Missa da
Santíssima Trindade. Palavra de Deus: Deuteronômio 4,32-34.39-40; Romanos
8,14-17; Mateus 28,16-20.
O que é uma caricatura? É uma imagem
ambígua: ao mesmo tempo em que ela se parece com a pessoa que representa, também
traz consigo deformações e imperfeições, feitas propositalmente. A caricatura
é, por assim dizer, a imagem deformada de uma pessoa. Ela se parece com a pessoa,
mas a pessoa representada na caricatura não tem aquelas deformações.
No mundo atual existem muitas caricaturas
de Deus: religiosas, políticas, econômicas, tecnológicas etc. No campo da
religião, a caricatura mais assustadora de Deus é o fanatismo religioso. Por
causa dele, alguns matam “em nome de Deus”. Na verdade, matam em nome da
caricatura de Deus que carregam dentro de si. O campo político e econômico se
encontram quase sempre ajoelhados diante da mesma deformação de Deus: o “poder
econômico”. Para esses adoradores do ídolo dinheiro, o bolso tomou o lugar da
consciência. Enfim, no campo tecnológico encontramos uma caricatura de Deus
chamada “poder infinito”, o qual nos remete sempre ao futuro, a uma suposta
vida sem doenças, sem dor, sem sofrimento. Enquanto esse futuro não chega, a
tecnologia nos mantém distraídos e/ou hipnotizados com seus “brinquedinhos”, os
quais nos oferecem infinitas caricaturas de Deus.
O Deus vivo e verdadeiro Se revelou
a Israel unicamente através da Sua voz, falando-lhe do meio do fogo (cf. Dt
4,33), fogo que, embora transmita vida, calor e luz, não pode ser tocado pelo
ser humano. Este fogo, que não podemos tocar, precisa tocar e consumir todas as
caricaturas de Deus que existem dentro e fora de nós, para que possamos
reconhecer a gravar no coração a verdadeira imagem do Deus vivo, do Deus que,
sendo invisível, se tornou visível a nós na pessoa de seu Filho Jesus Cristo
(cf. Cl 1,15), do Deus cujo amor “foi derramado em nossos corações pelo
Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5,5).
Se
o Filho e o Espírito Santo procedem do coração do mesmo Deus, isso significa
que o Pai não é solidão, mas comunhão e, por ser comunhão, Ele mesmo disse,
depois de ter criado o homem sobre a terra: “Não é bom que o homem esteja só” (Gn
1,18). Apesar de toda dificuldade que possa haver nos relacionamentos, não é
bom que o ser humano se isole, que se feche em si mesmo, que se torne
indiferente àquele que é sua própria carne (cf. Is 58,7). Também não é bom que
deixemos pessoas na solidão. Uma das coisas que favorece o mal de Alzheimer é
deixar a pessoa sozinha, sem ninguém para conviver e conversar...
Porque fomos criados à imagem e
semelhança do nosso Deus (cf. Gn 1,26-27), precisamos nos perguntar se hoje
ainda mantemos a imagem de Deus em nós ou se nos tornamos apenas Sua
caricatura. Ser imagem de Deus significa enxergar o outro como alguém
certamente diferente de nós, mas que se encontra em nosso caminho de vida para
nos ensinar alguma coisa. Neste sentido, nossos atritos com as pessoas também
têm um lado positivo: aparar as nossas arestas e alisar as nossas asperezas. Ainda
que o individualismo tenha se tornado a “palavra de ordem” para a sobrevivência
no mundo atual, precisamos nos perguntar: “Se Deus é nosso Pai, quem é que não
é nosso irmão?” (Cantores de Deus, Direito
de viver).
O mistério da Santíssima Trindade nos ensina que nosso Deus é o único e
verdadeiro Deus, mas um Deus que se revelou ao ser humano como Pai criador,
como Filho redentor e como Espírito santificador. Em meio às provações e aos
combates da vida do dia a dia, devemos reconhecer e gravar no coração “que o
Senhor é o Deus lá em cima no céu e cá embaixo na terra e que não há outro além
dele” (Dt 4,39). Isso significa que o amor que une as três pessoas da Santíssima
Trindade é o mesmo amor que se inclina sobre a terra para recriar, salvar e
santificar o ser humano.
Nossa tarefa como cristãos e como
imagens vivas do Deus uno e trino consiste em duas coisas: nos deixar conduzir
pelo Espírito de Deus (cf. Rm 8,14), para que o Pai e o Filho possam habitar em
nós, e fazer com que, pelo anúncio do Evangelho, todas as pessoas que
encontrarmos desejem se tornar discípulas de Jesus Cristo, mergulhando sua vida
na comunhão do Pai, do Filho e do Espírito Santo (cf. Mt 28,20).
Pe. Paulo Cezar Mazzi