Missa da Santíssima Trindade. Palavra de Deus: Provérbios 8,22-31; Romanos 5,1-5; João 16,12-15.
O nosso Deus é comunhão. Ele nunca
esteve só. Desde o início da criação, já se revela que Deus não estava sozinho
ao criar todas as coisas: “Quando preparava os céus, ali estava eu... Eu estava
ao seu lado como mestre-de-obras; eu era o seu encanto, dia após dia, brincando
o tempo todo em sua presença” (Pr 8,27.30). Essa presença misteriosa é a
presença do Filho: “Tudo foi feito por meio dele, e sem ele nada foi feito” (Jo
1,3); “Nele foram criadas todas as coisas, nos céus e na terra, as visíveis e
as invisíveis” (Cl 1,16). A solenidade da Santíssima Trindade nos ensina que o
Pai criou todas as coisas em seu Filho Jesus Cristo, e colocou em todas elas a
Sua vida, o Seu Espírito.
Da mesma forma como a obra da criação é
fruto da comunhão do Pai, do Filho e do Espírito Santo, a obra da redenção
também o é. Como afirmou o apóstolo Paulo, “estamos em paz com Deus, pela
mediação do Senhor nosso, Jesus Cristo” (Rm 5,1). Se o pecado havia nos
separado do Pai, o Filho realizou a obra da reconciliação, restabelecendo a
nossa comunhão com o Pai. Essa comunhão com o Pai não é estática, mas dinâmica:
ela se movimenta e sofre mudanças, conforme a nossa existência também se
movimenta e sofre mudanças. É por isso que o apóstolo Paulo afirma que o fato
de estarmos em paz com Deus – reconciliados em seu Filho Jesus Cristo – não
significa ter uma vida poupada de tribulações.
“A tribulação gera a constância” (Rm
5,3). Num primeiro momento, a tribulação provoca angústia, incerteza, dúvida,
porque nós a interpretamos como ausência de Deus. Mas a função da tribulação
não é desfazer a nossa fé em Deus, e sim nos educar para a constância: quando
estamos vivenciando uma situação de tribulação, devemos nos manter constantes
em nossa oração, em nossos compromissos com Deus. Muitos relacionamentos
terminaram e muitos compromissos foram abandonados porque as pessoas não
tiveram paciência em aprender a ser constantes. Essa constância não depende das
circunstâncias externas serem favoráveis, mas se alimenta da convicção interna
de que devemos prosseguir com nossos projetos, apesar das tribulações.
“A constância leva a uma virtude provada”
(Rm 5,4). Só quem permanece constante torna-se uma pessoa virtuosa, uma pessoa
que desenvolve o hábito de fazer o bem, independente das circunstâncias à sua volta
serem favoráveis ou não. Uma virtude provada significa a disposição em fazer o
bem ou caminhar segundo a verdade mesmo que isso lhe custe sofrimento. Essa “prova”
da virtude aparece no livro do Eclesiástico: “Meu filho, se te ofereces para servir
o Senhor, prepara-te para a prova. Endireita o teu coração e sê constante, não
te apavores no tempo da adversidade” (Eclo 2,1-2).
“A virtude provada desabrocha em
esperança” (Rm 5,4). Somente quem tem esperança suporta a imperfeição do
presente e não abandona o seu compromisso com o bem por causa das adversidades
do tempo presente. A nossa esperança não é uma esperança humana, isto é, uma
esperança que se apoia em garantias humanas, mas uma esperança nascida do amor
de Deus, sabendo que nada pode nos separar do amor do Pai manifestado em Cristo
Jesus (cf. Rm 8,38-39).
“A esperança não decepciona, porque o
amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi
dado” (Rm 5,5). O Espírito Santo está em nós como amor do Pai e do Filho. Ele
nos garante que o Pai completará a obra que começou em cada um de nós, até o
dia da vinda de seu Filho Jesus Cristo (cf. Fl 1,6). Esse amor do Pai e do Filho
sustenta a nossa esperança, como afirma o salmista: “Os olhos do Senhor estão
voltados sobre aqueles que esperam em seu amor... Senhor, que teu amor esteja
sobre nós, assim como está em ti nossa esperança!” (Sl 33,18.22).
Enfim, a nossa esperança está assentada
numa promessa de Jesus: “Quando vier o Espírito da Verdade, ele vos conduzirá à
plena verdade” (Jo 16,13). Nosso mundo está mergulhado na desorientação da
mentira, e essa desorientação está adoecendo cada vez mais a humanidade. Só
existe um caminho de cura para a doença da mentira, da desorientação: o
Espírito da Verdade. Só a Verdade cura. Essa Verdade não nos pode ser revelada
totalmente, mas aos poucos, na medida em que conseguimos compreendê-la e nos
deixar orientar por ela. “A verdade é um livro que nenhum de nós nunca leu até
o fim” (Pe. Thomás Halik). Isso significa que nenhuma pessoa ou religião pode
se apossar do Espírito da Verdade e presumir-se o seu único intérprete. Devemos
caminhar com humildade e pedir ao Espírito da Verdade que nos guie na noite
escura da nossa vida, até que possamos ver face a face (cf. 1Cor 13,12).
Oração: Espírito da Verdade, revela-nos
o amor do Pai e do Filho. Retira-nos do isolamento e da solidão, e desperta em nós
o desejo da comunhão. Que o Teu amor nos ensine a amar as pessoas como elas
são, e não como nós gostaríamos que elas fossem. Sustenta-nos com a Tua graça
em nossas tribulações, concedendo-nos constância, virtude comprovada e uma
esperança que não decepciona. Que a nossa esperança esteja em Ti da mesma forma
como o Teu amor está em nós. Neste mundo desorientado, adoecido e perdido, toma
cada um de nós em Tuas mãos e conduz-nos na luz da Tua verdade, até que
possamos contemplar o Pai e o Filho face a face. Amém.
Pe. Paulo Cezar Mazzi