Missa do 29º.
dom. comum. Palavra de Deus: Isaías 45,1.4-6; 1Tessalonicenses 1,1-5b; Mateus
22,15-21.
Na época de Jesus, o Império Romano
dominava a Palestina, e todo o povo era obrigado a pagar impostos ao Imperador
romano, chamado de “César”. Diante da perigosa pergunta: “É correto ou não
pagar imposto a César?”, Jesus corria dois riscos: se dissesse ‘sim’, estaria
passando a imagem de ser a favor da dominação romana e de todas as injustiças
por ela cometidas; se dissesse ‘não’, estaria passando a imagem de um
revolucionário que tentava provocar uma revolta popular contra Roma. Jesus não
assumiu nenhum desses papéis, mas questionou de quem era a imagem impressa na
moeda do imposto e mandou devolvê-la a César. No entanto, ele fez questão de
acrescentar, no final da sua resposta, que é preciso dar a Deus o que é de
Deus, deixando claro que todo “César” está debaixo da autoridade de Deus e um
dia deverá prestar contas a respeito da forma como exerceu o seu poder sobre as
pessoas.
Embora vivamos sob o regime
democrático, nós também temos os nossos “césares”, pessoas, organismos,
instituições e ideologias que exercem poder sobre nós, algumas vezes de maneira
construtiva e justa; outras vezes, de maneira destrutiva e injusta. Existe o
César que enxergamos – os poderes Executivo (Governo), Legislativo (Congresso e
Senado) e Judiciário. Mas existe também o César invisível, chamado de “Mercado”,
que com a sua “mão invisível” subjuga não só a vida da população mundial, mas inclusive
todo e qualquer César, pois o César que não reza na cartilha do Mercado é derrubado
rapidamente do poder, ainda que de maneira “democrática” ou “politicamente
correta”. Atualmente, porém, existe um outro César, tão ou mais perverso que o
Mercado, chamado “mídia”, a grande imprensa – rádios, jornais, revistas, canais
de televisão, além de uma infinidade de sites na internet, propagadores de
ideologias que se opõem frontalmente aos valores do Evangelho, ideologias que
têm por objetivo apagar a inscrição de Deus na consciência do ser humano e
inscrever as deformações das suas próprias doenças e dos seus próprios erros,
enganos e mentiras.
A resposta de Jesus: “Dai a César o
que é de Cesar e a Deus o que é de Deus” (Mt 22,21), nos convida a repensar a
maneira como nós, cristãos, nos situamos na sociedade. Jesus jamais promoveu o
fanatismo religioso, nem tampouco incentivou uma postura alienante do cristão
perante a sociedade. Pelo contrário, ele deixou claro que a nossa presença cristã
na sociedade tem tanta importância quanto o sal para o alimento e a luz para
uma casa ou uma cidade (cf. Mt 5,13-16). “Dar a César o que é de César”
significa que, em qualquer circunstância, o ser cristão deve ser um cidadão
exemplar e contribuir para o bem comum. Ele deve ter sua consciência voltada
para Deus e ajudar o mundo à sua volta a se tornar um lugar mais justo e mais
fraterno. Portanto, o verdadeiro cristão não se omite diante das questões
políticas, mas se esforça para que as suas escolhas políticas estejam de acordo
com os ensinamentos de Jesus no Evangelho.
Consideremos a segunda parte da
resposta de Jesus – “Dai a Deus o que é de Deus”. É ela que nos coloca
questionamentos mais profundos. Dar a Deus o que é de Deus significa, em
primeiro lugar, reconhecer que todo César é apenas um ser humano, e nenhum ser
humano pode ocupar o lugar de Deus na consciência das pessoas. Nenhuma lei,
assim como nenhuma ideologia criada por César, tem o direito de ferir a
consciência da pessoa que escolheu orientar-se segundo os valores do Evangelho.
Um exemplo concreto: não é Cesar – seja ele o Governo ou a mídia – quem deve
dizer aos pais como eles devem educar seus filhos. A autoridade dos pais é algo
sagrado e está acima da autoridade de qualquer César, no que diz respeito à educação
dos filhos. Além disso, o próprio Jesus já nos ensinou que “um cego não pode
guiar outro cego”, pois os dois cairiam no mesmo buraco (cf. Mt 15,14). Como
uma rede de televisão, como a rede Globo, por exemplo, com determinados
programas pensados por pessoas doentes, pessoas sem uma referência saudável e
equilibrada de família e sem uma experiência positiva de Deus, pode dizer algo
de significativo para as famílias do nosso tempo? O mesmo questionamento vale a
respeito da pessoa responsável pelo Ministério da Educação e Cultura...
Dar a Deus o que é de Deus
significa, em segundo lugar, resgatar a consciência de que a nossa identidade originária
vem de Deus: “Deus criou o homem à sua imagem, à imagem de Deus ele o criou,
homem e mulher ele os criou” (Gn 1,27). Portanto, não é César – Governo ou mídia
– quem nos diz quem somos. Pelo contrário, o tão propagado e exigido respeito
às diferenças tem funcionado como um rolo compressor que César usa com a
pretensão de anular a verdade de que Deus criou o ser humano diferenciado como
homem e como mulher. Desse modo, enquanto a estratégia da mídia tem sido
embolar o meio de campo no que diz respeito à identidade sexual das novas
gerações com a proposta “seja o que quiser ser”, o cristão se guia por outro
princípio: “seja o que você foi chamado a ser”, quando Deus criou você.
Por fim, dar a Deus o que é de Deus
significa que o cristão não se guia na vida pelas leis que César cria, normalmente
subjugado aos interesses do Mercado. O cristão se orienta por sua própria consciência,
chamada a voltar-se diariamente para Deus, na Sagrada Escritura. Não são as
leis de César (Executivo, Legislativo e Judiciário), nem as ideologias da
mídia, que devem estabelecer para o cristão o que é certo e o que é errado,
como, por exemplo, a descriminalização do aborto e do uso de drogas, além de
outros assuntos tidos como polêmicos. O cristão verdadeiro é aquele que se guia
pela lei interna do bom senso e da busca da verdade que liberta.
Oração:
Senhor, tu és o nosso Pai. Tu és o nosso Deus, o único e verdadeiro Deus. É
para a tua Palavra que queremos orientar a nossa vida, a nossa consciência e o
nosso coração. Não queremos nos omitir diante do bem que somos chamados a fazer
em vista da justiça, da paz e da fraternidade em nosso mundo. Temos impostos a
pagar a César. Não queremos nos tornar corruptos, injustos e desonestos como
tantos césares do nosso tempo. Mas não vamos admitir que César ocupe em nossa
consciência um lugar que é somente teu. Muitos césares do nosso tempo estão
doentes; são guias cegos, pessoas desorientadas internamente, homens e mulheres
sem uma experiência positiva de família e de fé. Nós não vamos admitir que eles
nos adoeçam ou que adoeçam nossas crianças e adolescentes com ideologias que
visam destruir a verdade de que fomos criados à tua imagem e semelhança. Queremos
abraçar a vocação de sermos o que fomos chamados a ser, quando o Senhor nos
chamou à existência, pois é somente no encontro com a tua verdade no mais
íntimo de nós que poderemos nos tornar pessoas saudáveis, equilibradas,
libertas e felizes. Por Jesus, teu Filho. Amém!
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