Missa do 28º.
dom. comum. Palavra de Deus: Sabedoria 7,7-11; Hebreus 4,12-13; Marcos
10,17-27.
Conta-se que, à beira da morte,
Alexandre Magno teria convocado seus generais para lhes fazer três pedidos: 1. Que seu caixão fosse transportado
pelos melhores médicos da época. 2.
Que todos os tesouros conquistados (ouro, prata, pedras preciosas etc.) fossem
espalhados ao longo do percurso, até o seu túmulo. 3. Que suas mãos fossem deixadas fora do caixão, à vista de todos,
balançando no ar. Admirado com desejos tão estranhos, um dos seus generais lhe
perguntou o que ele queria dizer com isso. Alexandre Magno respondeu: 1. “Quero que os médicos carreguem o
meu caixão para ficar claro que eles não têm poder sobre a morte”. 2. “Quero que o chão seja coberto pelos
meus tesouros para que todos entendam que os bens materiais aqui conquistados
aqui também permanecem”. 3. “Quero
que minhas mãos balancem ao vento para que se veja que de mãos vazias viemos ao
mundo e de mãos vazias partiremos dele”.
O que você costuma pedir a Deus, na
sua oração? Se você pudesse fazer-Lhe um único pedido, qual seria? Acontece
algo estranho com a nossa oração: nós costumamos pedir coisas que, aos nossos
olhos, são aparentemente importantes, essenciais, mas que, aos olhos de Deus,
não são de fato essenciais. Nós costumamos pedimos a Deus a cura de uma doença,
mas não pedimos para nos libertar de um pecado; costumamos pedir pelo sucesso
do filho na faculdade ou na vida profissional, mas não pedimos por sua vida
espiritual; costumamos pedir a Deus uma pessoa que nos ame, mas Lhe não pedimos
um coração capaz de amar os que não se sentem amados à nossa volta (homilia do 25º. dom. comum).
O livro da Sabedoria nos traz o
exemplo de uma oração séria e agradável aos olhos de Deus: “Orei, e foi-me dada
a prudência; supliquei, e veio a mim o espírito da sabedoria” (Sb 7,7). Para o
nosso mundo, nada é mais importante do que o dinheiro: quem tem dinheiro, tem
todas as portas abertas diante de si. Para a Sagrada Escritura, todo o dinheiro
que há no mundo é “um punhado de areia”, é apenas uma poça de “lama” (cf. Sb
7,9). Ter um coração sábio, um coração que saiba separar o bem real do bem aparente,
um coração que perceba claramente a diferença entre aquilo que vale para o meu interesse pessoal e aquilo que vale por si mesmo, ainda que não atenda aos meus
interesses pessoais – quem tem um coração assim, terá em suas mãos “uma riqueza
incalculável” (Sb 7,11).
O Evangelho nos fala de um homem que
procurou Jesus para lhe fazer um pedido que sua alma considerava mais
importante do que tudo na vida: “Que devo fazer para ganhar a vida eterna?” (Mc
10,17). Esse homem era muito rico (cf. Mc 10,22). Se ele estivesse doente, pediria
a Jesus a cura para a sua doença; se ele estivesse vivendo uma situação de
injustiça social, pediria a Jesus que lhe fizesse justiça. Contudo, ainda que
esse homem muito rico supostamente tivesse uma vida tranquila e poupada
de inúmeros sofrimentos pelos quais passa a maioria das pessoas em nosso mundo,
ainda assim o pedido dele nos serve de questionamento: Quem de nós hoje está
preocupado com a vida eterna? Quem de nós hoje, ao se colocar em oração, pede
por sua salvação? Quem de nós hoje, ao orar, consegue enxergar a vida para além
do aqui e agora, e se dar conta de que, muito mais importante do que apenas
sobreviver ou se dar bem neste mundo, trata-se de ter a nossa existência
destinada à salvação eterna?
Jesus conhecia aquele homem e sabia
que ele tinha um coração reto e bom; era, de fato, uma pessoa “de Deus”. No
entanto, “Jesus olhou para ele com amor, e disse: ‘Só uma coisa te falta: vai,
vende tudo o que tens e dá aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois vem e
segue-me!’” (Mc 10,21). Prestemos atenção a esta palavra de Jesus: “Uma coisa
te falta”... O que falta em mim, pra que eu seja verdadeiramente uma pessoa de
Deus? O que falta em mim, para que a verdade de Deus habite em minha alma? Quem
de nós tem a coragem de fazer essa pergunta a Deus, na sua oração: ‘Senhor, o
que ainda me falta, para que eu verdadeiramente seja salvo(a)’? Além disso,
quem de nós, ao fazer essa pergunta, tem a coragem de silenciar a sua
consciência e esperar pela resposta de Deus?
A resposta de Jesus decepcionou
profundamente aquele homem: “(...) quando ele ouviu isso, ficou abatido e foi
embora cheio de tristeza, porque era muito rico” (Mc 10,22). Uma das coisas que
eu particularmente admiro em Jesus é a sua liberdade diante de nós, a liberdade
de ser coerente com a sua consciência e de ser verdadeiro conosco, não se preocupando
se a sua Palavra vai nos decepcionar ou não. Jesus nunca se moveu na vida pelo
desejo de não desagradar ninguém ou pelo medo de que alguém ficasse
decepcionado com a verdade do Evangelho. Por isso, além de não voltar atrás no
que ele disse ao homem rico, ele aproveitou a reação daquele homem para nos
ensinar algo extremamente importante: todos nós estamos presos a algo que está
nos tirando o foco na vida eterna. Não há um ser humano na face da terra a que
não falte algo a ser revisto e corrigido, se verdadeiramente deseja ser salvo.
Eis as palavras de Jesus: “Meus
filhos, como é difícil entrar no Reino de Deus! É mais fácil um camelo passar
pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus!” (Mc
10,24-25). Muitas tentativas foram feitas – por pregadores não preocupados em
obedecerem ao Espírito da Verdade, mas preocupados em não perder fiéis em suas
igrejas – para tornar essa palavra de Jesus menos dura, menos escandalosa. Alguns
tentaram dizer que o camelo é, na verdade, uma corda; outros, que a agulha é,
na verdade, uma porta estreita. São manipulações irresponsáveis e mentirosas,
que visam tirar do texto bíblico a exigência que ele faz a todos nós: exigência
de conversão, exigência de levar a sério a verdade de que todo dinheiro tem o
poder de nos corromper, de roubar a nossa alma de Deus.
O Evangelho termina falando da
reação dos discípulos: eles “ficaram muito espantados ao ouvirem isso, e
perguntavam uns aos outros: ‘Então, quem pode ser salvo?’” (Mc 10,26), isto é,
qual ser humano pode resistir à sedução do dinheiro? “Jesus olhou para eles e
disse: ‘Para os homens isso é impossível, mas não para Deus. Para Deus tudo é
possível’” (Mc 10,27). Em outras palavras, a salvação sempre foi e sempre será
fruto da graça de Deus na alma humana, e jamais resultado do seu esforço em
“ganhar”, conquistar ou merecer tal salvação.
Concluindo, diante da verdade da
Palavra de Deus, verdade que decepcionou aquele homem rico e deixou os
discípulos de Jesus espantados (escandalizados), resta a cada um de nós tomar
uma decisão: ou rejeitar tal Palavra, ou permitir que ela penetre em nós,
revelando o que há em nossa alma e em nosso coração (cf. Hb 4,12), deixando em
nossa consciência a incômoda mas fundamental pergunta: o que ainda me falta
para que a minha existência não caminhe para a falência, mas para a salvação,
para a vida eterna?
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