quinta-feira, 2 de julho de 2015

ADMIRAÇÃO, ESCÂNDALO E ESPINHO

Missa do 14º. dom. comum. Palavra de Deus: Ezequiel 2,2-5; 2Coríntios 12,7-10; Marcos 6,1-6.

       Admiração e escândalo são atitudes/emoções/sentimentos opostos. Enquanto a admiração desperta em nós o desejo de estar mais próximo de quem nos fala, de querer imitá-lo(a), o escândalo desperta em nós a rejeição e a repulsa em relação à pessoa que nos fala. Deus nos fala, seja por meio da Sua palavra, seja de quem nos anuncia a Sua palavra – o pregador ou a Igreja –, seja por meio da natureza, dos acontecimentos, de um(a) terapeuta ou da nossa consciência. Se Deus nos fala, é importante perceber quando é que nos admiramos e quando é que nos escandalizamos com Ele.  
Normalmente, a nossa admiração ou o nosso escândalo para com Deus depende do quê Ele nos fala: se nos fala o que gostamos de ouvir, nos enchemos de admiração; mas se nos fala o que precisamos, mas não queremos ouvir, nos escandalizamos, nos revoltamos e nos recusamos a continuar a ouvi-Lo. No caso do Evangelho de hoje, o que escandalizou os nazarenos não foi o quê Jesus disse, mas a pessoa do próprio Jesus; como diríamos hoje, um comedor de arroz e feijão como nós.
“E ficaram escandalizados por causa dele” (Mc 6,3). Quando é que ficamos escandalizados com Deus? Quando Ele se manifesta de maneira extremamente simples; quando se recusa a manifestar-Se glorioso e espalhafatoso. Nós ficamos escandalizados com Deus quando Ele – aparentemente – não se manifesta diante de tragédias humanas; quando Ele se recusa a tirar o espinho que está em nossa carne, a mancha que está comprometendo a beleza da nossa imagem... O que mais nos escandaliza em Deus é Ele ter escolhido nos salvar na carne humana de Jesus Cristo, cuja vida foi pautada pela simplicidade, pela pobreza e pela comunhão com a fragilidade humana.
“E (Jesus) ali não pôde fazer milagre algum... E admirou-se com a falta de fé deles” (Mc 6,5.6). Não há milagre onde não há fé, e não há fé porque não enxergamos Deus nas coisas pequenas e rotineiras da vida. Exigimos manifestações espetaculares para podermos crer. Por trás do escândalo dos nazarenos para com a pessoa de Jesus está um outro problema, um problema mais do que atual: é um tipo de fé que se escandaliza facilmente porque é uma fé feita de caprichos pessoais, uma fé que exige tratamento VIP da parte de Deus e da parte da Igreja.                 
            Quem abraça um serviço na Igreja movido – talvez de maneira inconsciente – por caprichos pessoais, jamais aceitaria a missão que Deus confiou a Ezequiel: falar a um povo “de cabeça dura e coração de pedra” (Ez 2,4). “Quer te escutem, quer não... ficarão sabendo que houve entre eles um profeta” (Ez 2,5). Os nossos caprichos pessoais nos levam a falar de Deus somente se houver um público garantido, uma plateia que nos escute com atenção, que concorde com o que pregamos e que nos aplauda no final da pregação. Afinal, o que está em jogo – aos nossos olhos – é a nossa imagem, e não admitidos que não nos admirem quando nos expomos em público. No entanto, na vocação de Ezequiel fica claro que o importante não é a pessoa que anuncia, mas a Palavra que deve ser anunciada: não importa se ela será acolhida e obedecida; o que importa é que ela seja dita, proclamada, anunciada, e fique na consciência das pessoas que a ouvirem.
              Numa época narcisista como a nossa, onde nos ensinam que a coisa mais importante que temos é a nossa imagem, como não nos escandalizar com um Deus que se recusa a tirar o espinho que temos na carne? “(...) foi espetado na minha carne um espinho..., a fim de que eu não me exalte demais. A esse propósito, roguei três vezes ao Senhor que o afastasse de mim. Mas ele me disse: ‘Basta-te a minha graça. Pois é na fraqueza que a força se manifesta’” (2Cor 12,7-9). Deus pode não querer remover alguma fraqueza nossa (e isso certamente pode nos escandalizar, nos deixar decepcionados com Ele!), porque é justamente pela brecha dessa fraqueza que a força d’Ele vai entrar e agir em nós, e, por meio de nós, naqueles que nos ouvem.  
              Algumas indicações da Palavra de Deus hoje: 1) Quando não queremos nos deixar questionar pela Palavra de Deus, começamos a questionar a pessoa que nos anuncia a Palavra. É uma defesa, uma resistência à conversão... 2) Para a sociedade da aparência, você precisa se tornar uma pessoa importante, notada, desejada. O que você é como pessoa não basta: precisa de um piercing, de uma tatuagem, de musculação, de uma mecha colorida no cabelo, de um adereço, de um corte de cabelo extravagante, de uma roupa sensual ou espalhafatosa... Enfim, você, natural, não é nada; você só é alguma coisa se estiver adornada(o) de algo artificial... 3) Você também se escandaliza, se decepciona com um Deus que não tira o espinho que há em sua carne, que não cancela a sua fraqueza e que não lhe transforma numa pessoa forte, impecável e inabalável?

Para a sua oração pessoal: MINHA GRAÇA TE BASTA (Adriana)

https://www.youtube.com/watch?v=nVAXa7mtx_o


                                                 Pe. Paulo Cezar Mazzi

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