Missa do 7. dom.
comum. Palavra de Deus: Levítico 19,1-2.17-18; 1Coríntios 3,16-23, Mateus
5,38-48.
Há
dias atrás, o medo do coronavírus deixou o mercado em pânico e o mundo em
alerta, mas esse medo está passando. No entanto, o mesmo mundo que teme um
vírus que pode levar inúmeras pessoas à morte se habituou tranquilamente a
viver contaminado com um outro vírus, que faz com que as pessoas se matem umas
às outras: o vírus do ódio.
Deus
nos disse: “Não tenhas no coração ódio contra teu irmão” (Ex 19,17). No
entanto, odiar tornou-se algo normal, habitual. O ódio está presente nas famílias
(dentro da própria casa ou entre os parentes); nos ambientes de trabalho (algo cada
vez mais frequente); nas escolas (entre alunos, e também entre alunos e
professores). O ódio está presente nas igrejas (alguns do clero entre si, alguns
do clero com o bispo, entre os leigos, entre determinado padre e os leigos,
entre cristãos de igrejas diferentes etc.). O ódio está presente na vida das
crianças e adolescentes (jogos violentos); está visível no trânsito. Em nosso
país, o ódio tornou-se a cor “natural” da política: mensagens, falas, discursos
e vídeos são ditos ou editados para se alimentar o ódio mortal entre direita e
esquerda. Enfim, as redes sociais são a maior testemunha do quanto estamos
propensos ao ódio, o quanto estamos contaminados por esse vírus.
Na Bíblia, a ira é um sentimento muito mencionado, um
“sentimento
intenso, violento. Sua manifestação extrema é o ódio, o qual procura destruir o
outro, senão fisicamente, o faz afetivamente ou psicologicamente” (Ana Bissi).
Por ser um sentimento que, como qualquer outro, não é escolhido por nós, mas
que se manifesta em nós devido a uma determinada situação, Deus nos orienta na
sua Palavra: “Irai-vos, mas não pequeis: não se ponha o sol sobre a vossa ira,
nem deis lugar ao diabo” (Ef 4,26-27). “Irai-vos” – Deus jamais nos mandaria
ficar irados, cheios de raiva ou de ódio. “Irai-vos” significa que Deus
compreende perfeitamente a nossa natureza humana e sabe que não escolhemos
sentir ira. No entanto, Ele nos aconselha: ‘Quando o sentimento da ira explodir
dentro de vocês, não pequem, não deem uma resposta errada à ira que estão
sentindo, de modo que ela leve vocês a cometeram algo ruim ou injusto contra o
seu próximo’.
“Não
se ponha o sol sobre a vossa ira, nem deis lugar ao diabo” (Ef 4,27). Deus
também nos aconselha a não deixar a ira fervendo dentro de nós por dias e dias.
Antes que o sol se ponha, antes que o dia termine, temos que reconhecer o que
estamos sentindo e decidir qual a melhor forma de lidar com esse sentimento.
Quando não fazemos isso, acabamos dando espaço para o mal (diabo) morar em nós
e influenciar fortemente as nossas atitudes, que não mais serão guiadas pelo
Evangelho, mas pela raiva cega, exagerada e injusta da nossa ira.
Jesus
teve inúmeros inimigos em sua vida: fariseus, mestres da Lei, sumos sacerdotes,
políticos (Império Romano) etc. Como qualquer outro ser humano, ele sentiu a
agressão do ódio contra si. Além disso, Jesus também irou-se: às vezes, com os
discípulos; às vezes, com o povo; mas, sobretudo, com alguns líderes religiosos
da sua época. Assim como qualquer um de nós, Jesus sentiu raiva, ira, mas ele
nunca permitiu que esse sentimento morasse definitivamente dentro dele; muito
menos permitiu que a ira determinasse suas atitudes para com os outros. O que
Jesus fazia era colocar sua ira diante do Pai, na oração, e permitir que o amor
do Pai o preenchesse de tal forma que sua ira acabava por diluir-se, como a
pedra de gelo se dilui rapidamente quando exposta ao calor do fogo ou do sol.
Portanto,
Jesus tem toda a autoridade para nos dizer como ele quer que seus discípulos
sejam: “Amai os vossos inimigos e rezai por aqueles que vos perseguem! Assim,
vos tornareis filhos do vosso Pai que está nos céus, porque ele faz nascer o
sol sobre maus e bons, e faz cair a chuva sobre justos e injustos” (Mt
5,44-45). “Deus derrama o sol e a chuva sobre todos porque reconhece a todos
como filhos, na esperança de alguém que o reconheça como Pai e aceite os outros
como irmãos. Deus não tem inimigos; tem filhos, os quais estão na minha vida
para que eu os ame como irmãos” (Pe. Pagola).
Embora todos nós naturalmente nos consideramos “filhos
de Deus”, cabe a pergunta: de quem realmente somos filhos – de Deus ou de Caim? Deus
Pai não é violento. Ele não busca destruir ninguém. Quem se propõe a viver como
filho de Deus inevitavelmente sente ódio às vezes, mas não alimenta ódio contra
ninguém e não permite que seu ódio o leve a destruir a outra pessoa. Quando Jesus
fala do amor ao inimigo, não está pensando em um sentimento de afeto e carinho
por ele, mas numa relação radicalmente humana de interesse positivo por sua
pessoa. Amar o inimigo não significa tolerar as injustiças e retirar-se
comodamente na luta contra o mal. O que Jesus viu com clareza é que não se luta
contra o mal quando se destrói as pessoas. Deve-se combater o mal, mas sem
buscar a destruição do adversário.
Oração:
Deus Pai, apesar de ser Teu(ua) filho(a), reconheço que Caim às vezes mora
dentro de mim. Apesar de ser barro, sinto que uma parte em mim se endureceu
como ferro. Algumas situações provocam ira em mim, uma raiva intensa,
levando-me até mesmo a odiar pessoas! Derrama Teu amor em meu coração! Derrete,
com o fogo do Teu Espírito, tudo aquilo que em mim está endurecido pelo ódio.
Apesar
de viver num mundo cheio de intolerância e agressão, eu não quero reproduzir
feridas nos outros. Quando a raiva gritar dentro de mim, que eu ouça a voz do
Teu amor e oriente minhas atitudes por ela, decidindo não agir segundo a
agressão que eu recebo, mas orando por aqueles que me agridem. Concede-me um
coração verdadeiramente de filho(a), que se antecipe em fazer o bem aos outros,
independente de como sou tratado(a) por eles.
Derruba
todo muro de ódio que separa as pessoas nas famílias, nas escolas, nas
empresas, na política e nas igrejas. Movidos pelo Espírito do Teu amor,
queremos diariamente lutar contra o mal sem destruir as pessoas; combater o mal,
sem buscar a destruição dos nossos adversários. Em nome de Jesus. Amém!
Pe.
Paulo Cezar Mazzi
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