sexta-feira, 13 de abril de 2018

COMO EU LIDO COM O MEU "É PRECISO"?

Missa do 3º. Dom. da Páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 3,13-15.17-19; 1João 2,1-5a; Lucas 24,35-48.

            Não é uma tarefa fácil devolver vida a quem desistiu de viver, assim como não é uma tarefa fácil devolver saúde a quem se habituou a viver como uma pessoa doente – pior ainda, a se identificar com sua doença. Na verdade, o nosso grande desafio, como testemunhas do Senhor ressuscitado, é ajudar as pessoas do nosso tempo – muitas delas mortas em sua fé e em sua esperança – a recuperarem o sentido da própria vida, a desejarem voltar a viver a partir da sua fé e da sua esperança.
            O Evangelho que acabamos de ouvir nos mostra que Jesus encontrou muita resistência no coração dos discípulos em relação a crer na Sua ressurreição. Eles estavam tomados pelo medo, pelas preocupações e pelas dúvidas. Assim como os discípulos, nós vivemos num mundo onde os sinais da ressurreição, os sinais da vitória da vida sobre a morte, são muito pequenos – até mesmo insignificantes – diante dos sinais da morte que parece sempre sobrepor-se à vida. Se a cada domingo nós celebramos a nossa comunhão com a Palavra e com a Eucaristia do Senhor ressuscitado, durante a semana temos que lidar com acontecimentos que parecem negar a ressurreição, como por exemplo uma doença, um problema, um conflito, sem falar das más notícias como as guerras, os acidentes, as injustiças, a corrupção etc. São fatos que, se não chegam a diluir a nossa fé na ressurreição de Jesus, parecem diluir a nossa fé e a nossa esperança em viver como homens e mulheres ressuscitados e capazes de gerar ressurreição em nossa sociedade.    
            Mas este terceiro domingo da Páscoa nos mostra a preocupação e o esforço de Jesus em acordar os discípulos e retirá-los do sono da morte, do desânimo, da apatia, do pessimismo e do derrotismo, como se Ele lhes dissesse: ‘É inconcebível um cristão sem fé e sem esperança! É inconcebível um discípulo meu entregue ao desânimo! “Vede minhas mãos e meus pés!” (Lc 24,39). Se eu venci o sofrimento e a morte, vocês podem vencê-los também! Se eu abracei a minha hora de cruz permanecendo fiel à missão que o Pai havia me confiado, vocês também podem fazer o mesmo! Se eu consegui amar até o fim, vocês também conseguirão! Não permitam que o mundo enterre a fé e a esperança de vocês!’
            Depois de ter comido um pedaço de peixe assado com os discípulos, para mostrar-lhes que ele não era um espírito ou um fantasma, mas um corpo ressuscitado, Jesus lhes disse: “(...) era preciso que se cumprisse tudo o que está escrito sobre mim na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos” (Lc 24,44). Há uma carga teológica muito grande nessa expressão de Jesus, tão cara ao evangelista Lucas: “era preciso”. Ela significa que nada na vida de Jesus foi acidental ou obra do acaso. Tudo o que aconteceu com Jesus – sobretudo o fato de ele ter sido rejeitado pelos homens e morto numa cruz – foi previsto pelo Pai. Deus Pai não só previu, mas também permitiu o sofrimento de seu Filho, revertendo tal sofrimento para a salvação da humanidade. Mas, sobretudo, o Pai reabilitou seu Filho diante da humanidade, confirmando cada palavra sua e cada gesto seu ao ressuscitá-lo dos mortos e estabelecê-lo como Juiz e Senhor de cada ser humano (cf. At 10,42).
            Na vida de todo cristão, na vida de cada um de nós, também existe um “é preciso”. “É preciso passar por muitas tribulações para entrar no Reino de Deus” (At 14,22). Por quê? Porque mesmo depois que Jesus venceu a morte e ressuscitou, o mundo continua a ser um lugar marcado pela cultura de morte, pela violência, pelo descaso para com a vida, um mundo que prioriza o mercado em detrimento do ser humano, um mundo que ataca a família, rejeita Deus, opõe-se à Igreja, combate o Evangelho e produz destruição para si mesmo. Nós, cristãos, precisamos estar conscientes de que este mesmo mundo que feriu Jesus também nos ferirá, na medida em que procurarmos viver como Jesus viveu. Portanto, cada um de nós precisa assumir aquilo que diz respeito ao seu “é preciso”.
            Para cada um de nós existe um “é preciso”: É preciso enfrentar o mal que há no mundo; é preciso combater o bom combate; é preciso aceitar o fato de que o Reino de Deus ainda está em processo; é preciso aprender a suportar as dores de parto, até que a ressurreição de Cristo possa gerar a vida nova em cada pessoa que convive conosco; é preciso enfrentar o medo, as preocupações e as dúvidas que às vezes falam mais alto em nós do que a verdade da ressurreição; é preciso testemunhar Cristo ressuscitado não só para aqueles que O desconhecem, mas também para aqueles que O rejeitam; é preciso sofrer pela causa do Evangelho, lutar e sofrer para restabelecer a verdade e a justiça na terra, sabendo em quem depositamos a nossa fé.
            Sofrendo por causa do Evangelho, o apóstolo Paulo disse: “sei em quem depositei a minha fé” (2Tm 1,12). Nós devemos saber em quem colocamos a nossa fé: no Senhor ressuscitado, que a cada domingo se coloca junto a nós, como se colocou junto aos seus discípulos, para nos falar a partir das Escrituras e partir o pão para nós. Nós colocamos a nossa fé no Senhor Jesus, que está junto do Pai como nosso Defensor: ainda que em nossa fraqueza possamos cometer algum pecado, Ele nos liberta da condenação do pecado e nos concede o Seu perdão (cf. Lc 24,47; 1Jo 2,2). Nós colocamos a nossa fé no Cristo ressuscitado que hoje abre a nossa inteligência para que possamos entender as Escrituras (cf. Lc 24,45) e termos a consciência de que o sofrimento que atinge a nossa fé e a nossa esperança não é um sofrimento inútil, mas necessário para a ressurreição nossa e de toda a humanidade.

Oração: Senhor Jesus, seguindo o teu exemplo, quero abraçar o meu “é preciso”. Se for preciso sofrer pela causa do teu Evangelho, se for preciso sofrer para ajudar as pessoas à minha volta a ressuscitarem, quero abraçar esse sofrimento com alegria, na certeza de que ele será acompanhado pela tua graça, pela consolação do Espírito Santo em mim. Abra a minha inteligência, Senhor! Concede-me o entendimento da Sagrada Escritura. Faz-me acolher com fé sincera e profunda a verdade do teu Evangelho, que é força de salvação para todo aquele que crê. Tua Palavra é espírito e vida, Palavra de vida eterna, portadora de ressurreição, Palavra que faz passar da morte para a vida aquele que a acolhe na fé. (cantando) Tu que abres as portas, Tu que abres os caminhos, Tu que abres os mares, abre também pra mim! Tu que amas os fracos, Tu que encontras os perdidos, Tu que dissipas a morte, vem dissipá-la em mim! Vem dissipá-la em mim, Senhor. Vem dissipá-la em mim. Vem dissipá-la em mim, Senhor. Vem dissipá-la em mim... Ressuscita-me, Senhor! Ressuscita-me, Senhor! Ressuscita-me, Senhor, pelo poder do Teu amor! Ressuscita-me, Senhor! Ressuscita-me, Senhor! Ressuscita-me! Ressuscita-me, Senhor! (Pe. Fabio de Melo, Abrindo mares).

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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