Missa do 7. dom. comum. Palavra de Deus: Levítico 19,1-2.17-18; 1Coríntios 3,16-23; Mateus 5,38-48.
Quantas pessoas você já bloqueou,
cancelou ou excluiu dos seus contatos nas suas redes sociais (Whatsapp,
Facebook, Instagram)? Cancelar, excluir ou bloquear pessoas tornou-se muito
comum, nas redes sociais. É uma atitude que fazemos sem nenhum peso na
consciência: basta que a pessoa manifesta um pensamento contrário ao nosso; basta
que ela emita uma opinião diferente da nossa ou que faça uma crítica a alguma
postagem nossa.
De onde vem essa incapacidade de
conviver com o diferente? Da própria Internet. Ela está programada de tal forma
que, ao identificar nossos gostos, preferências e opiniões, nos envia
automaticamente conteúdos que confirmam o nosso ponto de vista e jamais nos mostre
o contrário. Desse modo, quem tem uma tendência para a esquerda, só vai receber
conteúdos “de esquerda”; quem tem uma tendência para a direita, só vai receber
conteúdos “de direita”. O resultado disso se chama “bolha”: nós ficamos
dialogando sempre com pessoas que pensam igual a nós e nos tornamos incapazes
de dialogar e conviver com quem pensa diferente de nós. A “bolha” nos fecha em
nossa visão de mundo e nos impede de alargar a nossa compreensão a respeito da
realidade que nos cerca, que é sempre muito maior do que aquilo que conseguimos
enxergar.
A incapacidade de conviver ou de
ouvir aquele que pensa diferente de nós tem um nome: ódio. O ódio é um muro que
nós levantamos para nos separar da pessoa que não faz parte da nossa bolha,
seja essa bolha a cor da nossa pele, a nossa condição social, a orientação da
nossa sexualidade, o nosso time de futebol, o nosso partido político, a nossa
igreja, a nossa visão de mundo etc. Se, então, o ódio tem se tornado comum em
nosso dia a dia, Deus nos alerta, na sua Palavra: “Não tenhas no coração ódio contra teu irmão. Repreende o teu próximo, para não te tornares culpado de pecado por causa dele. Não procures vingança, nem guardes rancor... Amarás o teu próximo como a
ti mesmo” (Lv 19,17-19).
Para
nós, que vivemos uma época de acentuação da polarização – os da direita e os da
esquerda se odeiam mutuamente –, Jesus chama a atenção para uma outra diferença
muito mais séria: ‘Vocês vivem como cristãos ou como pagãos?’. Enquanto os
pagãos agem a partir dos próprios instintos, o cristão é chamado a agir a
partir da sua consciência. Enquanto os pagãos são incapazes de gratuidade –
ajudam apenas aqueles que os ajudam –, o cristão é chamado a viver a partir da
gratuidade, a exemplo do Pai do Céu, que faz brilhar o sol sobre bons e maus e
chover sobre justos e injustos, porque Ele ama a todos (cf. Mt 5,45).
Na
época de Jesus, a religião havia feito uma redução quanto ao mandamento do amor
ao próximo: “Amarás o teu próximo e não terás a obrigação de amar o teu inimigo”.
Jesus eliminou essa redução e nos lançou um desafio: ‘Se você quiser ser
reconhecido como meu discípulo; se você quiser se tornar filho do meu Pai que
está no Céu, ame o seu inimigo e reze por aqueles que fazem mal a você’. Quando
Jesus fala de ‘amar o inimigo’, não está dizendo que devemos sentir afeto pela
pessoa que nos faz mal, mas que devemos tomar a seguinte decisão: ‘Vou tratar a
pessoa como eu gostaria que ela me tratasse’(cf. Mt 7,12). Nisso se resume o
amor: não é um sentimento de afeto, mas uma forma de tratar a pessoa.
Enquanto
os pagãos amam quem os ama e odeiam quem os odeia, o cristão é chamado a sair
dessa postura meramente “reativa” – eu apenas reajo à maneira como o outro me
trata –, e assumir uma postura de liberdade e de decisão: ‘Embora eu tenha sido
ferido ou injustiçado por uma pessoa, escolho tratá-la como eu gostaria que ela
me tratasse’. Em outras palavras, as minhas atitudes são escolhidas por mim, e
não ‘determinadas’ pela pessoa que está me fazendo o mal. Quem faz isso, toma a
vida nas próprias mãos e não permite ficar nas mãos do outro como se fosse um
fantoche.
Diante
dessa diferença de atitude entre um pagão e um cristão, apresentada por Jesus
no Evangelho, precisamos nos lembrar de que o nosso mundo está cada vez mais
paganizado, o que significa reconhecer que nós, cristãos, estamos vivendo como
pagãos no dia a dia em nome da mera sobrevivência. Não esqueçamos da
advertência do apóstolo Paulo aos judeus da sua época: “Por causa de vocês, o
nome de Deus é blasfemado entre os pagãos” (Rm 2,24). Se cada vez mais pessoas
deixam de acreditar em Deus é também porque muitos de nós, cristãos, não
vivemos como filhos d’Ele, ou seja, somos interesseiros e egoístas; alimentamos
discursos de ódio; não nos abrimos a quem pensa diferente de nós; somos
incapazes de gratuidade, o que significa fazer o bem a todos, inclusive a quem
nos faz o mal.
Se
a cultura do ódio se tornou “normal” no mundo de hoje, principalmente nas redes
sociais, devemos recordar quem somos: “Sois santuário de Deus... o Espírito de
Deus mora em vós... Se alguém destruir o santuário de Deus, Deus o destruirá,
pois o santuário de Deus é santo, e vós sois esse santuário” (1Cor 3,16-17). O Espírito de Deus é
amor (cf. Rm 5,5; 1Cor 13,7). O cristão é um ser humano ungido pelo Espírito de
Deus. Justamente por isso, é uma contradição ser cristão e odiar, alimentando a
polarização no campo político e religioso, fechando-se numa bolha e decidindo
não dialogar com quem pensa diferente. O ódio é o instrumento que o diabo
(divisor) usa para dividir, separar, criar inimizade e tornar insuportável a
convivência nas famílias, nos ambientes de trabalho, nas igrejas e no campo da
política. Que o amor de Deus, que é o Espírito Santo derramado em nossos
corações (cf. Rm 5,5), inspire nossas atitudes no dia a dia na convivência com
as pessoas.
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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