Missa do 5º dom.
comum. Palavra de Deus: Isaías 58,7-10; 1Coríntios 2,1-5; Mateus 5,13-16.
Existe no mundo atual uma forte
tendência ao fechamento: famílias fechadas em suas casas, por medo da
violência; pessoas fechadas dentro de si mesmas, por medo de serem machucadas pelos
outros, ou mesmo por terem se decepcionado com os outros; cristãos fechados em
suas igrejas, por medo de se “contaminarem” com o mundo; governos e países
fechados em si mesmos, para protegerem suas economias. Enfim, no âmbito global o
atual medo do contágio do coronavírus tem levado muitos a evitarem o contato
com outras pessoas.
Jesus, ao usar as imagens do sal e
da luz, bem como da sua respectiva importância para a nossa vida de cada dia, nos
convida a sair do fechamento em que nos encontramos. O sal existe para ser
colocado na comida e realçar o sabor dos alimentos, assim como a luz existe
para ser colocada no teto e iluminar a todos os que se encontram naquele
ambiente. Manter o sal fechado dentro de um recipiente ou manter uma luz acesa
debaixo de um móvel, além de negar o sentido da própria existência deles, faz
com que a comida fique sem sabor e que o ambiente permaneça totalmente no
escuro. Em outras palavras, quando nos fechamos em nós mesmos, entramos num
processo de perda de sentido da nossa própria existência, além de empobrecermos
seriamente a vida das pessoas que se encontram à nossa volta.
“Vocês
são o sal da terra” (Mt 5,13). Além de realçar o sabor dos alimentos, o sal,
sobretudo na época de Jesus, era muito usado para conservar os alimentos, isto
é, para preservar a carne do apodrecimento. Hoje, a principal “carne” que está
apodrecendo à nossa volta é o ser humano. Moradores de rua, usuários de droga,
desempregados, famílias desestruturadas, crianças e jovens envolvidos no
tráfico de drogas, entre outros, são exemplos de seres humanos que estão apodrecendo
porque o sal de muitos de nós, cristãos, não tem sido colocado ali, ou seja,
porque nós nos mantemos distantes do drama da vida dessas pessoas.
Jesus
pergunta: “se o sal se tornar insosso, com que salgaremos?” (Mt 5,13). Quantas
pessoas perderam seu sal? Quantas pessoas abriram mão de valores como
integridade, honestidade, decência, fidelidade, e não se importam com o fato de
se tornarem corruptas, pois o enriquecimento rápido e fácil anestesiou a
consciência delas? Quantos políticos, juízes, empresários e líderes religiosos
se tornaram “pessoas sem sal”, sem escrúpulo, sem decência, sem integridade? “Ele
não servirá para mais nada, senão para ser jogado fora e ser pisado pelos
homens” (Mt 5,14). Segundo Jesus, essas pessoas serão excluídas do Reino de
Deus (“ser jogado fora”) e serão destruídas pelo próprio sistema injusto que elas
alimentam com seu comportamento corrupto (”ser pisado pelos homens”).
“Vós
sois a luz do mundo. Não pode ficar escondida uma cidade construída sobre um
monte” (Mt 5,14). Sempre que escolhemos viver segundo o Evangelho, nos
configurando a Jesus Cristo, Luz do mundo, nós nos tornamos luz. Em muitos
ambientes há uma ausência de luz, isto é, ausência de bondade e de humanidade,
ausência de solidariedade e de respeito para com o outro, ausência de fé e de esperança.
Por que essas ausências? Porque grande parte dos cristãos decidiram manter-se
no anonimato, para evitar críticas, perseguições ou humilhações, não
testemunhando, sobretudo com seu comportamento, os valores do Evangelho. Embora
seja verdade o fato que ninguém atira pedras numa árvore que não tem fruto,
Jesus nos faz este desafio: “brilhe a luz de vocês diante dos homens, para que
vejam as suas boas obras e louvem o Pai de vocês que está nos céus” (Mt 5,16). Apesar
de o nosso testemunho cristão poder despertar alguma crítica ou rejeição, devemos
mostrar para as pessoas que uma outra forma de viver e de tratar os outros é
possível.
Ainda
a respeito da luz, não podemos nos esquecer daquilo que o Senhor nos diz, através
do profeta Isaías. Nós só somos luz quando nos deixamos afetar pelo sofrimento
e pela necessidade do nosso próximo. Nós só somos luz quando modificamos nossas
atitudes agressivas e intolerantes em atitudes humanizadoras e solidárias para
com os necessitados. Somente quando nos
comportamos assim é que Deus afirma: “nascerá nas trevas a tua luz e tua vida
obscura será como o meio-dia” (Is 58,10).
O lugar do sal é em meio à comida; o
lugar da luz é no teto do ambiente; o lugar da Igreja e dos cristãos é no
mundo, na comunhão com os dramas que afetam a vida das pessoas, especialmente
dos que mais sofrem. Quando nós, enquanto Igreja, nos mantemos separados do
mundo e distantes da realidade das pessoas, não estamos servindo para nada;
estamos, na verdade, traindo a nossa missão de discípulos de Jesus. E quando
fazemos isso, somos merecedores desse tipo de crítica: “Os cristãos fizeram
todo o possível para esterilizar o Evangelho; dir-se-ia que o submergiram num
líquido neutralizante. Tudo o que impressiona, supera ou inverte é amortecido.
Assim, uma vez convertida em algo inofensivo, esta religião nivelada, prudente
e razoável, o ser humano não pode senão vomitá-la” (Paul Eudokimov, O amor louco de Deus).
Oração: Senhor
Jesus, sou humano(a), sou carne, sou passível de ser corrompido(a). Necessito
do Teu sal, da Tua integridade e da Tua santidade de Filho de Deus. Preserva
minha consciência do apodrecimento moral e espiritual. Quero sair de mim
mesmo(a) e derramar o meu sal sobre toda carne, sobre toda pessoa que precisa
ser ajudada, resgatada, defendida. Que a minha breve passagem por este mundo
faça com que ele se torne melhor, mais humano e mais justo. Amém!
Pe. Paulo Cezar
Mazzi
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