Missa do 28º.
dom. comum. Palavra de Deus: Isaías 25,6-10a.; Filipenses 4,12-14.19-20; Mateus
22,1-14.
Para falar do propósito de Deus em
salvar a humanidade, a Sagrada Escritura escolheu usar a imagem da festa: um
grande banquete, no qual se oferecem comidas e bebidas deliciosas e em
abundância. Um detalhe importante: este banquete é oferecido a todos os povos,
o que significa dizer que a salvação de Deus não está restrita a uma igreja ou
a uma religião. Toda igreja e toda religião devem estar a serviço do propósito
de Deus em salvar o ser humano, exatamente como os servos na parábola do
Evangelho, responsáveis por convidar as pessoas para a festa de casamento do
filho do rei.
A imagem do banquete ou da festa
fala, em primeiro lugar, da gratuidade da salvação: da mesma forma que para
essa festa ou esse banquete não há ingresso, não há dinheiro a ser pago, Deus
oferece Sua salvação como puro dom ao ser humano. Mas aqui acontece algo
estranho, retratado por Jesus no Evangelho: muitas pessoas rejeitam o convite
para a festa, porque estão ocupadas com suas próprias coisas. São pessoas que
alegam não ter tempo para Deus. Elas precisam trabalhar para ganhar dinheiro;
precisam estudar para alcançar suas metas profissionais; o tempo delas está
totalmente ocupado e preenchido com sua mais nova aquisição – seu mais novo carro,
sua mais nova casa, seu mais novo celular ou computador, sua mais nova TV, seu
mais novo “brinquedo”...
Mas a imagem do banquete ou da festa
fala também da alegria. A salvação é descrita na Sagrada Escritura como
sinônimo de festa, de alegria e de abundância. E aqui nós, Igreja, temos que
reconhecer que muitas vezes colaboramos para as pessoas não irem às nossas
“festas”, isto é, às nossas celebrações e outras atividades pastorais, pois
elas são, via de regra, chatas, enfadonhas, cansativas, marcadas pela mesmice,
desprovidas de alegria, de gratuidade e de criatividade. Além disso, são
celebrações ou atividades pastorais conduzidas algumas vezes por uma pessoa
cansada, triste, desanimada ou até mesmo mal-humorada.
Muitos reagirão a isso dizendo que a
Igreja não é um circo, um lugar para show, e que muitas pessoas hoje estão
atrás de espetáculo, de eventos que lhes causem emoção. Embora isso tenha um
fundo de verdade, precisamos ter a coragem de reconhecer que muitos ministros
de Deus e agentes de pastoral hoje servem a Deus como se fossem “coveiros” (peço
perdão aos coveiros, por mencioná-los aqui no sentido negativo); são pessoas
incapazes de suscitar alegria e esperança naqueles que as escutam falar sobre Deus,
justamente o contrário do que fez o profeta Isaías, quando anunciou Deus como
Aquele que é capaz de eliminar a morte e enxugar a lágrima de todas as faces – de
todas, não apenas de algumas – o Deus em quem vale a pena esperar: “Este é o
nosso Deus, esperamos nele, até que nos salvou; este é o Senhor, nele temos
confiado: vamos alegrar-nos e exultar por nos ter salvo” (Is 26,9).
Retornando ao Evangelho, Jesus nos
ensina que, embora muitas pessoas escolham ignorar Deus no Seu propósito de
lhes oferecer a alegria da salvação, Ele continuará a fazer essa mesma oferta a
todo e qualquer ser humano: “A festa de casamento está pronta, mas os convidados
não foram dignos dela. Portanto, ide até as encruzilhadas dos caminhos e
convidai para a festa todos os que encontrardes” (Mt 22,8-9). É assim que Deus
quer a nossa Igreja, uma “Igreja em saída”, cujos ministros e agentes de
pastoral não permaneçam fechados na sacristia ou em suas casas, mas saiam e se
dirijam às periferias existenciais, como nos pede o Papa Francisco: “Saiamos, saiamos
para levar a todos a vida de Jesus Cristo! (...) Se alguma coisa nos deve
santamente inquietar e preocupar a nossa consciência é que haja tantos irmãos
nossos que vivem sem a força, a luz e a consolação da amizade com Jesus Cristo,
sem uma comunidade de fé que os acolha, sem um horizonte de sentido e de vida”
(A alegria do Evangelho, n.49).
Segundo a parábola contada por
Jesus, a “insistência” de Deus em oferecer a salvação a todo ser humano deu
certo: “a sala da festa ficou cheia de convidados” (Mt 22,10). Porém, “quando o
rei entrou para ver os convidados, observou ali um homem que não estava usando
traje de festa” (Mt 22,11). Para entendermos o significado deste “traje de
festa”, precisamos recorrer ao livro do Apocalipse: trata-se do comportamento
justo da pessoa que professa a sua fé em Deus e em seu Filho Jesus Cristo (cf.
Ap 19,8). Dizendo de outro modo, embora a salvação seja gratuita e destinada a
todas as pessoas, todo aquele que se recusa a praticar a justiça – todo aquele
que não se preocupa em se tornar uma pessoa justa – se exclui da presença de
Deus. De fato, a Sagrada Escritura deixa claro o quanto Deus aprecia o
comportamento justo: “Deus não faz diferença entre as pessoas. Pelo contrário,
em qualquer nação, quem o respeita e pratica a justiça lhe é agradável” (At
10,34-35).
Esta cena trágica no final do Evangelho
– um homem sendo retirado da sala da festa e jogado fora, na escuridão (cf.
v.13), nos assusta. Tal atitude de Deus – representado pelo rei na parábola –
parece contradizer todo o Seu esforço em fazer com que a sala ficasse cheia de
convidados. Parece não fazer sentido Deus colocar em ação o Seu grande desejo
de que “todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade” (1Tm
2,4), e depois excluir da salvação uma pessoa, ainda mais por um motivo
aparentemente banal, como a roupa inadequada. Mas essa aparente contradição é proposital:
para nós, que hoje ouvimos essa parábola contada por Jesus, precisa ficar claro
o quanto nós podemos chegar ao absurdo de nos excluir da salvação, pelo fato de
querermos, sim, participar do banquete no Reino de Deus, desde que não tenhamos
que nos esforçar minimamente em ajustar a nossa vida à justiça e à santidade do
nosso Deus.
Por mais que a Sagrada Escritura
afirme que nós somos salvos por pura graça de Deus (cf. Ef 2,5.8), a salvação
não é algo que acontece “passivamente” na nossa vida, à revelia da nossa
vontade, sem a nossa colaboração, sem a nossa aceitação, sem o envolvimento da
nossa consciência e do nosso coração. Já dizia Santo Agostinho: “Deus, que te
criou sem ti, não te salva sem ti”. Aquele que preparou uma grande festa, um
grande banquete no seu Reino para todos os povos, é o mesmo Deus que conhece o
homem por dentro e que determinou que nada de impuro entrará no Seu Reino (cf.
Ap 21,27). Deixemos, portanto, nos revestir da justiça e da santidade do
nosso Deus, procurando ajustar o nosso comportamento ao que o Seu Filho nos
ensina diariamente no Evangelho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário