Missa do 12. dom. comum.
Palavra de Deus: Jeremias 20,10-13; Romanos 5,12-15; Mateus 10,26-33.
O
Evangelho de hoje é uma continuação daquele que ouvimos no domingo passado, retratando
o momento em que Jesus envia os doze apóstolos para a missão de curar os
doentes, ressuscitar os mortos, purificar os leprosos e expulsar os demônios
(cf. Mt 10,8). Ao enviá-los para esta missão, Jesus, primeiramente, “deu-lhes
autoridade” (v.1), isto é, deu-lhes a força espiritual para realizarem tal
missão, mas depois quis torná-los conscientes de que enfrentariam fortes resistências
por parte de muitas pessoas, a ponto de serem agredidos e perseguidos (cf. Mt
10,17-25). Esse realismo de Jesus certamente ativou o sentimento de medo nos
apóstolos. É por isso que no Evangelho de hoje ouvimos Jesus repetir três vezes:
“Não tenham medo” (vv.26.28.31).
São
muitos os medos que nos habitam. Sem esquecer o medo atual da contaminação pelo
coronavírus, temos medo de perder o emprego, medo de não ter meios para
sobreviver, medo da violência que infelizmente faz parte da rotina do nosso
País, medo de desenvolver um câncer, medo que o nosso relacionamento com a
pessoa amada termine, medo de perder as pessoas que amamos; os pais temem pela
vida e pela felicidade dos filhos; os filhos temem em não dar conta dos
desafios da vida; os jovens temem envelhecer; os idosos temem ser descartados,
esquecidos, abandonados à solidão...
Assim
como qualquer outro sentimento, nós não escolhemos sentir medo. Porém, quando o
sentimos, precisamos nos tornar conscientes de que ele está presente em nossa
vida, procurando nos intimidar, nos fechar, nos fazer retroceder, nos acovardar.
Se não fizermos o trabalho de dialogar com o nosso medo e de nos posicionar
diante dele, ele acabará nos paralisando, nos atrofiando, nos adoecendo e nos
fazendo abandonar nosso caminho de amadurecimento, de crescimento e de
superação de nós mesmos e das nossas fraquezas. A questão não é não sentir
medo, mas não permitir que o medo determine nossas atitudes, ou ainda, não
permitir que o medo nos impeça de tomar atitudes que sabemos serem necessárias
para a nossa vida, para a nossa cura, para a nossa libertação.
Dizem que a
expressão “não tenha medo” percorre a Sagrada Escritura do início ao fim.
Constantemente Deus fala ao coração humano para não temer: não devemos ter medo
de conhecer a nós mesmos, tomando consciência da nossa força e da nossa fraqueza,
das nossas potencialidades e dos nossos limites; não devemos ter medo de nos confrontar
com a verdade que nos humilha, num primeiro momento, mas que depois nos cura e nos
liberta; não devemos ter medo de sermos corrigidos; não devemos ter medo de errar
e termos que reconhecer que erramos; não devemos ter medo de amar, ainda que
isso signifique o risco de sermos machucados em nosso amor; em uma palavra, não
devemos ter medo de viver e de pronunciar, com a nossa existência, aquela
palavra única de Deus para a humanidade, ainda que muitos rejeitarão tal
palavra.
“Não tenhais medo
dos homens, pois nada há de encoberto que não seja revelado, e nada há de
escondido que não seja conhecido” (Mt 10,26). Para dissipar o nosso medo, Jesus
nos garante que a verdade triunfará sobre a mentira, a justiça triunfará sobre
a injustiça e o bem triunfará sobre o mal. Cedo ou tarde, todo ser humano
ficará nu, isto é, será despojado das suas máscaras e das suas falsas
seguranças, e terá que confrontar-se com a sua verdade nua e crua.
“Não tenhais medo
daqueles que matam o corpo, mas não podem matar a alma!” (Mt 10,28). No ano de
2019, foram assassinadas 41.635 pessoas em nosso País (em 2020, já se registra
um aumento de 8% nesse tipo de morte). O Brasil é um país muito violento porque
socialmente injusto: pouquíssimos são muito ricos e muitos são extremamente
pobres (tanto que a maior incidência de crimes é no Norte e Nordeste). A violência
não está no DNA do brasileiro, mas na injusta e desigual destruição de renda do
Brasil. Nesse contexto, como não temermos ser mortos, seja por bandidos, seja por
policiais, seja por milicianos? Mas Jesus nos lembra que, ainda que sejamos
atingidos pela violência social, há uma vida em nós que está além do nosso
corpo: é nossa alma, nossa vida espiritual, nossa salvação em Deus. E ao nos
lembrar da nossa alma, Jesus nos questiona: como é que vocês têm medo da morte
física, mas não têm medo de morrer nos seus valores, no seu caráter, na sua decência,
na sua fidelidade, na sua fé? Não seria importante proteger esses valores muito
mais (ou pelo menos da mesma forma) do que vocês se protegem fisicamente?
Por fim, a razão pela
qual Jesus nos diz “não tenham medo” está no cuidado do Pai para conosco: “Não
se vendem dois pardais por algumas moedas? No entanto, nenhum deles cai no chão
sem o consentimento do vosso Pai. Quanto a vós, até os cabelos da cabeça estão
todos contados. Não tenhais medo! Vós valeis mais do que muitos pardais” (Mt
10,29-31). Tendo vivido no mesmo mundo hostil em que vivemos, Jesus sempre superou
seus medos humanos deixando-se ser cuidado pelo Pai. Ele compreendeu que o Pai
nos colocou no mundo não para sermos poupados de problemas e dificuldades, mas
para enfrentá-los e superá-los, na certeza de que é esse exercício de
enfrentamento que nos amadurece e nos torna pessoas adultas na fé.
Essa é a confiança
que Jesus quer que tenhamos: nada nos acontecerá sem a permissão do Pai. Além
disso, tudo o que o Pai permite que nos aconteça tem em vista o nosso bem, a
nossa correção, o nosso crescimento, a nossa santificação (cf. Rm 8,28-30).
Justamente porque o Pai não nos quer mimados, imaturos e infantilizados, Ele
não nos coloca sob uma redoma de vidro que impeça que qualquer contratempo nos
atinja. Porque nos ama e confia na força e na capacidade que nos deu, o Pai nos
lança na vida, nos desafia diariamente a crescer, a nos tornar aquilo que fomos
chamados a ser, a realizar plenamente a missão que somos: pronunciar, com a
nossa vida, uma palavra de fé e de esperança para a humanidade.
ORAÇÃO: “Meu Deus,
sois minha fortaleza e meu abrigo, em Ti confio! Tu és o Deus todo-Poderoso: feliz
o homem que em Ti confia! Tu és o Deus da minha salvação; sinto-me inteiramente
confiante; nada temo, porque o Senhor é minha força e minha salvação. Em Ti
confiam os que conhecem teu nome, pois não abandonas os que te procuram,
Senhor! No dia em que estiver com medo, confiarei em Ti, pois Tu és a minha
esperança; ó Senhor, desde a juventude sois a minha confiança, desde o seio
materno eu me apoiei em Ti. O teu amor envolve todo aquele que confia em Ti!”
(fragmentos de diversos salmos bíblicos).
Pe. Paulo Cezar
Mazzi
NADA TEMEREI – Aline Brasil e
Thiago Brado
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