Missa do 21º.
dom. comum. Palavra de Deus: Isaías 22,19-23; Romanos 11,33-36; Mateus 16,13-20
A pergunta
provocadora: Quem é Jesus para mim?
Quando procuramos um médico, um
psicólogo, um diretor espiritual ou um amigo para uma consulta ou uma conversa,
normalmente o fazemos porque estamos em busca de respostas para os nossos
problemas e inquietações. Mas, para surpresa nossa, a pessoa que nos escuta, ao
invés de nos dar respostas nos faz perguntas, perguntas que, de uma certa
forma, devolvem o problema a nós mesmos; perguntas que, na verdade, nos devolvem
a nós mesmos porque nos fazem confrontar-nos com aquilo que precisamos ser
confrontados, se queremos encontrar a saída para determinado problema.
No campo da fé não é muito
diferente. Nós procuramos por Jesus em busca de respostas, mas Ele nos coloca
perguntas, perguntas que nos ajudam a repensar a nossa vida, a nossa fé e a
nossa visão de Deus; perguntas que nos incomodam, nos provocam e nos
desinstalam da nossa “zona de conforto”. Aliás, não é só Jesus que nos faz
perguntas. Quando pensamos em nossa ação pastoral como Igreja, percebemos um
grande desafio: nós costumamos oferecer respostas às novas gerações, mas são
respostas a perguntas que elas não nos fizeram – portanto, são respostas que não respondem. Enquanto
isso, as novas gerações nos colocam perguntas para as quais não temos resposta,
e não temos porque estamos viciados nas perguntas e nas respostas de ontem, uma
vez que não queremos nos dar ao trabalho
de nos deixar questionar pela realidade à nossa volta.
No
hoje da nossa vida, no preciso momento histórico pessoal e social que estamos
vivendo, Jesus nos pergunta: “Quem eu sou para vocês?” O problema dessa
pergunta é que ela não é respondida simplesmente com os lábios, com as
palavras; a resposta a essa pergunta aparece nas atitudes do dia a dia. Se você
perguntar, por exemplo, ao “anti-juiz” Gilmar Mendes, facilitador da manutenção
da corrupção praticada por inúmeros políticos e empresários em nosso país, se
ele acredita que Jesus é o Filho de Deus, muito provavelmente dirá que sim. Se
você fizer essa mesma pergunta a tantos traficantes, policiais corruptos, líderes
de facções criminosas e deputados das bancadas ruralista e evangélica no
Congresso – os quais têm votado projetos que atentam contra o meio ambiente,
colocam o Brasil à venda e reforçam a impunidade frente aos crimes praticados
pelos eles mesmos –, você obterá a mesma resposta: eles também acreditam que
Jesus é o Filho de Deus. No entanto, as atitudes deles são opostas ao que Jesus
ensina no Evangelho.
O
que precisa ficar claro é que a nossa
resposta à pergunta de Jesus pode ser encontrada verdadeiramente na maneira
como nos comportamos no dia a dia. Em outras palavras, a imagem que temos
de Jesus influencia diretamente a maneira como nos posicionamos diante dos
desafios que a vida nos apresenta, a maneira como rezamos e como
realizamos/participamos das nossas celebrações, a maneira como nos posicionamos
diante da política, da pobreza, da violência, das injustiças sociais, da
corrupção, de questões como aborto, eutanásia, sexualidade, identidade de
gênero etc. Neste sentido, precisamos ter a coragem de admitir que o Jesus em
quem dizemos ter fé pouco ou nada tem a ver com o Jesus bíblico, o Jesus dos
Evangelhos; ele é apenas uma adaptação espiritual
para a nossa fé, uma fé sempre mais reduzida a um ritual de autoajuda, com
pouca incidência social.
Pedro,
apesar de toda a sua fragilidade e ambiguidade humanas, expressou a firmeza da sua
fé, ao responder à pergunta de Jesus, uma firmeza comparada à rocha, pelo
próprio Jesus. Essa firmeza de Pedro contrasta com a nossa época, onde tudo se
tornou “líquido”, porque as pessoas não acreditam mais em algo sólido, firme,
estável. Elas vivam numa constante insegurança. Por isso, é necessário que nós,
cristãos, estejamos apoiados firmemente em nossa fé em Jesus, para podermos ser
também um ponto de apoio firme, sólido, para as pessoas. E assim como Pedro
recebeu a missão de “ligar e desligar”, nós também precisamos ajudar as pessoas
a se “ligarem” ao verdadeiro Jesus Cristo e a se desligarem ou desprenderem de
imagens falsificadas/distorcidas/superficiais de Jesus, próprias de uma
espiritualidade alicerçada na areia de superstições ou de devoções, distante da
rocha sólida dos Evangelhos.
O problema das autoridades
desautorizadas
Jesus
conferiu a Pedro a autoridade sobre sua Igreja, uma autoridade chamada a se “converter”
a cada dia em “serviço” em favor da fé dos seus irmãos: “Quando você se
converter, confirme seus irmãos na fé” (Lc 22,32). Essa mesma imagem da
autoridade apareceu no texto do profeta Isaías: “ele será um pai... Eu o farei
portar aos ombros a chave da casa de Davi; ele abrirá, e ninguém poderá fechar;
ele fechará, e ninguém poderá abrir. Hei de fixá-lo como estaca em lugar seguro...”
(Is 22,21-23). Como está sendo exercida hoje a autoridade na família, no
trabalho, na política, nas mais diversas igrejas e religiões?
Constata-se
um vazio de autoridade em nosso mundo: o que temos atualmente são caricaturas
de autoridade, como Trump (EUA), Putin (Rússia) e Nicolás Maduro (Venezuela).
No Brasil, somos (des)governados por autoridades desautorizadas, porque
corrompidas pela ganância do dinheiro. Em nossa Igreja, temos a bênção de sermos
governados atualmente pelo Papa Francisco, um homem autorizado a falar do
Evangelho porque, antes de ser papa, cardeal, bispo e padre, procurou primeiramente
ser cristão, e é assim que procura viver até hoje. Contudo, embora também tenhamos
muitos bispos e padres que ainda se esforçam em pautar a vida pelo Evangelho, experimentamos
hoje uma séria crise de autoridade moral e espiritual em nossa Igreja: padres e
bispos amantes do dinheiro, do luxo e da vida boa; homens que, apesar de terem frequentemente
uma postura autoritária em relação aos seus fiéis, estão moral e
espiritualmente desautorizados a falar de
Deus, porque a maneira como vivem
durante a semana contradiz o que pregam nas missas aos domingos.
A
leitura profeta Isaías nos oferece um bom exame de consciência quanto à maneira
de se exercer a autoridade: todo líder religioso é chamado a ser uma estaca fixada em lugar seguro, um homem com
um mínimo de autenticidade para conduzir as pessoas a uma fé mais consistente, e
não um “caniço agitado pelo vento”, um homem cuja chave da vida afetiva facilmente
é entregue às mãos de terceiros e cuja chave da vida financeira está confiada às
mãos da ganância e da desonestidade. O texto bíblico é muito claro: assim como aconteceu
com Sobna, toda pessoa que se corrompe ou que se torna relapsa no exercício da
sua autoridade será destituída por Deus
de seu “cargo”, no devido tempo (cf. Is 22,19).
Hoje é o dia dos catequistas. Eles
compõem o grupo mais importante de trabalho em nossas paróquias, pois deles
depende a transmissão da fé para as novas gerações. Hoje queremos não só agradecer
a Deus pela vocação de cada catequista, mas também pedir que eles sejam
revestidos da força do alto, da autoridade de Deus, do poder do Espírito Santo,
para ajudarem as novas gerações a se confrontarem com as perguntas necessárias
para o seu crescimento e aperfeiçoamento humano e espiritual. Que nossos
catequizandos encontrem nos seus catequistas uma estaca fixada em lugar seguro,
uma referência firme para a sua fé e
para a sua experiência de Jesus Cristo como Filho do Deus vivo e salvador de
todo aquele que tem fé.