quinta-feira, 30 de outubro de 2014

IMPORTA VIVER ANTES DE MORRER, ASSIM COMO NÃO MORRER ANTES DA HORA

Missa dos fiéis defuntos. Palavra de Deus: Jó 19,1.23-27a.; Romanos 5,5-11; João 6,37-40.

“Eu tenho medo de não mais ser lembrado” – palavras do livro que virou filme: A culpa é das estrelas. O dia de finados nos convida a nos lembrar daqueles que recentemente ou há muito tempo partiram desta vida. Depois que morrermos, nós seremos lembrados por alguém? Por quanto tempo? Silvia Schmidt escreveu: “Eu tive que aceitar as minhas fragilidades, os meus limites, a minha condição de ser mortal, de ser atingível, de ser perecível. Eu tive que aceitar que a VIDA sempre continuaria com ou sem mim, e que o mundo em pouco tempo me esqueceria” (Eu tive que aceitar). Ao nos fazer lembrar daqueles que morreram, o dia de hoje também nos faz um questionamento: quantos não são mais lembrados por nós, apesar de ainda estarem vivos entre nós? Quantos idosos, solitários em suas casas ou nos asilos, não são lembrados por seus filhos e netos?
Jó acabou de nos dizer: “Gostaria que minhas palavras... fossem escritas e... cravadas na rocha para sempre!” (Jó 19,23-24). Sim, em praticamente todos os túmulos encontramos gravados em placas de metal ou no mármore os nomes de pessoas que faleceram. Mas o que Jó quis que fosse gravado na rocha para sempre é uma certeza de fé que devemos ter, quando tomamos consciência de que um dia vamos morrer: “Eu sei que o meu redentor está vivo e que, por último, se levantará sobre o pó; e depois que tiverem destruído esta minha pele, na minha carne verei a Deus” (Jó 19,25-26).
Enquanto nossa vida é feita de inúmeras incertezas, a morte é nossa única certeza. Mas a fé nos convida a olharmos para além da morte, a olharmos para o nosso Redentor, que está vivo, o Senhor Jesus, que nos resgata e nos arranca das mãos da morte. Mesmo que a nossa pele seja destruída na morte, nós veremos a Deus, e O veremos com o nosso corpo, que se tornará um corpo glorificado (cf. Fl 3,20-21). Por isso, disse o salmista: “Espera no Senhor e tem coragem, espera no Senhor!” (Sl 27,14).
A esperança à qual se refere o salmista não é uma esperança ilusória, mas uma esperança que não nos decepciona, porque está garantida pelo Espírito Santo, O qual ressuscitou Jesus e ressuscitará também a cada um de nós. Desse modo, o apóstolo Paulo nos convida a não temermos a morte, nem o momento do nosso encontro com Deus, pois já estamos reconciliados com o Pai, por meio do sangue de seu Filho derramado na cruz. No momento da nossa morte, Deus nos espera como Pai, mais do que como Juiz (cf. Rm 5,5-11).
Quando morre alguém da nossa família, dizemos: “Eu perdi meu pai, minha filha, minha irmã, meu avô...” No entanto, Jesus nos garante que Ele não perderá nenhum daqueles que o Pai confiou aos Seus cuidados. A morte pode arrancar de nossas mãos pessoas que amamos, mas o Pai confiou cada um de nós às mãos e aos cuidados de seu Filho Jesus Cristo que, por ter vencido a morte, nos faz esta promessa: ‘Eu não vou perder nenhum daqueles que o Pai me confiou. Além disso, vou ressuscitá-los no último dia’ (citação livre de Jo 6,39).
Antes que chegue o nosso “último dia”, precisamos rever como temos vivido cada um dos nossos breves dias neste mundo. Dalai Lama disse que o que mais chama a sua atenção é que as pessoas hoje, obcecadas em ganhar dinheiro, “vivem como se nunca fossem morrer, e morrem como se nunca tivessem vivido”. Já Cora Coralina nos alerta sobre o perigo de morrermos antes da hora, ao escrever: “Eu sei que algum dia alguém terá que me enterrar, mas eu não vou fazer isso comigo”. Da mesma forma, Albert Schweiter disse: “A tragédia não é quando um ser humano morre; a tragédia é aquilo que morre dentro da pessoa enquanto ela ainda está viva”.
Refletir sobre a morte, neste dia de finados, pode nos ajudar a valorizar cada momento que vivemos na vida, sabendo que ele é único e nunca mais se repetirá. Assim, da mesma forma como iniciamos esta reflexão citando palavras do livro A culpa é das estrelas, assim também podemos terminá-la, mencionando uma parte do “Elogio Fúnebre” de Hazel Grace a Augustus Waters, dois jovens atingidos pelo câncer: “Queria mais números do que provavelmente vou ter, e, por Deus, queria mais números para o Augustus Waters do que os que ele teve. Mas, Gus, meu amor, você não imagina o tamanho da minha gratidão pelo nosso pequeno infinito. Eu não o trocaria por nada nesse mundo. Você me deu uma eternidade dentro dos nossos dias numerados, e sou muito grata por isso”. Sejamos gratos pelos “pequenos infinitos” que vivemos na companhia daqueles que já partiram, sabendo que um dia iremos reencontrá-los na eternidade de Deus, onde nossos dias não serão mais numerados... 

                                    Pe. Paulo Cezar Mazzi 

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