quinta-feira, 5 de abril de 2018

FERIDAS QUE GERAM RESSURREIÇÃO PARA A HUMANIDADE

Missa do 2º. dom de Páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 4,32-35; 1João 5,1-6; João 20,19-31.

            No domingo de Páscoa, Jesus encontrou seus discípulos atrás de portas fechadas, tomados pelo medo. É uma imagem muito atual e que expressa o estado de espírito de muitos de nós: portas fechadas, por causa do medo. Sem dúvida, o medo da violência tem nos levado a fechar as portas das nossas casas. Mas há um outro fator que tem feito muitas pessoas fecharem a porta do seu coração para Deus: a falta de fé. Por terem enfrentado uma situação de cruz, ou pelo fato de Deus não intervir para impedir uma determinada situação de cruz na humanidade, muitas pessoas fecharam a porta para a fé: para elas, não tem sentido crer num Deus que não impede a cruz na história humana.
É possível que muitos de nós também hoje estejamos com nossas portas fechadas, trancados em nosso medo, cansaço, desgaste, abatimento ou desânimo. Mas é consolador saber que as nossas portas fechadas não são impedimento para que o Senhor ressuscitado entre e nos diga: “A paz esteja convosco!” (Jo 20,19). Jesus, ao dizer isso, mostrou suas mãos e o seu lado, feridos na cruz. Suas mãos e o seu coração lutaram e se feriram, para devolver ao ser humano a vida, a justiça e a paz que vêm de Deus. E as nossas mãos, como estão? São mãos que lutam para que o mundo se torne mais justo? Quem luta em favor da vida, da justiça e da paz tem sua vida marcada por conflitos...
“A paz esteja convosco!” (Jo 20,19). O primeiro dom da Páscoa é a paz, a paz daquele que lutou e venceu o mundo, a paz daquele que tem em seu Corpo ressuscitado as marcas da cruz, mas esse mesmo Corpo se encontra agora transfigurado, glorificado, para nos dizer que mesmo quando nos ferimos ao promover ou defender a vida, essas feridas se converterão em fonte de ressurreição para a humanidade. O segundo dom da Páscoa é o Espírito Santo: “Recebei o Espírito Santo” (Jo 20,22). O Espírito Santo é a promessa da nossa ressurreição, a força do Alto que nos envia para a missão de testemunhar Jesus Cristo ressuscitado e o seu Evangelho como força de salvação para todo aquele que crê. Jesus ressuscitado quis que o Espírito Santo se colocasse junto a cada um de nós como Defensor e Consolador.
            Quando o Senhor ressuscitado teve seu primeiro encontro com os discípulos, Tomé não estava presente, e ao ouvir falar que Jesus havia ressuscitado, duvidou: “Se eu não vir..., não acreditarei” (Jo 20,26). Quais são as condições que nós costumamos impor a Deus para crer? Na verdade, Tomé simboliza a necessidade que cada um de nós tem de fazer uma experiência pessoal com o Senhor ressuscitado. Sua fé, enfraquecida pela cruz, é o retrato da nossa fé, muitas vezes cansada, desgastada, uma fé até mesmo humilhada e ridicularizada pelo mundo atual. Jesus fez questão de encontrar Tomé oito dias depois da Páscoa, não somente por causa dele, mas por causa de cada um de nós, que também vacilamos em nossa fé. E foi pensando em cada um de nós que Jesus disse a Tomé: “Acreditaste, porque me viste? Felizes os que creram sem terem visto!” (Jo 20,29).
Feliz aquele que não reduz a sua fé àquilo que pode ver, tocar, sentir e comprovar. Feliz aquele que não duvida do testemunho daqueles que comeram e beberam com o Senhor após a sua ressurreição (cf. At 10,40-41). Feliz aquele que escolheu sustentar-se na vida não a partir das coisas que vê, mas a partir daquilo que crê. Feliz aquele que, mesmo não tendo todas as perguntas respondidas, continua a caminhar. Feliz aquele que, mesmo não tendo todos os problemas resolvidos, continua a confiar. Feliz aquele que acolhe o Evangelho como palavras que foram escritas na fé do evangelista e para suscitar a fé no coração daquele que lê, fé na pessoa de Jesus Cristo, o Filho de Deus, o único no qual temos Vida (cf. Jo 19,31).    
Segundo o apóstolo João, nossa vida cristã sempre será vivida dentro de um combate com o mundo, um combate onde ou vencemos o mundo ou somos vencidos por ele. O “mundo” é tudo aquilo que trabalha contra a vida, a justiça e a paz que Deus quer para a humanidade. Em primeiro lugar, precisamos aceitar o fato de que a nossa fé sempre será uma luta, um combate, e quem trava esse combate sairá vitorioso, mas também ferido. Em segundo lugar, nossa fé precisa ser defendida diante de um mundo que a combate e a deseja eliminar. Não nos esqueçamos de que “a vitória que vence o mundo é a nossa fé” (1Jo 5,4): sem a força da fé, “a vida facilmente se torna um arco cuja corda está arrebentada e do qual nenhuma flecha pode ser lançada” (Henri Nouwen).  
Por fim, neste segundo domingo da Páscoa, somos convidados a ter como exemplo a comunidade dos primeiros cristãos, cujas mãos aprenderam a trabalhar na direção oposta à do mundo, não acumulando, mas partilhando: “Entre eles ninguém passava necessidade” (At 4,34). Tudo o que eles possuíam “era distribuído conforme a necessidade de cada um” (At 4,35). As mãos dos primeiros cristãos estavam construindo um mundo diferente porque o coração deles era movido pela fé na ressurreição do Senhor Jesus. Que assim também as nossas mãos testemunhem a nossa fé no Senhor ressuscitado e nos ajude a viver a vida presente sob a luz da nossa futura ressurreição.

Oração: “Senhor Jesus, entra em minha vida, mesmo quando as portas estiverem fechadas pelo meu medo diante do mundo e pela minha descrença na tua ressurreição. Dá-nos a tua paz, que é a vitória sobre o mundo. Segura minhas mãos com as tuas mãos feridas, para que as minhas tenham a coragem de se abrirem para partilhar e, se preciso for, de se ferirem na luta em favor de um mundo mais justo. Infunde em mim a força do teu Espírito diante dos conflitos, para que eu possa experimentar a força da fé que me faz vencer o mundo e não ser vencido(a) por ele. Quero viver a minha vida como o Senhor viveu a sua, isto é, trabalhando pela ressurreição da humanidade. Creio em ti, Ressuscitado, mais que São Tomé, mas aumenta na minh’alma o poder da fé! Guarda a minha esperança, cresce o meu amor. Creio em ti, Ressuscitado, meu Deus e Senhor!

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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