Missa dos fiéis defuntos. Palavra de
Deus: Jó 19,1.23-27a.; Romanos 5,5-11; João 6,37-40.
“Eu tenho medo de não mais ser lembrado”
– palavras do livro que virou filme: A
culpa é das estrelas. O dia de finados nos convida a nos lembrar daqueles
que recentemente ou há muito tempo partiram desta vida. Depois que morrermos,
nós seremos lembrados por alguém? Por quanto tempo? Silvia Schmidt escreveu: “Eu tive
que aceitar as minhas fragilidades, os meus limites, a minha condição de ser
mortal, de ser atingível, de ser perecível. Eu tive que aceitar que a VIDA
sempre continuaria com ou sem mim, e que o mundo em pouco tempo me esqueceria”
(Eu tive que aceitar). Ao nos fazer
lembrar daqueles que morreram, o dia de hoje também nos faz um questionamento:
quantos não são mais lembrados por nós, apesar de ainda estarem vivos entre
nós? Quantos idosos, solitários em suas casas ou nos asilos, não são lembrados
por seus filhos e netos?
Jó acabou de nos dizer: “Gostaria que minhas
palavras... fossem escritas e... cravadas na rocha para sempre!” (Jó 19,23-24).
Sim, em praticamente todos os túmulos encontramos gravados em placas de metal
ou no mármore os nomes de pessoas que faleceram. Mas o que Jó quis que fosse gravado
na rocha para sempre é uma certeza de fé que devemos ter, quando tomamos
consciência de que um dia vamos morrer: “Eu sei que o meu redentor está vivo e
que, por último, se levantará sobre o pó; e depois que tiverem destruído esta
minha pele, na minha carne verei a Deus” (Jó 19,25-26).
Enquanto nossa vida é feita de inúmeras
incertezas, a morte é nossa única certeza. Mas a fé nos convida a olharmos para
além da morte, a olharmos para o nosso Redentor, que está vivo, o Senhor Jesus,
que nos resgata e nos arranca das mãos da morte. Mesmo que a nossa pele seja
destruída na morte, nós veremos a Deus, e O veremos com o nosso corpo, que se
tornará um corpo glorificado (cf. Fl 3,20-21). Por isso, disse o salmista: “Espera
no Senhor e tem coragem, espera no Senhor!” (Sl 27,14).
A esperança à qual se refere o salmista
não é uma esperança ilusória, mas uma esperança que não nos decepciona, porque está
garantida pelo Espírito Santo, O qual ressuscitou Jesus e ressuscitará também a
cada um de nós. Desse modo, o apóstolo Paulo nos convida a não temermos a
morte, nem o momento do nosso encontro com Deus, pois já estamos reconciliados
com o Pai, por meio do sangue de seu Filho derramado na cruz. No momento da
nossa morte, Deus nos espera como Pai, mais do que como Juiz (cf. Rm 5,5-11).
Quando morre alguém da nossa família,
dizemos: “Eu perdi meu pai, minha filha, minha irmã, meu avô...” No entanto,
Jesus nos garante que Ele não perderá nenhum daqueles que o Pai confiou aos Seus
cuidados. A morte pode arrancar de nossas mãos pessoas que amamos, mas o Pai
confiou cada um de nós às mãos e aos cuidados de seu Filho Jesus Cristo que,
por ter vencido a morte, nos faz esta promessa: ‘Eu não vou perder nenhum
daqueles que o Pai me confiou. Além disso, vou ressuscitá-los no último dia’
(citação livre de Jo 6,39).
Antes que chegue o nosso “último dia”, precisamos
rever como temos vivido cada um dos nossos breves dias neste mundo. Dalai Lama
disse que o que mais chama a sua atenção é que as pessoas hoje, obcecadas em
ganhar dinheiro, “vivem como se nunca
fossem morrer, e morrem como se nunca tivessem vivido”. Já Cora Coralina nos
alerta sobre o perigo de morrermos antes da hora, ao escrever: “Eu sei que algum dia alguém terá que me
enterrar, mas eu não vou fazer isso comigo”. Da mesma forma, Albert Schweiter
disse: “A tragédia não é quando um ser
humano morre; a tragédia é aquilo que morre dentro da pessoa enquanto ela ainda
está viva”.
Refletir
sobre a morte, neste dia de finados, pode nos ajudar a valorizar cada momento
que vivemos na vida, sabendo que ele é único e nunca mais se repetirá. Assim,
da mesma forma como iniciamos esta reflexão citando palavras do livro A culpa é das estrelas, assim também
podemos terminá-la, mencionando uma parte do “Elogio Fúnebre” de Hazel Grace a
Augustus Waters, dois jovens atingidos pelo câncer: “Queria mais números do que
provavelmente vou ter, e, por Deus, queria mais números para o Augustus Waters
do que os que ele teve. Mas, Gus, meu amor, você não imagina o tamanho da minha
gratidão pelo nosso pequeno infinito. Eu não o trocaria por nada nesse mundo.
Você me deu uma eternidade dentro dos nossos dias numerados, e sou muito grata
por isso”. Sejamos gratos
pelos “pequenos infinitos” que vivemos na companhia daqueles que já partiram,
sabendo que um dia iremos reencontrá-los na eternidade de Deus, onde nossos
dias não serão mais numerados...
Pe. Paulo Cezar Mazzi
Pe. Paulo Cezar Mazzi