Missa
do 3º. dom. comum. Palavra de Deus: Isaías 8,23b–9,3; 1Coríntios 1,10-13.17;
Mateus 4,12-23.
Há
uma passagem necessária, um movimento necessário em nossa vida. O Evangelho nos
indica isso. A primeira passagem que vemos nele é a de João Batista para Jesus:
no momento em que João é preso e sua voz é, de certa forma, silenciada, Jesus
entende que é o seu momento de falar, de pronunciar sua palavra de vida e de
esperança para a humanidade. Mas a passagem de João Batista para Jesus aponta para
um movimento: “Jesus escolhe iniciar sua atividade longe da Judeia, de
Jerusalém, do templo, das autoridades religiosas. Ele elegeu o seu ‘lugar’ entre
os mais pobres e excluídos, vítimas daqueles que se faziam donos dos lugares”
(Pe. Adroaldo).
Este
é o movimento que destrava a vida; mais ainda, que resgata o sentido da nossa
vida: sair do centro e ir para as periferias. Constantemente, o mundo nos
incentiva a olhar para o centro, a viver a partir do centro. O centro é o
poder, o ter, o consumir; o centro é a importância, a fama, o aparentar; o
centro é a vida agitada, o barulho, o automatismo, a indiferença, o
individualismo... Todos correm para o centro, todos querem encontrar o seu
lugar no centro, e não se dão conta de que o centro tem o poder de nos adoecer,
de nos despersonalizar, de nos manter escravos de coisas que nos fazem mal. O
centro é um horizonte estreito que nos impede de ver melhor quem nós somos e
qual é a nossa missão, qual é o sentido da nossa vida.
Jesus
nos desafia a romper com a mesmice, com a rotina, com o “sempre foi assim”. Ele
nos convida a tomar sua mão e a nos deixar conduzir para lugares novos, para
situações novas, onde iremos reencontrar o sentido da nossa vida, onde iremos
ampliar o horizonte da nossa existência e compreender a importância da nossa
missão. “Jesus descentralizou o mundo a partir da periferia. Em Jesus, Deus não
só se fez homem, mas também se fez ‘margem’. Todos tinham os olhos voltados
para o centro. No entanto, Jesus começou a falar a partir da margem geográfica,
cultural, religiosa e econômica” (Pe. Adroaldo). Também o Papa Francisco nos
faz o mesmo convite: “O discípulo-missionário é um des-centrado: o centro é
Jesus Cristo que convoca e envia. O discípulo é enviado para as periferias
existenciais. A posição do discípulo-missionário não é a de centro, mas de
periferias: vive em tensão para as periferias”.
Quem
está nas periferias? O que de nós tem ficado na margem, ignorado, descuidado,
por termos dado exclusividade ao centro? Muitos de nós estamos esperando e
desejando mudanças em nossa saúde física ou psíquica, em nossos
relacionamentos, em nossa vida profissional, ou ainda em nossa experiência com
Deus, mas essas mudanças só começarão a acontecer quando tivermos a coragem de
nos desprender do centro e nos aproximar das margens, daquilo que nós mesmos
jogamos para a margem porque consideramos sem importância, não essencial, sem
sentido, quando justamente ali está a resposta que procuramos.
Ampliar
a compreensão de nós mesmos, da vida e da nossa missão depende desse movimento:
sair do centro e ir para as margens, o que Jesus resume nessas palavras: “Convertam-se,
porque o Reino dos Céus está próximo” (Mt 4,17). Só é possível experimentar Deus
quando nos convertemos, quando mudamos a direção da nossa vida, das nossas
atitudes. O apelo bíblico à conversão é sempre um apelo à nossa liberdade e à
nossa responsabilidade. Converter-se significa compreender que nada muda se eu
não decidir mudar. Portanto, a mudança mais difícil e mais necessária é a
interna, não a externa.
Para
nos mostrar o quanto as mudanças são possíveis e necessárias, Jesus, andando “à
beira do mar da Galileia” (Mt 4,18) – portanto, visitando as margens, as
periferias existenciais –, encontra dois irmãos pescadores e os desafia: “Sigam-me,
e eu farei de vocês pescadores de homens” (Mt 4,19). Aqui se dá um novo
movimento, uma nova mudança: “Eles, imediatamente deixaram as redes e o
seguiram” (Mt 4,20). A primeira palavra de Jesus a cada um de nós, discípulos
seus, é esta: “Siga-me!”. Somos chamados a segui-Lo ouvindo sua palavra e observando
suas atitudes, de modo a nos tornarmos semelhantes a Ele. “Siga-me!” também
significa: “torne-se uma luz, como eu sou Luz, e faça com que sua luz chegue às
periferias existenciais, pois é preciso que a minha Luz resplandeça sobre
aqueles que ainda hoje se encontram nas sombras da morte” (cf. Is 9,1; Mt
4,16).
Na medida em que nos dispomos a seguir
Jesus, o horizonte da nossa vida vai se alargando e se aprofundando: a missão,
o sentido da nossa vida, não está em pescar peixes, mas em pescar homens, em
resgatar o ser humano que está se afogando no mar da destruição e da morte. O
sentido da nossa vida não está em viver em função de nós mesmos, mas em fazer
da nossa vida um serviço, uma causa em prol de algo ou de alguém que precisa
ser defendido, resgatado ou salvo. As margens reclamam a nossa presença. As
periferias existenciais clamam por nossa ajuda. Os que estão perdidos nas sombras
da morte suplicam pela Luz que nos habita. Que resposta daremos ao chamado de
Jesus?
Nenhum comentário:
Postar um comentário