Quem precisa de um rei? Na época em que vivemos, a figura do rei é totalmente simbólica e mesmo desnecessária. Mas na época bíblica, ela tinha um grande significado: o rei era o grande pastor do povo. Sua função era tão importante que ele tinha que ser ungido pelo Espírito de Deus, para poder governar seu povo com sabedoria e justiça.
A
história do povo de Israel foi marcada por inúmeros reis, sendo que a maioria
deles foi reprovada por Deus, conforme as palavras: Tal rei “fez o que é mau
aos olhos de Deus”. Este refrão se repete na história da maioria dos reis de
Israel, conforme o segundo livro dos Reis. Somente quatro reis fizeram o que é
agradável aos olhos de Deus, sendo que o principal deles foi o rei Davi,
chamado biblicamente de “um homem segundo o coração de Deus” (cf. 1Sm 13,14).
Contudo, Davi era um rei humano, no sentido de imperfeito, limitado e falho.
Foi preciso esperar por um outro rei, um homem verdadeiramente segundo o
coração de Deus, um autêntico pastor: Jesus Cristo, o Bom Pastor, Aquele que
hoje celebramos como Rei do Universo.
Para
compreendermos o alcance dessa proclamação – Jesus Cristo, Rei do Universo –,
devemos nos lembrar de que o Pai concedeu ao seu Filho Jesus o poder sobre todo
ser humano (cf. Jo 17,2), não o poder de dominar, mas de salvar de todo ser
humano. Contudo, o reinado de Jesus não é algo que se impõe pela força, mas
algo escolhido por cada pessoa. Cada um de nós precisa fazer uma escolha: quem
eu quero que reine sobre mim? Quem ou o quê eu permito que exerça domínio sobre
a minha vida? Foi por isso que o apóstolo Paulo escreveu aos romanos: “Que o
pecado não reine mais em vosso corpo mortal” (Rm 6,12). Não teria sentido algum
nós, cristãos, proclamarmos Jesus Cristo Rei do Universo, quando nossa afetividade
e nossa sexualidade, ao invés de submeterem-se à santidade de Cristo, deixam-se
escravizar pelo pecado.
Há
um fato interessante na vida de Jesus com relação ao título de “rei”. Após a
multiplicação dos pães, a multidão quis fazer de Jesus seu rei, mas ele se
retirou para um lugar afastado (cf. Jo 6,15), recusando-se a assumir tal papel.
O que Jesus quer nos ensinar com isso? Ele quer nos dizer que não devemos
esperar nem d’Ele, nem muito menos de qualquer ser humano, a função de
solucionador de todos os nossos problemas e de provedor de todas as nossas
vontades e necessidades. Sobretudo em nosso país, existe atualmente um clima
propício para o messianismo: espera-se por um messias, deseja-se um “rei” que
tenha autoridade suficiente para colocar ordem na casa e resolver todos os problemas
que afetam o nosso país, como se nós, povo brasileiro, não tivéssemos que fazer
a nossa parte.
“Não
ponhais vossa fé nos que mandam, não há homem que possa salvar” (Sl 146,3). Nenhum
rei, nenhum messias, nem mesmo Jesus pode fazer aquilo que cabe a cada um de
nós fazer por si mesmo, por sua família, por sua cidade, por seu país. Se nós proclamamos
que Jesus é Rei do Universo, devemos nos colocar sob sua autoridade espiritual,
orientando a nossa consciência pelo seu Evangelho, no qual hoje Ele se declara
rei a partir dessas palavras: “Eu sou rei. Eu nasci e vim ao mundo para
isto: para dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade
escuta a minha voz” (Jo 18,37).
A
única riqueza que Jesus possui como Rei é a verdade. Pelo fato de Jesus pautar
a sua vida segundo a verdade, ele jamais foi escravo de alguém ou de alguma
situação. E ele veio para nos conduzir à verdade: “Vocês conhecerão a verdade,
e a verdade os libertará... Se o Filho libertá-los, vocês serão verdadeiramente
livres” (Jo 8,32.36). Enquanto não nos abrirmos à verdade, seremos pessoas
dominadas pela mentira, pelo engano, pela ignorância e por todo tipo de atitude
que nos adoece e nos destrói.
Uma pessoa que se encontrou com a
sua própria verdade torna-se livre e readquire o domínio sobre si mesma. Ela
deixa de ser um joguete nas mãos das suas próprias emoções, dos seus medos e do
seu inconsciente. Uma pessoa que escolheu viver a partir da verdade de Deus
jamais se tornará “súdita” ou escrava de qualquer rei deste mundo, de qualquer
coisa ou pessoa que queria impôr-se a ela como dominador. Mas é preciso ter
muita coragem de se abrir à verdade, pois ela dói; ela exige que encaremos
nossos demônios, nossos medos, nossos traumas. O encontro com a verdade só se
dá em meios a muitas lágrimas e muita persistência, mas é um encontro que nos
cura e nos liberta.
“Todo aquele que é da verdade escuta
a minha voz” (Jo 18,37). Enquanto muitas pessoas escolhem passar pela vida
fugindo da voz de Jesus em sua consciência e iludindo-se com a voz das suas
próprias mentiras, nós somos desafiados por Jesus a escutar a sua voz,
permitindo que ela nos questione e nos convença a abandonar todo tipo de
máscara que possamos usar para sermos reverenciados como reis por outras
pessoas. Enquanto muitas pessoas acreditam que não bastam as suas duas pernas
para pararem em pé – elas precisam de uma terceira perna; elas precisam de
alguém que constantemente exerça domínio sobre elas –, Jesus nos convida a
confiar na verdade das nossas duas pernas, na verdade de que não precisamos
viver de maneira infantil, imatura, sempre querendo que algum “rei” nos ofereça
colo, segurança, proteção contra a vida; pelo contrário, nós podemos nos tornar
conscientes da nossa verdade e olhar a vida nos olhos, abraçando o desafio diário
de nos tornarmos pessoas mais livres, mais maduras, mais autênticas, pessoas
capazes de autodomínio.
Mais uma vez é importante ter claro
que uma pessoa que conhece a verdade sobre si mesma adquire uma liberdade
interior diante de todas as circunstâncias externas. Essa é a imagem de Jesus
diante de Pilatos: sendo julgado, desprezado, ridicularizado e condenado, ele
permanece em pé, íntegro, inteiro, livre, sereno, porque está assentado sobre a
sua verdade interior. Nesta época de profunda desorientação, onde muitas
pessoas confiam sua vida a pessoas ou situações doentias e destrutivas, que
você possa conhecer a sua verdade interior, assentando sobre ela sua existência,
como uma árvore se assenta sobre raízes profundas e não tomba diante dos ventos
contrários.
Oração:
Senhor nosso Deus, estende o Teu domínio sobre todo ser humano, libertando-o do
domínio do mal, de todas as coisas, pessoas ou situações que possam adoecê-lo
ou destruí-lo. Reina sobre nós com Teu amor e Tua misericórdia. Reina com a Tua
paz sobre nossas famílias, nossas escolas e nossos locais de trabalho.
Senhor Jesus Cristo, o Pai concedeu
a Ti o poder sobre todo ser humano. Ele quis restaurar em Ti todas as coisas.
Estende a Tua mão sobre a face da terra, para curar os enfermos, procurar os
que estão perdidos, reunir os dispersos e fortalecer os que vacilam. Que a força
da Tua paz faça desaparecer do mundo a guerra e a violência.
Espírito Santo, concede-nos a
verdade capaz de nos libertar de todo tipo de mentira e de engano que nos
adoecem e nos destroem. Reina sobre nós com a Tua graça. Defende-nos do
inimigo. Liberta-nos do domínio do maligno e do nosso próprio pecado. Destina
cada um de nós ao Reino eterno de nosso Senhor Jesus Cristo. Amém.
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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