Missa
do 2º dom. comum. Palavra de Deus: Isaías 49,3.5-6; 1Coríntios 1,1-3; João
1,29-34.
Existem duas formas de entendermos a
nossa existência nesse mundo. A primeira, como sendo fruto do puro acaso:
nascemos acidentalmente, estamos onde estamos por mera coincidência e nossa
existência não tem nada a dizer à humanidade. A segunda maneira é entender que
nascemos por uma escolha divina: “o Senhor – ele que me preparou desde o
nascimento para ser seu Servo” (Is 49,5). Nossa existência não é resultado do
acaso, mas da vontade divina: Deus nos quis. Além disso, não existimos em função
de nós mesmos; existimos “para”. Existe uma finalidade em nosso existir –
“que eu recupere Jacó para ele e faça Israel unir-se a ele” (Is 49,5). Portanto,
não estamos onde estamos por acaso. A época em que nascemos, o lugar onde nos
encontramos e a pessoa que somos tem algo a dizer ao mundo do nosso tempo. Como
afirma com frequência o Papa Francisco, cada um de nós, com sua existência
única, é uma missão, ou seja, nossa vida tem uma palavra única de Deus a ser
comunicada à humanidade.
É preciso valorizar a nossa presença
no mundo e na Igreja. Depois de nós, eles terão se tornado melhores? Nossa
presença e nossas atitudes terão ajudado o mundo e a Igreja a serem espaços de
cura e de salvação, espaços onde as pessoas puderam encontrar-se com Deus e com
sua salvação? Nossa existência terá feito a diferença ou apenas reproduzido estruturas
injustas e doentias, tanto no mundo quanto na Igreja? É verdade que nenhuma
pessoa tem o poder, sozinha, de mudar essas estruturas, mas cada um de nós pode
tornar diferente o pequeno mundo à sua volta.
No momento em que o profeta Isaías
compreendia a sua existência apenas em função da salvação do seu povo (Israel),
Deus alargou o horizonte de compreensão da sua vocação: “Não basta seres meu
Servo para restaurar as tribos de Jacó e reconduzir os remanescentes de Israel:
eu te farei luz das nações, para que minha salvação chegue até aos confins da
terra” (Is 49,6). Nosso maior desafio é nos manter abertos ao que Deus quer de
nós. Embora tenhamos a constante tentação em nos instalar e em nos cercar de
seguranças, Deus muitas vezes permite que uma forte tempestade nos desenraíze e
nos transporte para lugares e para junto de pessoas onde nunca imaginaríamos
estar: é ali que somos chamados a germinar, florescer, frutificar, continuando
a responder o nosso “Eis-me aqui” ao Deus que nos quer ali como sinal vivo do
seu amor e do seu desejo em salvar todas as pessoas.
João Batista havia se tornado um
forte líder espiritual em seu tempo. No entanto, quando Jesus se tornou adulto,
foi batizado e iniciou a sua missão, João soube conduzir as pessoas para Jesus,
afirmando: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo 1,29). Todo
líder espiritual que conduz as pessoas para si mesmo, e não para Jesus, erra
gravemente. Assim como João Batista, nós não somos o Caminho, mas a seta que
indica o Caminho; nós não somos a Luz, mas a lâmpada chamada a se tornar
portadora da Luz; nós não somos a Palavra, mas a voz chamada a fazer com que a
Palavra chegue aos corações, especialmente daquelas pessoas que aguardam por
uma palavra de consolo da parte de Deus.
Mas, que sentido hoje tem para as
pessoas do nosso tempo anunciar Jesus Cristo como “Cordeiro de Deus que tira o
pecado do mundo” (Jo 1,29)? Aqui precisamos recuperar o sentido bíblico do “cordeiro”.
No momento principal da história de Israel – a noite da sua libertação do Egito
– cordeiros foram sacrificados e o sangue deles foi passado nas portas das
casas dos hebreus, para livrá-los da praga exterminadora, conforme lemos em Êxodo
12,1-14. Aqueles cordeiros eram uma prefiguração de Jesus, o Cordeiro de Deus
que foi morto na cruz no exato momento em que os cordeiros eram preparados para
se celebrar a Páscoa dos judeus.
Mas
Jesus não é apenas um “Cordeiro”; ele é o Cordeiro “de Deus”. Numa época em que
o povo de Israel lamentava: “não há mais nem chefe, nem profeta, nem príncipe,
nem holocausto, nem sacrifício, nem oblação, nem incenso, nem lugar onde
oferecermos as primícias diante de ti para encontrarmos misericórdia” (Dn
3,37-39), Deus ofereceu seu Filho como Cordeiro para resgatar a humanidade do
abismo do seu pecado. Assim como providenciou um cordeiro para o lugar de
Isaac, o filho único de Abraão (cf. Gn 22,13), Deus permitiu a morte de seu
Filho na cruz para nos livrar da morte eterna a que o pecado nos condena.
Falar
de Jesus como “Cordeiro de Deus” significa entender que nós precisamos ser
salvos. Todo ser humano precisa ser salvo; salvo não só dos outros, não só das
estruturas sociais injustas, não só do pecado social, mas também salvo de si mesmo,
salvo do seu próprio pecado. Todo pecado gera morte, morte pessoal e social. E
aqui está a grande diferença entre o sangue dos cordeiros, sacrificados sem
saberem o por quê, e o sangue de Jesus: Ele ofereceu-se livre e conscientemente
para tirar os pecados do mundo (leia Hebreus 9). Portanto, o sangue de Jesus é
o sangue consciente do Filho de Deus que se oferece para resgatar a humanidade
da condenação à morte por causa do pecado, pois “sem derramamento de sangue não
há remissão” (Hb 9,22); sem alguém que me salve, eu não posso ser salvo; sem a
mão do Filho estendida para mim, que me encontro no fundo do abismo do meu
pecado, eu não posso, sozinho, subir desse abismo.
Uma última palavra. Jesus não tirou o
pecado do mundo anulando em nós a liberdade ou possibilidade de pecar. Mesmo
depois da morte redentora de Jesus na cruz, a humanidade continua livre para
seguir o caminho que bem entender. A diferença é que nós agora podemos escolher
romper com o círculo vicioso do pecado; nós agora podemos guiar nossa
consciência pela voz do Filho e não mais pela voz do maligno. Como o próprio
Jesus afirmou: “quem comete o pecado, é escravo (do maligno). Ora, o escravo
não permanece sempre na casa, mas o filho aí permanece para sempre. Se, pois, o
Filho vos libertar, sereis, realmente, livres” (Jo 8,34-36).
PROFISSÃO DE FÉ NO CORDEIRO DE DEUS
Creio em Deus Pai, que desde o
ventre materno me chamou para a missão de resgatar e salvar pessoas para Ele.
Abraço conscientemente a minha missão de “Servo(a) do Senhor”, na esperança de
que minha presença no mundo e na Igreja faça com que ambos se tornem lugares de
cura e de salvação, espaços onde Deus seja experimentado como Redentor de todo
ser humano.
Creio em Jesus Cristo, “Cordeiro de
Deus que tira o pecado do mundo”. Creio no sangue redentor de nosso Senhor, o
sangue que o Filho derramou conscientemente para livrar todo ser humano da
condenação à morte por causa do seu pecado. Agarro-me à mão de Jesus, estendida
na minha direção para retirar-me das profundezas do abismo do meu pecado.
Creio
no Espírito Santo, força do Pai e do Filho que vem socorrer a minha fraqueza na
luta contra o pecado. Entendo que “sem derramamento de sangue não há remissão”
(Hb 9,22); sem alguém que me salve, eu não posso sê-lo. Escolho seguir
Jesus Cristo, na força do Espírito Santo, encontrando n’Ele a verdadeira
libertação e conduzindo para Ele todos aqueles que ainda precisam ser libertos
e salvos. Amém!
Pe.
Paulo Cezar Mazzi
K possamos ver as setas k nos levem a Jesus e tornarmos espelhos destas setas pra refletir este caminho aos irmãos
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