nossa felicidade, o nosso bem-estar, mas
principalmente a nossa salvação. Ele nos convida a fazer um caminho de quarenta
dias, porque nós não nos libertamos de vícios e hábitos nocivos jogando-os pela
janela, mas fazendo-os descer degrau por degrau.
O caminho da Quaresma nos conduz à
transformação operada pela Páscoa – a passagem de uma situação de morte para
uma situação de vida. Nesse caminho, nós avançamos e retrocedemos, tropeçamos e
caímos, mas o fundamental é nos levantar e retomar o caminho cada dia, sabendo
que a mudança depende muito mais da graça de Deus em nós do que do nosso
esforço em mudar. O barro não muda por si mesmo; ele só se transforma num vaso
quando se permite ficar nas mãos do oleiro. Deus, nosso Oleiro, nos convida a
nos confiar às suas mãos, para que cheguemos à Páscoa modificados,
transformados, renascidos como homens e mulheres novos.
Jesus nos propõe revisar três áreas
da nossa vida: a área social, marcada por desigualdades e injustiças que causam
pobreza e sofrimento a muitas pessoas; a área espiritual – nossa vida de oração
e, finalmente, a área dos nossos desejos e da nossa liberdade, marcada por
vícios e compulsões que nos escravizam e nos intoxicam física, emocional e
espiritualmente.
A área social é abordada por Jesus a
partir da ESMOLA. Ela não significa dar alguma coisa ao necessitado apenas para
aliviar a nossa consciência. A esmola é um questionamento a respeito das nossas
atitudes para com os problemas sociais: violência, fome, injustiça, desemprego,
desestruturação familiar, drogas etc. Quando Jesus nos convida a dar esmola ao
necessitado nos convida a tomar consciência de que a nossa presença na
sociedade humana deve torná-la melhor, menos injusta e menos desigual. É por
isso que, durante a Quaresma, a Campanha da Fraternidade nos propõe refletir
sobre um tema social que está pedindo a nossa atenção. Neste ano, é o tema da fome,
vinculado com uma ordem de Jesus: “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 14,16).
Outra área abordada por Jesus é a
nossa vida de oração. Não existe mudança ou transformação que se dê em nós sem
a graça de Deus, e esta só nos chega por meio da oração. A oração, como
sabemos, não é uma questão de ter tempo ou ter vontade, mas uma questão de
estar convencido de que, sem a graça de Deus, nada muda ou se transforma em
nós. O tempo que dedicamos diariamente à oração é o espaço que damos a Deus
para curar nossas feridas, para nos libertar das nossas prisões, para nos
ajudar a ver a vida para além do beco sem saída no qual nos vemos. Sem a
oração, nós não chegamos a lugar algum. Sem a oração, nós somos vencidos pelas
dificuldades da vida. Sem a oração, nós adoecemos física e emocionalmente, pois
o nosso espírito morre por desnutrição.
A terceira área mencionada por Jesus
é a área instintiva, na qual se encontram as nossas necessidades básicas. Ela
abrange não somente o nosso instinto de sobrevivência – comer – mas também os
nossos desejos, os quais muitas vezes se tornam para nós armadilha e prisão. Ao
nos propor o JEJUM, Jesus nos convida a exercitar a nossa liberdade e o nosso
autodomínio. Se os nossos desejos gritam dentro de nós, a nossa consciência
precisa falar mais alto em nós do que os nossos desejos. Enquanto os desejos
nos aprisionam nas nossas necessidades, a nossa consciência nos liberta a
partir dos valores que nos conduzem a Deus, pois “o homem não vive somente de
pão” (Mt 4,4); em outras palavras, há desejos em nós que vão muito além do
nosso estômago ou da satisfação das nossas necessidades afetivas e sexuais:
nossa alma tem sede de Deus e deseja o Deus vivo (cf. Sl 42,3; Sl 63,2)!
Ao iniciarmos o tempo da Quaresma, duas palavras se apresentam diante de nós: MUDANÇA e FOME. Qual mudança precisa se dar em minha vida, se eu quiser salvar aquilo que mais amo? Qual mudança eu não quero para a minha vida, mas que Deus sabe necessária para a minha salvação? Qual a minha disposição em iniciar esse caminho de quarenta dias, em vista da minha passagem da escravidão para a liberdade, da morte para a vida? Qual é a minha fome nesse momento? Qual fome em mim é fabricada / manipulada pela sociedade de consumo? Quantas necessidades em mim não são verdadeiras, mas artificiais, criadas para sugar meu tempo, meu dinheiro, minhas energias, comprometendo valores importantes como saúde, família, espiritualidade? Eu tenho consciência da minha fome de Deus e de sentido de vida? Como eu respondo a Jesus, que revela a minha parcela de responsabilidade diante da fome que está à minha volta (cf. Mt 14,16)?
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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