quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

SAIA DO CENTRO; CAMINHE NA DIREÇÃO DAS PERIFERIAS EXISTENCIAIS!

Missa do 3º. dom. comum. Palavra de Deus: Isaías 8,23b–9,3; 1Coríntios 1,10-13.17; Mateus 4,12-23.

Há uma passagem necessária, um movimento necessário em nossa vida. O Evangelho nos indica isso. A primeira passagem que vemos nele é a de João Batista para Jesus: no momento em que João é preso e sua voz é, de certa forma, silenciada, Jesus entende que é o seu momento de falar, de pronunciar sua palavra de vida e de esperança para a humanidade. Mas a passagem de João Batista para Jesus aponta para um movimento: “Jesus escolhe iniciar sua atividade longe da Judeia, de Jerusalém, do templo, das autoridades religiosas. Ele elegeu o seu ‘lugar’ entre os mais pobres e excluídos, vítimas daqueles que se faziam donos dos lugares” (Pe. Adroaldo).  
Este é o movimento que destrava a vida; mais ainda, que resgata o sentido da nossa vida: sair do centro e ir para as periferias. Constantemente, o mundo nos incentiva a olhar para o centro, a viver a partir do centro. O centro é o poder, o ter, o consumir; o centro é a importância, a fama, o aparentar; o centro é a vida agitada, o barulho, o automatismo, a indiferença, o individualismo... Todos correm para o centro, todos querem encontrar o seu lugar no centro, e não se dão conta de que o centro tem o poder de nos adoecer, de nos despersonalizar, de nos manter escravos de coisas que nos fazem mal. O centro é um horizonte estreito que nos impede de ver melhor quem nós somos e qual é a nossa missão, qual é o sentido da nossa vida.
Jesus nos desafia a romper com a mesmice, com a rotina, com o “sempre foi assim”. Ele nos convida a tomar sua mão e a nos deixar conduzir para lugares novos, para situações novas, onde iremos reencontrar o sentido da nossa vida, onde iremos ampliar o horizonte da nossa existência e compreender a importância da nossa missão. “Jesus descentralizou o mundo a partir da periferia. Em Jesus, Deus não só se fez homem, mas também se fez ‘margem’. Todos tinham os olhos voltados para o centro. No entanto, Jesus começou a falar a partir da margem geográfica, cultural, religiosa e econômica” (Pe. Adroaldo). Também o Papa Francisco nos faz o mesmo convite: “O discípulo-missionário é um des-centrado: o centro é Jesus Cristo que convoca e envia. O discípulo é enviado para as periferias existenciais. A posição do discípulo-missionário não é a de centro, mas de periferias: vive em tensão para as periferias”.
Quem está nas periferias? O que de nós tem ficado na margem, ignorado, descuidado, por termos dado exclusividade ao centro? Muitos de nós estamos esperando e desejando mudanças em nossa saúde física ou psíquica, em nossos relacionamentos, em nossa vida profissional, ou ainda em nossa experiência com Deus, mas essas mudanças só começarão a acontecer quando tivermos a coragem de nos desprender do centro e nos aproximar das margens, daquilo que nós mesmos jogamos para a margem porque consideramos sem importância, não essencial, sem sentido, quando justamente ali está a resposta que procuramos.   
Ampliar a compreensão de nós mesmos, da vida e da nossa missão depende desse movimento: sair do centro e ir para as margens, o que Jesus resume nessas palavras: “Convertam-se, porque o Reino dos Céus está próximo” (Mt 4,17). Só é possível experimentar Deus quando nos convertemos, quando mudamos a direção da nossa vida, das nossas atitudes. O apelo bíblico à conversão é sempre um apelo à nossa liberdade e à nossa responsabilidade. Converter-se significa compreender que nada muda se eu não decidir mudar. Portanto, a mudança mais difícil e mais necessária é a interna, não a externa.
Para nos mostrar o quanto as mudanças são possíveis e necessárias, Jesus, andando “à beira do mar da Galileia” (Mt 4,18) – portanto, visitando as margens, as periferias existenciais –, encontra dois irmãos pescadores e os desafia: “Sigam-me, e eu farei de vocês pescadores de homens” (Mt 4,19). Aqui se dá um novo movimento, uma nova mudança: “Eles, imediatamente deixaram as redes e o seguiram” (Mt 4,20). A primeira palavra de Jesus a cada um de nós, discípulos seus, é esta: “Siga-me!”. Somos chamados a segui-Lo ouvindo sua palavra e observando suas atitudes, de modo a nos tornarmos semelhantes a Ele. “Siga-me!” também significa: “torne-se uma luz, como eu sou Luz, e faça com que sua luz chegue às periferias existenciais, pois é preciso que a minha Luz resplandeça sobre aqueles que ainda hoje se encontram nas sombras da morte” (cf. Is 9,1; Mt 4,16).   
            Na medida em que nos dispomos a seguir Jesus, o horizonte da nossa vida vai se alargando e se aprofundando: a missão, o sentido da nossa vida, não está em pescar peixes, mas em pescar homens, em resgatar o ser humano que está se afogando no mar da destruição e da morte. O sentido da nossa vida não está em viver em função de nós mesmos, mas em fazer da nossa vida um serviço, uma causa em prol de algo ou de alguém que precisa ser defendido, resgatado ou salvo. As margens reclamam a nossa presença. As periferias existenciais clamam por nossa ajuda. Os que estão perdidos nas sombras da morte suplicam pela Luz que nos habita. Que resposta daremos ao chamado de Jesus?

Pe. Paulo Cezar Mazzi  

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