Missa da
quarta-feira de cinzas. Palavra de Deus: Joel 2,12-18; 2Coríntios 5,20–6,2;
Mateus 6,1-6.16-18.
É tempo de SANEAMENTO. Este importante
tempo de Quaresma que hoje iniciamos tem como pano de fundo a Campanha da
Fraternidade, a qual nos propõe como princípio de vida o SANEAMENTO, palavra
que significa curar, recuperar, tornar limpo, retornar ao estado original, sanar, higienizar, tornar saudável. O saneamento não é somente uma série de medidas que torna uma área sadia, limpa,
habitável, oferecendo condições adequadas de vida para a população, mas também um
conjunto de ações para estabelecer a ética e a justiça. Por isso, ouvimos falar
da necessidade de “saneamento da administração pública” ou de “saneamento das
contas públicas”, por exemplo.
Aqui podemos recordar mais uma vez
as palavras da música “Que país é esse?” (Legião Urbana): “Nas favelas, no Senado, sujeira pra todo lado. Ninguém respeita a
Constituição, mas todos acreditam no futuro da nação. Que país é esse?”.
Sim. Infelizmente temos que admitir: há sujeira pra todo lado. Desde a forma
como lidamos com o lixo em nossa casa até a forma como tantos políticos e
empresários lidam com o dinheiro público, há sujeira pra todo lado. E onde há
sujeira, há doença e risco de morte.
Mas, de onde vem a sujeira que
provoca doença e morte em nosso meio? Ela vem do pecado – do pecado pessoal e
social. Se o meio ambiente está sujo, se tantos políticos e empresários estão
contaminados com o vírus da corrupção, se tantos adolescentes e jovens estão
adoecidos pelo vício da bebida e das drogas, se a sociedade padece ferida pela
violência, é porque a nossa consciência, de maneira geral, se encontra suja,
tão suja que nós temos dificuldade em reconhecer o nosso pecado, como fez o
salmista: “Eu
reconheço toda a minha iniquidade, o meu pecado está sempre à minha frente....
Pratiquei o que é mau aos vossos olhos” (Sl 51).
A primeira coisa que precisa ser
saneada, recuperada, limpa, é a nossa consciência, o lugar onde Deus nos fala:
“Voltai para mim com todo o vosso coração... Prescrevei o jejum sagrado,
convocai a assembleia, congregai o povo... Chorem... e digam: Perdoa, Senhor, a
teu povo...” (Jl 2,12.15-17). Desde o Antigo Testamento, o jejum aparece como
uma atitude importante de saneamento, de limpeza, de desintoxicação. Quando
jejuamos, damos ao nosso organismo o tempo que ele precisa para se
desintoxicar. Por outro lado, o jejum não visa apenas recuperar a saúde do
nosso corpo, mas principalmente o nosso autodomínio: não podemos viver
arrastados pelos nossos desejos e impulsos, mas precisamos administrá-los em
vista do nosso verdadeiro bem.
O jejum que agrada a Deus não é
simplesmente não comer isto ou aquilo, mas abster-se de agredir as pessoas com
palavras ou atitudes, abster-se de pensamentos e sentimentos que entulham de
lixo a nossa consciência e o nosso coração, não nos fechar sobre nós mesmos,
mas nos abrir àqueles que precisam de nós: doentes, necessitados, desempregados
etc. Também é muito importante jejuar de imagens. Estamos intoxicados por
imagens da TV, do celular, da internet: imagens de pornografia, que distorcem a
nossa sexualidade; imagens de violência, que aumentam a nossa agressividade e
perturbam o nosso espírito. Por fim, também precisamos nos desintoxicar de
imagens erradas que temos de Deus: seja o “Deus-juiz”, que se revela como violento
e ameaçador, seja o “Deus-pizza”, sinônimo de impunidade.
O Papa Francisco tem insistido em nos
falar de Deus como “misericórdia”. A Quaresma é este tempo apropriado para nos
deixarmos reconciliar com Deus e nos permitir ser abraçados por Sua misericórdia.
Envolvidos nos braços do Pai, pedimos, como o salmista: “Criai em mim um
coração que seja puro”, limpo, curado, saneado, recuperado em seu estado
original; um coração puro, isto é, sem o fermento da vaidade ao dar esmola, ao
orar, ao jejuar. Que a nossa esmola seja expressão da nossa verdadeira comunhão
com a dor do nosso próximo. Que a nossa oração seja um constante configurar-se
com o Pai misericordioso. Que o nosso jejum seja, enfim, um constante abandono
de tudo aquilo que não nos é essencial, para que possamos, uma vez
desintoxicados, colaborar para o saneamento do ambiente à nossa volta.
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