quinta-feira, 29 de novembro de 2012

ALGUÉM ESTÁ ESPERANDO POR MIM!



Missa do 1º. dom. do advento. Palavra de Deus: Jeremias 33,14-16; 1 Tessalonicenses 3,12 – 4,2; Lucas 21,25-28.34-36.

Você espera? Espera por algo? Espera por alguém em sua vida? Você tem esperança?
Na época dos campos de concentração, muitas pessoas enlouqueceram e tantas outras se suicidaram por não suportarem os terríveis sofrimentos a que foram expostas. Mas algumas delas conseguiram sobreviver a todo aquele sofrimento, sem enlouquecer e sem se desesperar, por um único motivo: elas tinham alguém esperando por elas fora do campo de concentração, e a esperança de reencontrar essa pessoa as ajudava a ter uma outra postura diante daquele sofrimento. 
 Advento significa esperar aquele que vem. Ao mesmo tempo em que recordamos a primeira vinda de Cristo (celebração do Natal), reafirmamos a nossa fé na sua segunda vinda (Parusia), conforme a sua promessa: “Sim, venho muito em breve!” (Ap 22,20). Aos cristãos, que já estavam se cansando de esperar, o autor da carta aos Hebreus escreveu: “Porque ainda um pouco, muito pouco tempo, e aquele que vem, chegará e ele não tardará” (Hb 10,37). A questão é saber se ainda estamos esperando por Cristo, e de que forma estamos esperando.
   “Tu vens! Tu vens! Eu já escuto os teus sinais!”, diz a música Anunciação, de Alceu Valença. Da mesma forma que a hora do parto é precedida por dores, a chegada de Cristo será precedida pela dor de toda a criação, pela angústia das nações e pelo medo dos homens. “Então eles verão o Filho do homem vindo numa nuvem com grande poder e glória” (Lc 21,27). Mas, por que o medo diante da vinda de Jesus? Porque, para muitos, Jesus se tornou como que um estranho. No começo, tinham intimidade com ele; mas depois se afastaram, se cansaram de esperar pelas suas promessas, abandonaram a prática da fé, e agora a vinda de Cristo soa para eles como uma ameaça.
   Jesus nos convida a esperá-lo não com medo, mas com amor; não angustiados, mas com o coração cheio de alegria: “Quando essas coisas começarem a acontecer, levantai-vos e erguei a cabeça, porque a vossa libertação está próxima” (Lc 21,28). Assim como algumas pessoas não se entregavam à loucura ou ao desespero, porque sabiam que havia alguém esperando por elas fora do campo de concentração, assim nós enfrentamos as turbulências do tempo presente em pé e com a cabeça erguida, porque sabemos em quem colocamos a nossa fé (cf. 2Tm 1,12); sabemos por quem esperamos (cf. Fl 3,20-21).
 Muitos, por terem deixado de crer e de esperar, colocaram o sentido da sua vida no consumismo, na comida (gula), na bebida (embriaguez), e se atormentam com inúmeras preocupações. São pessoas que constroem para si mesmas uma armadilha, na qual se aprisionam e dentro da qual sofrem, sem esperança de serem libertas. Por isso, Jesus nos convida a ficarmos atentos, a guardarmos a nossa fé e a revitalizarmos a nossa esperança por meio da oração.
“Ficai atentos e orai a todo momento” (Lc 21,36). Cada momento da nossa vida é oportunidade ou de nos aproximarmos do Senhor, ou de nos distanciarmos dele. A oração nos ajuda a perceber se estamos próximos ou distantes do Senhor. Quando nos colocamos em oração, nos colocamos na presença de Deus, e quem vive a cada dia na presença de Deus não tem porque temer a Sua chegada. Pelo contrário, a deseja com alegria, porque poderá vê-Lo face a face (cf. 1Cor 13,12).
         Jesus termina o evangelho de hoje dizendo: “... orai a todo momento... para ficardes de pé diante do Filho do homem” (Lc 21,36). Quem diariamente dobra seus joelhos na oração não se dobra, ou seja, não é derrubado pelas turbulências que enfrenta no mundo. Essa pessoa poderá ficar em pé diante do Senhor Jesus, em pé como alguém que não se deixou enlouquecer ou perder o sentido da vida diante do sofrimento, mas o superou porque sempre soube em quem depositou a sua fé e por quem esperou. 
Pe. Paulo Cezar Mazzi

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

SOB O SENHORIO DE DEUS


Missa de Cristo Rei – Palavra de Deus: Daniel 7,13-14; Apocalipse 1,5-8; João 18,33b-37.

Nos povos antigos, a figura do rei simbolizava proteção, defesa, garantia de vida e de paz. O rei era visto também como alguém que está acima de todos e que detém o poder sobre todos. Aos poucos, a imagem do rei foi associada a Deus. Ele é rei soberano, o Todo-poderoso, Aquele que nos protege, nos defende dos inimigos. Junto a Ele encontramos vida, encontramos paz.
O povo de Israel viveu muito tempo sem ter um rei, governado apenas pelo Senhor e por sua Palavra. Mas um dia Israel quis ter seu próprio rei humano, à semelhança de outros povos. E Deus, então, concluiu: “Israel não quer mais que eu reine sobre ele” (citação livre de 1Sm 8,7). A primeira questão, portanto, que se coloca para cada um de nós é esta: eu quero que Deus reine sobre mim? Eu vivo sob o senhorio de Deus?
A Palavra de Deus nos traz hoje duas afirmações a respeito do reinado, do senhorio de Deus: “Seu poder é um poder eterno... e seu reino, um reino que não se dissolverá” (Dn 7,14). “Vós firmastes vosso trono desde a origem, desde sempre, ó Senhor, vós existis” (Sl 93,2). Contudo, na prática, o que temos visto é o reinado dos bandidos e dos traficantes, que subjuga a todos por meio da violência, o reinado da injustiça e da corrupção, ou ainda o reinado de meia dúzia de especuladores financeiros, que manipulam os governantes dos países como se fossem fantoches. Em resumo, o que temos visto à nossa volta não é reinado de Deus, mas o reinado do mal.
            Não por acaso, o evangelho deste domingo de Cristo Rei nos apresenta o diálogo entre Jesus e Pilatos. As palavras de Pilatos a Jesus – “o teu povo e os sumos sacerdotes te entregaram a mim” (Jo 18,35 – grifo meu) – retratam a nossa realidade: o bem foi entregue às mãos do mal. Portanto, o mal é mais forte do que o bem. O reinado de Deus foi vencido pelo reinado do maligno. Quem, de fato, reina em nosso mundo é a injustiça, a mentira, a violência, a morte.
Diante da pretensão de Pilatos em ver Jesus como alguém que está subjugado à autoridade de um rei humano, Jesus esclarece: “O meu reino não é deste mundo” (Jo 18,36). Os reinos deste mundo se impõem pela força, pela violência, pelo dinheiro, pela mentira, pelo medo, pela ameaça etc. Mas Deus se impõe unicamente pela verdade. Por isso, Jesus declara diante de Pilatos: “Eu sou rei. Eu nasci e vim ao mundo para dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz” (Jo 18,36-38).
O único poder que nos liberta de todos os falsos poderes deste mundo é o poder da verdade. Se na vida de muitas pessoas hoje reina o vício, o comportamento autodestrutivo, a opressão, a culpa, a tristeza, a raiva etc., é porque essas pessoas ainda não tomaram consciência da verdade a respeito de si mesmas. Jesus é a verdade que nos liberta de todas as nossas mentiras, que quebra as correntes que ainda nos mantêm prisioneiros de coisas ou de pessoas que permitimos que reinassem sobre nós, na esperança de que nos fizessem felizes. 
            A festa de Cristo Rei nos recorda que existem dois reinos: o reino do bem e o reino do mal, o reino da verdade e o reino da mentira, o reino da graça e o reino do pecado. Qual deles reina em sua vida? Quem você quer hoje que reine sobre você? Sob o senhorio de quem você tem se colocado no seu dia a dia? O apóstolo João convida você a se colocar debaixo do senhorio de Jesus, “o soberano dos reis da terra”, Aquele “que nos ama” e “que por seu sangue nos libertou dos nossos pecados e que fez de nós um reino” (Ap 1,5), isto é, nos devolveu ao senhorio de Deus. Renda-se, portanto, Àquele “que é, que era e que vem, o todo-poderoso” (Ap 1,7-8).  
           Reina o Senhor! Toda a terra verá. Ele voltará com glória, força e poder. Povos e nações, todos afluirão ao ouvirem o som dos anjos anunciando, e então diante do Rei dos reis tremerão. Glória e majestade ao Rei, Cristo Jesus, Cordeiro Santo, Raiz de Davi que amou o mundo e abriu as portas do céu a todo aquele que Ele redimir. Renda-se! Ainda há tempo de retornar. Renda-se! Vida nova receberá . Renda-se! Abandone-se sem reservas! Renda-se! O Senhor disse e cumprirá. Renda-se! Toda lágrima enxugará. Renda-se! Àquele que era, que é e que há de vir! (da música Renda-se, Ministério Adoração e Vida).
 Pe. Paulo Cezar Mazzi

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

O ÚLTIMO CAPÍTULO


Missa do 33º. dom. comum. Palavra de Deus: Daniel 12,1-3; Hebreus 10,11-14.18; Marcos 13,24-32.

Assusta-nos a violência, seja por parte dos bandidos, seja por parte da polícia. Amedronta-nos a ousadia dos traficantes e o alastramento do consumo de droga em todas as classes sociais. Ameaçam-nos as doenças, sobretudo o câncer. Sentimo-nos cada vez mais impotentes diante do mal. A sensação que temos é que o mundo, como está hoje, não vai longe. A humanidade está acelerando o seu próprio fim, caminhando a passos largos para a sua própria destruição.
Há alguma luz no fim do túnel? O mesmo Deus, que pronunciou sua Palavra sobre o caos original do universo, chamando cada coisa à existência (cf. Gn 1), é o Deus a quem pertence a última palavra sobre o universo e sobre a vida de cada ser humano. E sua Palavra nos diz hoje que o tempo que estamos vivendo é um tempo de angústia, mas um tempo em que se opera a salvação de Deus em favor do seu povo (cf. Dn 12,1), salvação que também se manifestará aos que já morreram, proclamando a justiça de Deus, que destina para a vida eterna os que fizeram o bem, e para o sofrimento eterno os que fizeram o mal (cf. Dn 12,2).
Jesus é a palavra definitiva do Pai para a humanidade, palavra de justiça, de misericórdia, de vida e de salvação. Jesus nos fala da grande tribulação. Para ele, a grande tribulação foi a sua experiência de cruz, quando houve uma escuridão por toda a terra (cf. Mc 15,33). Nós também passamos por essa experiência, nas nossas tribulações, quando tudo fica escuro, quando as luzes da nossa esperança se apagam, quando experimentamos aquilo que se chama de “eclipse de Deus”, a hora em que nossa fé é duramente provada.
Mas Jesus nos diz que essa escuridão não é a palavra final sobre a história da humanidade, como se fosse a apagar das luzes no fim de um espetáculo. Em meio a essa escuridão, nós veremos Jesus “vindo nas nuvens com grande pode e glória” (Mc 13,26). “Eis que ele vem com as nuvens, e todos os olhos o verão, até mesmo os que o transpassaram” (Ap 1,7). O último capítulo da vida de cada ser humano, seja daquele que acreditou, bem como daquele que não chegou a conhecer Jesus e, ainda, daquele que o crucificou, isto é, que o rejeitou, é o seu encontro com Jesus Cristo e a verdade do seu Evangelho. Por isso, Jesus afirma: “O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não passarão” (Mc 13,31).      
 Tudo passa. Tudo passará. A única coisa que permanecerá é aquilo que em nós foi construído a partir da Palavra do nosso Deus. Tudo passa. Tudo passará. A única coisa que temos para nos agarrar é às promessas de Deus, contidas na sua Palavra, promessas que têm em Jesus o seu pleno cumprimento, como está escrito: “Todas as promessas de Deus encontraram nele o seu sim: por isso, é por ele que dizemos ‘Amém’ a Deus” (2Cor 1,20).
A palavra “amém” é o nome da estaca que os israelitas fincavam no chão para amarrar suas tendas, enquanto caminhavam pelo deserto, até chegarem à Terra Prometida. Enquanto caminhamos por este mundo passageiro, vivendo em meio a esse tempo de angústia, atravessando o período da grande tribulação, fincamos a estaca da nossa fé em Deus, esperando pelo cumprimento de cada promessa sua em favor do seu povo. Assim, dizemos com o salmista: “Meu destino está seguro em vossas mãos. Até meu corpo no repouso (da morte) está tranquilo, pois não haveis de me deixar entregue à morte... Vós me ensinais vosso caminho para a vida...” (Sl 16,5.9-11). 
Para um mundo que afunda no medo, no desespero e na instabilidade emocional, próprios da sua falta de fé, respondendo à angústia do nosso tempo com o consumismo desenfreado, com os ansiolíticos e os antidepressivos, com a bebida e a droga, com a agressividade cada vez mais descontrolada, com a banalização da vida e com o suicídio, sejamos um sinal da verdadeira fé, apontando para Jesus, o “amém” à promessa do Pai de julgar e de restaurar todas as coisas em seu Filho Jesus (cf. Ef 1,10).  
Pe. Paulo Cezar Mazzi 

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

O SEU MELHOR, NÃO AS SUAS SOBRAS



Missa do 32º. dom. comum - Palavra de Deus: 1Reis 17,10-16; Hebreus 9,24-28; Marcos 12,38-44.

“Jesus estava sentado no templo, diante do cofre das esmolas, e observava como a multidão depositava as suas moedas no cofre” (Mc 12,41). Jesus está no meio de nós, em nossos templos, em nossas igrejas, e observa como vivenciamos a nossa relação com Deus. Jesus hoje nos pergunta: Você vem aqui para receber algo de Deus ou para doar algo seu a Ele? Você faz suas orações com o objetivo de receber algo de Deus ou com o objetivo de tornar o seu coração mais disponível para Ele? Como você se coloca diante de Deus?     
O altar é o lugar da grande oferenda. No altar da cruz o Pai fez ao mundo a grande oferenda da salvação em seu Filho Jesus. No altar da cruz, o Filho se ofereceu ao Pai em favor da salvação de cada um de nós. No altar das nossas igrejas, o Espírito Santo atualiza para nós, em cada Eucaristia, a oferenda do Pai e do Filho. Diante do altar, cada um de nós é convidado a fazer de si mesmo uma oferenda ao Pai no mesmo Espírito com que Jesus se ofereceu: o sacrifício de si mesmo (cf. Hb 9,26).
A oferenda mais difícil de ser feita não é a oferenda do nosso dinheiro, mas da nossa fé: confiar que quando nos esquecemos de nós mesmos e nos dedicamos a servir a Deus, Ele proverá em todas as nossas necessidades, segundo a sua Palavra: “Eu nunca te deixarei, jamais te abandonarei” (Hb 13,5). Essa foi a experiência da viúva de Sarepta, desafiada em sua fé pelo profeta Elias a pegar o resto que tinha – um punhado de farinha e um pouco de azeite – preparar um pãozinho para o profeta e só depois ela e o filho comerem, confiando na palavra do Senhor: “a vasilha de farinha não acabará e a jarra de azeite não diminuirá” (1Rs 17,14).
Qual é o seu resto? Existe ainda um resto de fé em você, um resto de amor, um resto de esperança, um resto de tempo, um resto de boa vontade, um resto de força, um resto de saúde, um resto de dinheiro? A fé desafia você a oferecer esse resto a Deus, a utilizá-lo no serviço a Deus, confiando que nada haverá de lhe faltar, confiando que tudo aquilo que você entrega a Deus é por Ele transformado, mas tudo aquilo que você retém consigo fica como está, como um resto que uma hora vai acabar.
 Jesus faz uma comparação entre a oferta dos ricos e a oferta da pobre viúva: “Todos deram do que tinham de sobra, enquanto ela, na sua pobreza, ofereceu tudo aquilo que possuía para viver” (Mc 12,44). Pense na palavra “sobra”. No seu dia a dia tem sobrado tempo para você rezar? Tem sobrado tempo para você entrar em contato com a Palavra de Deus? Na sua semana tem sobrado tempo para você ajudar o próximo, para fazer algum trabalho voluntário? No seu mês, tem sobrado dinheiro para você fazer a oferta do seu dízimo a Deus? Se você for esperar sobrar, a resposta para todas essas perguntas é: “não”. Simplesmente não sobra!
A verdadeira oferta, aquela que agrada a Deus, aquela que transforma o seu coração, não nasce das suas sobras, mas da sua atitude em oferecer a Deus o seu melhor: a sua melhor hora de cada dia para se colocar na presença de Deus, para fazer a sua oração, para ler a Bíblia; a sua melhor hora na semana para ajudar alguém, para ser voluntário; o melhor do seu salário mensal para oferecer a Deus o seu dízimo como expressão da sua gratidão e da sua confiança de que Ele continuará a prover em todas as suas necessidades.
 Na presença de Jesus, a grande oferenda do Pai em favor da salvação do mundo, compreendemos que somos chamados a ser construtores das nossas comunidades e não consumidores das mesmas; somos chamados a fazer da nossa oferta uma oferta de nós mesmos a Deus e aos irmãos. Somos chamados também a rever a compreensão que temos do dízimo, entendendo que a oferta mensal do nosso dízimo não depende de termos dinheiro, mas de termos um coração convertido a Deus, um coração que agradecido pelos bens que todos os dias recebe, um coração que experimenta todos os dias a resposta providencial de Deus diante de cada necessidade, porque escolheu oferecer a Deus o seu melhor, não as suas sobras.  
Pe. Paulo Cezar Mazzi
  

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

DEIXAR-SE SANTIFICAR


Missa para o dia de todos os Santos. Palavra de Deus: Apocalipse 7,2-4.9-14; 1João 3,1-3; Mateus 5,1-12a.

Qual é o objetivo principal da nossa vida de fé? A resposta a essa pergunta varia de pessoa para pessoa. Uns estão buscando cura; outros, libertação de algum problema; uns querem resolver seus problemas afetivos; outros, seus problemas financeiros. Embora as razões que levam as pessoas a procurarem por Deus sejam inúmeras, o dia de todos os santos, que celebramos hoje, nos recorda que o objetivo principal da nossa vida de fé, da nossa relação com Deus, é a nossa santificação.
Muitas vezes ficamos frustrados com Deus porque os resultados que colhemos em nossa vida de fé não são aqueles que esperamos. Não entendemos por que isto ou aquilo nos acontece. Contudo, se a vontade de Deus é a nossa santificação, devemos confiar que Ele conduz todas as coisas segundo esse propósito. Aquilo que para nós não tem nenhum sentido pode estar acontecendo justamente em função da nossa santificação.
É assim que podemos entender o sentido da tribulação em nossa vida. Quando o livro do Apocalipse descreve os Santos, usa essas palavras: eles “vieram da grande tribulação. Lavaram e alvejaram suas vestes no sangue do Cordeiro” (Ap 7,14). É verdade que algumas das tribulações que passamos na vida são resultado da nossa obstinação em caminhar fora da vontade de Deus. Contudo, quando procuramos caminhar na fidelidade a Deus, vamos experimentar muitas tribulações, nas quais a nossa vida será mergulhada no sangue do Cordeiro, isto é, no sofrimento de Cristo na cruz pela sua fidelidade ao Pai. 
O que torna desafiadora a nossa santificação é que ela não está em função de nós mesmos, mas de Deus. Nós somos chamados a ser santos não em vista dos nossos próprios méritos, mas para que a vida de Deus se manifeste ao mundo por meio de nós. Se existe hoje uma perda de fé em Deus no coração de muitas pessoas é porque também existe uma perda de santidade em muitos de nós, que dizemos crer em Deus.
Jesus, no seu evangelho, nos propõe um caminho de santificação: as bem-aventuranças. Elas são atitudes de vida. A proposta de Jesus é que vivamos diariamente a nossa santificação por meio dessas atitudes: ser pobre em espírito, isto é, viver na absoluta dependência de Deus e na confiança em seu amor; ser aflito, no sentido de deixar-se afetar pelo sofrimento alheio; ser manso, aprendendo a lidar consigo mesmo e com os outros; ter fome e sede de justiça, no sentido de não desistir de ser uma pessoa justa e de trabalhar em favor daquilo que é justo; agir com misericórdia para consigo mesmo e para com os outros; ser puro de coração, tendo reta intenção e valorizando o bem que habita em cada pessoa; promover a paz, desarmando-se e ajudando os outros a se desarmarem no relacionamento cotidiano; suportar ser perseguido ou criticado por ser uma pessoa justa; enfim, suportar ser perseguido ou criticado por servir a Jesus e à causa do Evangelho. 
            O apóstolo João nos lembra que a nossa santificação é um processo que dura a vida toda e só vai ter a sua conclusão no momento da nossa ressurreição, do nosso encontro com o Senhor Jesus. Partimos daquilo que somos e caminhamos na direção daquilo que somos chamados a ser. O que nós somos como pessoa não é algo definitivo. Estamos em abertura, em processo, em transformação: a santificação tem por objetivo nos tornar semelhantes a Jesus, até que sejamos puros como ele é puro, até que sejamos como ele é: um verdadeiro sacramento de Deus.  
Quando professamos a nossa fé, dizemos: “Creio na comunhão dos santos”. Na liturgia desse dia de todos os santos, os cristãos na terra se unem aos cristãos no céu para proclamar que “a salvação pertence ao nosso Deus, que está sentado no trono, e ao Cordeiro” (Ap 7,10). Tanto a salvação quanto a santificação são pura graça de Deus, nunca méritos nossos. É Deus quem nos santifica, assim como é Deus quem nos salva por meio de seu Filho Jesus, o Cordeiro imolado. A nós cabe nos deixar conduzir pelo Espírito de Deus, nos deixar santificar por seu Filho Jesus, assumindo em nossa vida cotidiana os valores descritos nas bem-aventuranças que Jesus nos anunciou hoje.
                                                                                    Pe. Paulo Cezar Mazzi