Missa do 18. dom. comum. Palavra de Deus: Eclesiastes 1,2; 2,21-23; Colossenses 3,1-5.9-11; Lucas 12,13-21.
Nós, seres humanos, buscamos por uma
segurança, por uma garantia perante a vida, sobretudo em relação ao futuro, ao
amanhã. Queremos nos garantir contra uma eventual doença ou velhice que exija
que sejamos cuidados, e que, portanto, não fiquemos desamparados. Por vivermos
numa sociedade capitalista, entendemos que somente o dinheiro pode nos garantir
um futuro em não fiquemos desamparados.
“Alguém,
do meio da multidão, disse a Jesus: ‘Mestre, dize ao meu irmão que reparta
a herança comigo’” (Lc 12,13). Aqui a herança aparece como garantia de um
futuro tranquilo, amparado, seguro. Na verdade, independente de “herança”, era
para todos nós, brasileiros, termos o nosso futuro amparado por uma
aposentadoria digna. Contudo, a corrupção, que está presente tanto no topo da
pirâmide social (política) quanto na base dela (povo), tem sinalizado que, no
futuro, não haverá mais aposentadoria (a não ser privada), contemplando apenas aqueles
que dela sempre usufruíram com grande abundância: políticos, juízes e grandes empresários.
O resto da população terá que sobreviver como conseguir, sem nenhum tipo de
amparo do Estado.
Conhecendo
o coração humano e sua busca pela enganadora garantia de amparo financeiro,
Jesus afirma: “Tomai cuidado contra todo tipo de ganância, porque, mesmo que
alguém tenha muitas coisas, a vida de um homem não consiste na abundância de
bens” (Lc 12,15). Por acreditar que o futuro está garantido pela abundância de
bens, pessoas têm recorrido ao tráfico de drogas, à venda de medicamentos
roubados, ao tráfico de pessoas e de órgãos, à destruição da verdade e da
justiça diante dos tribunais, à manipulação do Evangelho e das consciências
religiosas, à propagação ou manutenção da violência para manter aquecida a
indústria das armas etc.
Na
sua Encíclica Social “Fratelli tutti”, o Papa Francisco, afirmou: “Precisamos
fazer crescer a consciência de que, hoje, ou nos salvamos todos ou não se salva
ninguém” (n.137). Foi por isso que Jesus nos contou a parábola do homem
que, fechado no seu individualismo, quis garantir seu futuro sem se importar
com ninguém mais que não fosse ele mesmo: “Meu caro, tu tens uma boa reserva
para muitos anos. Descansa, come, bebe, aproveita!” (Lc 12,19). Para esse
homem, as outras pessoas não existem; antes, se existem, é para que ele possa
lucrar com elas de alguma maneira. Obcecado por garantir sua sobrevivência a
partir do acúmulo de dinheiro, ele se esqueceu de que “ninguém se livra de
sua morte por dinheiro nem a Deus pode pagar o seu resgate. A isenção da
própria morte não tem preço; não há riqueza que a possa adquirir, nem dar
ao homem uma vida sem limites e garantir-lhe uma existência imortal” (Sl 49,8-10).
Nós
conhecemos não poucas pessoas ricas cuja fortuna foi incapaz de impedi-las de
morrer. Mas o alerta de Jesus não é somente para os que fazem da sua riqueza
seu porto seguro. Ele é válido para todos! Nós todos necessitamos de dinheiro
para sobreviver no mundo atual, cujo deus é o mercado. Mas o problema nem está
na sobrevivência, e, sim, na atitude insana de quem “gasta sua saúde para
ganhar dinheiro; depois gasta seu dinheiro para tentar recuperar sua saúde, o
que faz com que a pessoa viva como se nunca fosse morrer, e morre como se nunca
tivesse vivido”, parafraseando Dalai Lama. O problema está em gastar tempo,
saúde e dinheiro correndo atrás do que é vazio.
Nessa
sociedade de valores invertidos, alimentar a própria vaidade tornou-se mais
importante do que alimentar o próprio caráter. Para uma pessoa escrava da
vaidade, “toda a sua vida é sofrimento, sua ocupação, um tormento. Nem mesmo de
noite repousa o seu coração” (Ecl 2,23). É alguém constantemente insatisfeito,
porque passa seu tempo tentando preencher vazio com vazio, pois vaidade
significa exatamente isso: vazio. O contrário de uma vida vazia é uma vida com
sentido, e o sentido da vida está em manter a consciência de que a nossa
existência neste mundo é extremamente breve, como a “erva verde pelos campos: De
manhã ela floresce vicejante, mas à tarde é cortada e logo seca” (Sl 90,11).
Manter a consciência de que vamos morrer nos ajuda a viver com responsabilidade
esta vida que nunca mais voltaremos a ter, pedindo diariamente ao Senhor: “Ensinai-nos
a contar os nossos dias, e dai ao nosso coração sabedoria! Que a bondade do
Senhor e nosso Deus repouse sobre nós e nos conduza! Tornai fecundo, ó
Senhor, nosso trabalho” (Sl 90,12.16-17).
Enfim, que possamos nos deixar
provocar pelo convite do apóstolo Paulo: “Esforçai-vos por alcançar as coisas
do alto... aspirai às coisas celestes e não às coisas terrestres... Fazei
morrer o que em vós pertence à terra: imoralidade, impureza, paixão, maus
desejos e a cobiça, que é idolatria” (Cl 3,1.2.5). Se há algo pelo qual devemos
trabalhar para nos garantir não é quanto a um futuro financeiramente tranquilo,
mas quanto à vida eterna junto a Deus. Perdê-la, significa ter perdido tudo, e
a vida eterna “se adquire” não ajuntando tesouros para si mesmo, mas socorrendo
os que à nossa volta estão necessitados. São eles que nos receberão “nas
moradas eternas” (Lc 16,9).
Pe.
Paulo Cezar Mazzi