sexta-feira, 10 de janeiro de 2020

DO BATISMO RECEBIDO ONTEM PARA A MISSÃO ABRAÇADA HOJE


Missa do Batismo do Senhor. Palavra de Deus: Isaías 42,1-4.6-7; Atos dos Apóstolos 10,34-38; Mateus 3,13-17.

            Água. Sem ela, não existe vida; sem ela, nada do que vive sobrevive. Embora muitas pessoas dentre nós relativizem o problema do desmatamento na Amazônia, intensificado agressivamente a partir do início do novo governo, o qual, por sua vez, cumpre uma promessa de campanha de flexibilizar as leis de fiscalização ambiental, o desmatamento na Amazônia interfere diretamente na regulação das chuvas em nossa região. Sem a Amazônia, nossa região seria um imenso e triste deserto.
Água é vida. Sem ela, não apenas não existe vida, como também não existe cura. Enquanto o organismo de muitas pessoas está intoxicado com refrigerante ou bebida alcoólica, o que abre espaço para o surgimento de diversas doenças, a água nos desintoxica; ela devolve saúde ao nosso organismo, colaborando para: 1) regular a temperatura corporal; 2) combater acne, estrias e celulite; 3) melhorar o funcionamento dos rins; 4) prevenir o aparecimento de pedras nos rins; 5) facilitar a digestão; 6) diminuir o inchaço; 7) melhorar a circulação sanguínea; 8) ajudar a emagrecer.
Mas a cena do Batismo de Jesus nos fala de outra água; uma água “ungida” pelo Espírito de Deus; uma água capaz não apenas de lavar o corpo, mas de purificar o coração; uma água capaz de lavar a sujeira da nossa alma, de penetrar nas raízes mais profundas no chão árido da nossa vida e nos devolver fecundidade, isto é, despertar em nós a força adormecida da nossa fé, da nossa alegria e da nossa esperança, ajudando-nos a compreender que o sentido da vida não está no cimento da artificialidade de um mundo que exige de nós o cuidado doentio com a aparência, mas no chão descoberto da nossa essência, onde o Espírito Santo escolheu habitar, onde Deus cavou no mais profundo de nós e fez brotar ali a água viva da Sua presença, da Sua força, do Seu amor.
            Para a grande maioria de nós, o batismo se deu num momento da nossa vida onde não tínhamos ciência do que estava acontecendo. Não foi uma escolha nossa receber o batismo, mas dos nossos pais (ou avós?) e padrinhos: eles acreditaram que, apesar dos seus cuidados humanos para conosco, nós precisávamos ser confiados aos cuidados de Deus. Assim, eles quiseram que, desde pequenos, fôssemos mergulhados na água viva do Espírito de Deus, para que, desde os primeiros meses da nossa vida terrena, uma voz ressoasse em nossa consciência e nos acompanhasse por todos os dias, a mesma voz que Se pronunciou no batismo de Jesus: “Este é o meu Filho amado, no qual eu pus o meu agrado” (Mt 3,17).
            A maior importância do nosso batismo, contudo, não está em lembrar-se de como ele se deu, mas do não esquecer-se do quê ele nos deu: a verdade da nossa filiação divina! Somos pessoas dignas de serem amadas pelo Pai! Antes de qualquer atitude nossa, antes de qualquer escolha ou decisão que pudesse nos tornar sujos, imundos, ou até mesmo indignos de sermos amados, Deus derramou a água pura do batismo sobre a nossa cabeça, para nos tornar conscientes de que Ele escolheu nos amar incondicionalmente. Antes de escrevermos qualquer palavra ou frase no livro da nossa vida terrena, Deus escreveu: “Você é meu filho amado”, “Você é minha filha amada”. Nenhuma atitude nossa tem força suficiente para apagar do livro da nossa vida esta verdade, nem mesmo a decisão que muitos, por estarem decepcionados com a Igreja, tomaram de rejeitar o próprio batismo, afirmando publicamente: “Não em meu nome!”.  
            Apesar da importância absoluta do batismo em nossa vida, ele não é um ponto final ou um ponto de chegada, mas um ponto de partida. A água do batismo, que foi derramada em nossa cabeça, pede para continuar a escorrer pelo chão da nossa existência. Com efeito, o apóstolo Paulo afirma que “todos os que se deixam conduzir pelo Espírito de Deus são filhos de Deus” (Rm 8,14). Portanto, o que torna verdadeiro e comprovado o nosso batismo não é o seu registro em um livro da Igreja, mas a sua vivência no livro da nossa vida diária; é aquela decisão nem sempre fácil de ser tomada: “quero conduzir minha vida a partir da voz do Espírito Santo em minha consciência e não a partir da voz do meu ego”. Viver segundo o Espírito que recebemos no batismo significa viver como Jesus: ele “foi ungido por Deus com o Espírito Santo e com poder (no momento do batismo. A partir daí...). Ele andou por toda a parte, fazendo o bem...” (At 10,38).
Tomar consciência do próprio batismo significa tomar consciência da própria missão. Assumir a verdade do nosso batismo significa assumir nosso lugar na vida, na história da salvação. A voz do Espírito Santo nos convida a cada dia a assumir nossa missão, que é única e intransferível. Assim como o Servo de Deus, mencionado no texto do profeta Isaías, nossa missão consiste em “promover o julgamento” (Is 42,1), lembrando que “julgar” significa “separar”: o batizado tem consciência de que precisa aprender a separar, a distinguir a verdade da mentira, a justiça da injustiça, o que convém à sua salvação e o que não convém.
A atitude do batizado é a de não quebrar uma cana rachada nem apagar um pavio que ainda fumega; mas promover o julgamento para obter a verdade (cf. Is 42,3). Trata-se de agir com paciência e misericórdia, tanto consigo quanto com os outros, sobretudo com aqueles que “demoram” para se corrigir dos seus erros. Isso, porém, não significa não ter pulso, não ser firme e, muito menos, permitir que a pessoa continue a prejudicar os outros com suas atitudes. Toda intervenção de um batizado é sempre no sentido de fazer prevalecer a verdade, ainda que ela “machuque” ele mesmo ou aquele que está errando.
Enfim, consciente de que ele vive num mundo com valores invertidos, um mundo que diz crer em Deus, mas rejeita a verdade da sua Palavra, o batizado tem consciência de que sua missão será marcada pela ingratidão, pelo sofrimento e pela oposição de pessoas que não querem se confrontar com a verdade. Ciente disso, ele é convidado pelo Espírito de Deus a não desanimar, não se deixar abater, até que restabeleça a justiça no meio em que se encontra (cf. Is 42,4). Foi essa a consciência de Jesus em insistir em ser batizado por João: “nós devemos cumprir toda a justiça!” (Mt 3,15). Eis, portanto, a meta existencial de cada batizado: configurar-se ao Filho de Deus, esforçando-se diariamente em viver como uma pessoa justa, isto é, uma pessoa que deseja “ajustar-se” à vontade do Pai que convida cada filho Seu a viver segundo a verdade, o direito e a justiça.

ORAÇÃO: Deus Pai, em comunhão com Teu Filho Jesus humildemente me coloco diante do céu aberto do Teu coração, para suplicar pela água viva do Teu Espírito! Banha-me, Pai, nas Tuas águas! Aviva-me de novo! Derrama sobre o chão árido da minha existência a água viva do Espírito Santo.
Que a Sua graça desobstrua a minha fonte interior e faça voltar a jorrar a água viva da fé, da alegria e da esperança em minhas atitudes. Pronuncia mais uma vez a verdade do Teu amor para comigo e para com cada ser humano – “Tu és o meu Filho amado!”.
Quero assumir a verdade do meu batismo, deixando-me conduzir pelo Espírito Santo e assumindo o meu lugar na história da salvação. Quero abraçar a missão de restaurar a vida que se encontra ferida à minha volta, permanecendo firme na luta diária pelo restabelecimento da verdade e da justiça em nosso mundo. Por Jesus Cristo, Teu amado Filho, na comunhão com o Espírito Santo. Amém!  

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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