sexta-feira, 20 de abril de 2018

O CUIDADO: NECESSIDADE E TAREFA DE TODOS NÓS

Missa do 4º. dom. da Páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 4,8-12; 1João 3,1-2; João 10,11-18.

            O Evangelho nos coloca diante de três imagens: a imagem do verdadeiro Pastor (o “bom” Pastor), a imagem do falso pastor (o “mercenário”, aquele que trabalha tendo como foco de interesse não o bem das ovelhas, mas o dinheiro) e a imagem da ovelha. Esta última imagem tem atualmente uma conotação negativa, pois ser “ovelha” significa, aos olhos da sociedade atual, ser uma pessoa “dirigida”, “guiada”, “conduzida” por alguém, e isso parece ferir a liberdade e a autonomia que hoje o ser humano tanto reivindica para si. De fato, muitas pessoas se afastaram de qualquer tipo de igreja e de religião por não admitirem ser “domesticadas”, “conduzidas”. Porém, é cada vez maior o número de pessoas que caminham na vida perdidas, desorientadas, fazendo mal a si mesmas e aos outros, por terem se afastado da voz de Deus em sua própria consciência. São pessoas que descartaram da construção da sua vida a pedra principal, a “pedra angular” (Sl 118,22).
            O que é a pedra angular? É uma pedra que, sendo retirada da construção de uma obra, faz com que toda a obra desmorone, vindo abaixo. No sentido espiritual, descartar a pedra angular significa descuidar, tratar com descaso, abandonar aquilo que é essencial, aquilo que é o mais importante na vida. O apóstolo Pedro disse claramente que Jesus Cristo é a pedra angular (cf. At 4,11). Muitos decidiram “jogar fora” a pessoa de Jesus; outros, se não chegaram a jogá-Lo fora, decidiram não mais alimentar seu relacionamento com Ele; são pessoas que descuidaram ou mesmo abandonaram sua relação com Jesus. A consequência disso é que elas se tornaram pessoas que desabam com facilidade diante dos problemas, pessoas cuja construção de vida desmorona e arruína, por não estarem assentadas/fundamentadas sobre um alicerce sólido.         
            Ao se referir a si mesmo como “o bom Pastor” e ao falar de cada um de nós como “ovelha”, Jesus quer nos lembrar que todo ser humano depende de algo ou de alguém. Ninguém é autossuficiente. Quando escolhemos não depender de Deus, passamos a depender do mundo; quando escolhemos não viver sob o domínio do verdadeiro e bom Pastor, acabamos nos deixando dominar pelos lobos do nosso tempo; quando não aceitamos viver sob o domínio do bom Pastor, acabamos por viver sob o domínio de mercenários, de pessoas e situações que não se importam verdadeiramente com o nosso bem, mas visam unicamente lucrar conosco, ganhar dinheiro em cima da nossa fragilidade, da nossa ignorância, da nossa carência.
A ovelha simboliza toda pessoa que precisa ser cuidada. Quem cuida de você? Você se deixa cuidar por Deus? Além disso, quais pessoas estão hoje sob os seus cuidados? Você cuida delas segundo o modelo do “bom Pastor”, dando a vida e se sacrificando pelo bem dessas pessoas, ou cuida delas segundo o antimodelo do “mercenário”, negando-se a se sacrificar pelo bem dessas pessoas ou, pior, fazendo do seu aparente cuidado uma cortina de fumaça: enquanto elas pensam estar sendo cuidadas por você, você as está roubando, lucrando com a ignorância religiosa dessas pessoas, que confiam em você quase que cegamente?
Não há como negar que nós estamos vivendo num tempo de grande carência de bons pastores e de multiplicação de mercenários, de pessoas que fazem o mínimo, que oferecem ao seu rebanho apenas o básico, o arroz com feijão, porque seu coração de pastor está num outro lugar, pulsando não por suas ovelhas em geral, mas apenas por uma em particular. Também não há como negar que existe hoje um forte desencanto pelos pastores, e esse desencanto tem gerado desconfiança, medo, afastamento e dispersão no rebanho. Mas aqui precisamos recordar as palavras do salmista: “É melhor buscar refúgio no Senhor, do que pôr no ser humano a esperança; é melhor buscar refúgio no Senhor, do que contar com os poderosos deste mundo!” (Sl 118,8-9). Nossos olhos precisam se manter fixos em Jesus, o bom Pastor, e não se perder na desilusão que possamos ter com os pastores humanos.
“Eu sou o bom pastor. Conheço as minhas ovelhas, e elas me conhecem, assim como o Pai me conhece e eu conheço o Pai. Eu dou minha vida pelas ovelhas” (Jo 10,14-15). Jesus mantém com cada uma das suas ovelhas uma relação única, especial, pessoal; Ele conhece os seus sofrimentos, dramas, sonhos e esperanças. Cada um de nós é chamado a aprofundar o seu relacionamento pessoal com Jesus porque só n’Ele encontramos salvação, como disse claramente Pedro, cheio do Espírito Santo: “Em nenhum outro há salvação, pois não existe debaixo do céu outro nome dado aos homens pelo qual possamos ser salvos” (At 4,12). Aqui é importante repetir: só em Jesus Cristo encontramos a salvação porque Ele é a pedra principal da construção da nossa vida: quando descartamos essa pedra, todo o edifício da nossa vida desaba.
Ao se declarar como bom Pastor desse imenso rebanho que é a humanidade, Jesus também disse: “Tenho ainda outras ovelhas que não são deste redil: também a elas devo conduzir; escutarão a minha voz, e haverá um só rebanho e um só pastor” (Jo 10,16). Essas palavras nos falam da nossa missão de cristãos, de pessoas chamadas a cuidar das ovelhas que a vida coloca próximas de nós. Tudo o que existe e vive precisa ser cuidado para continuar a existir e a viver: uma planta, um animal, uma criança, um idoso, o planeta Terra... Sem cuidado, deixamos de ser humanos. Sem cuidado, deixamos de ser bons pastores e nos tornamos mercenários, pessoas que só agem por interesse. Santo Agostinho, no século IV, escrevia: “Jesus diz a Pedro: Apascenta as minhas ovelhas, e não as tuas ovelhas: apascenta-as como minhas e não tuas”. Que o nosso cuidado para com as pessoas leve isso em conta.
Hoje é o Dia Mundial de Oração pelas Vocações. Em sua mensagem para este dia, o Papa Francisco nos fala da importância de escutar, discernir e viver segundo a vocação que recebemos de Deus. Somos chamados a “escutar” o Senhor que nos fala muitas vezes “de forma silenciosa e discreta, sem Se impor à nossa liberdade”, afirma Francisco. Deus fala conosco especialmente na dor e na dispersão das Suas ovelhas, convidando-nos a cuidar delas como bons pastores. Porém, como vivemos num tempo marcado por muito barulho, precisamos “discernir” a voz do Senhor, essa voz que nos ajuda a “fazer as opções fundamentais” que nos configuram a Jesus Cristo, o profeta de Deus. “Como um vento que levanta o pó, o profeta perturba a falsa tranquilidade da consciência que esqueceu a Palavra do Senhor, discerne os acontecimentos à luz da promessa de Deus e ajuda o povo a vislumbrar, nas trevas da história, os sinais duma aurora”, explica Francisco. Por fim, somos chamados a abraçar a nossa vocação e a “viver” de modo digno da mesma. “A vocação é hoje! A missão cristã é para o momento presente! E cada um de nós é chamado – à vida laical no matrimônio, à vida sacerdotal no ministério ordenado, ou à vida de especial consagração – para se tornar testemunha do Senhor, aqui e agora”, diz Francisco.

Oração: Senhor Jesus, Tu és a pedra angular da construção da minha vida. Sem apoiar-me em Ti eu nada posso; sem orientar-me pela Tua palavra, o edifício da minha vida desaba. Sejas Tu, Senhor, o meu fundamento, o meu alicerce. Ampara-me sobre a rocha da Tua verdade, para que a construção da minha vida resista às tempestades desse mundo. Tu és, Senhor, o meu Pastor, por isso nada em minha vida faltará!  
Sou Tua ovelha, Senhor; pertenço ao Teu rebanho. Concede-me um coração capaz de ouvir, reconhecer e obedecer Tua voz. Livra-me do engano e das mentiras dos mercenários, daqueles que falam de Ti, mas têm o coração longe do Teu Evangelho, aqueles cujo coração está corrompido pela ganância do dinheiro. Protege-me dos lobos, Senhor; protege-me daqueles que atacam e agridem a minha vida física, emocional e espiritual. Concede-me discernimento para que eu não me deixe enganar por aqueles que, na política ou na religião, são lobos disfarçados de cordeiros. Tu és, Senhor, o meu Pastor, por isso nada em minha vida faltará! 
Muitos se desencantaram com os Teus pastores, Senhor Jesus. Muitos foram feridos em seu corpo e em sua alma por pastores pedófilos, que não roubaram apenas a inocência de crianças e adolescentes, mas roubaram-lhes também a fé! Visita, Senhor, todas as pessoas que estão machucadas em sua fé. Devolve-lhes a confiança em Ti. Que elas sejam curadas pela força do Teu amor de bom Pastor. Livra a nossa Igreja dos maus pastores e suscita no meio de nós pastores segundo o Teu coração! Tu és, Senhor, o meu Pastor, por isso nada em minha vida faltará! 
Pastorear significa cuidar. Cuida de cada um de nós, Senhor, e ajuda-nos a cuidar de todos aqueles que se encontram à nossa volta. Configura cada pai, mãe, educador, cada líder político e religioso ao Teu coração de bom Pastor. Toma em Teus braços cada ovelha que se encontra perdida, extraviada, doente, machucada, ameaçada em nosso mundo. Ensina-nos a dialogar com as outras igrejas e as outras religiões, para que, juntos, possamos agir na defesa e no resgate da vida de cada ovelha desse imenso rebanho que é a humanidade. Congrega-nos a todos no Teu único rebanho! Amém! Tu és, Senhor, o meu Pastor, por isso nada em minha vida faltará!

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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