sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025

EM QUEM OU NO QUE EU COLOCO A MINHA ESPERANÇA?

 Missa do 6º dom. comum. Palavra de Deus: Jeremias 17,5-8; 1Coríntios 15,12.16-20; Lucas 6,17.20-26.

 

            Quantos tipos de pessoa existem no mundo? Segundo a mentalidade bíblica, apenas dois: a pessoa que faz do ser humano o seu apoio e a pessoa que escolhe Deus como apoio. Embora sejam totalmente contrários um ao outro, os dois tipos nos revelam uma verdade: nenhum ser humano é autossuficiente. Toda pessoa precisa apoiar-se em algo ou em alguém maior e mais forte do que ela, para sobreviver. A questão, portanto, não é se nós precisamos ou não de um apoio na vida, mas quem ou o que escolhemos como apoio. Segundo o profeta Jeremias e o salmista, o apoio que escolhemos influencia o nosso presente; segundo Jesus, ele influencia também o nosso futuro.

            Para o profeta Jeremias, ou o ser humano se apoia num outro ser humano ou se apoia em Deus, e a diferença é perceptível: aquele que “faz consistir a sua força na carne humana” é um infeliz, e essa infelicidade está retratada numa imagem: um cardo seco no deserto, que prefere vegetar na secura e na solidão do deserto em que se encontra. Já a pessoa “cuja esperança é o Senhor, é como uma árvore plantada junto às águas” (Jr 17,7-8). Mesmo que as circunstâncias à sua volta não sejam favoráveis (calor, aridez, seca), “sua folhagem mantém-se verde” e ela “nunca deixa de dar frutos” (Jr 17,8).

            Fazer do Senhor nossa esperança é a única forma de não murcharmos, de não secarmos por dentro, principalmente quando as circunstâncias externas não são favoráveis. Fazer do Senhor nossa esperança significa direcionar nossas raízes para Ele, “fonte de água viva” (Jr 2,13). Essa verdade é confirmada pelo Salmo 1: a pessoa que se confia ao Senhor, isto é, que faz d’Ele o seu apoio, “é semelhante a uma árvore, que à beira da torrente está plantada; ela sempre dá seus frutos a seu tempo, e jamais as suas folhas irão murchar. Eis que tudo o que ele faz vai prosperar” (Sl 1,3). Raiz tem a ver com profundidade e também com “escondimento”. É o contrário da superficialidade e da exposição nas redes sociais, em busca de reconhecimento. 

            O que nos chama a atenção no Salmo 1 são as consequências para a vida da pessoa que não tem suas raízes em Deus: ela se torna como a “palha seca espalhada e dispersada pelo vento” (Sl 1,4). É a imagem da desorientação, de quem hoje está seguindo um formador de opinião, amanhã outro e depois de amanhã um outro ainda, e assim por diante. É um cego sendo guiado por outro cego, uma pessoa arrastada pelas circunstâncias, que, por não se responsabilizar por sua própria vida, vive culpando o mundo por sua infelicidade.

            Enquanto o profeta Jeremias e o salmista falam do presente, Jesus aponta para o futuro. Esperança tem a ver com futuro, e o nosso futuro é preparado a partir das escolhas que fazemos no presente. Se a pessoa que faz consistir sua esperança num outro ser humano e aquela que faz do Senhor sua esperança são totalmente contrapostas, Jesus revela essa contraposição a partir das seguintes expressões: “Felizes os pobres” / “Ai de vós, ricos”. “Felizes os que passam fome” / “Ai de vós que agora tendes fartura”; “Felizes os que choram” / “Ai de vós que agora rides”; “Felizes os que são odiados por minha causa” / “Ai de vós que sois elogiados”.  

            Ao fazer essa inversão da ideia de felicidade que nós temos, Jesus quer nos tornar conscientes da inversão de valores em que vivemos. Além disso, precisamos ter claro que o Evangelho não é um livro de autoajuda e Jesus não é um motivador que nos ensina como obter sucesso na vida. Todo pregador que asperge água benta sobre as injustiças sociais e se mantém distante das pessoas que sofrem por causa das desigualdades sociais é um falso profeta; é um pregador mundano, que distorce a Palavra de Deus para legitimar uma felicidade mundana e egoísta, que não só se mantém indiferente à dor de quem sofre, mas que é mantida justamente à custa dos que sofrem.  

            Trazendo para o nosso hoje o ensinamento de Jesus, fica claro que “Deus quer que tenhamos o necessário para viver dignamente; mas não quer que guardemos para nosso uso exclusivo os bens que pertencem a todos. Deus quer ver-nos caminhar sem privações e sem carências; mas não quer que adoremos o dinheiro e que sejamos escravos de coisas que são meramente acessórias. Deus quer que tenhamos conforto e bem-estar; mas não quer que ignoremos a miséria e a indigência em que vive uma parcela da humanidade” (Liturgia Dehonianos).  

            Assim como Jesus, o apóstolo Paulo também nos faz um alerta a respeito da nossa compreensão do que seja a esperança: “Se é para esta vida que pusemos a nossa esperança em Cristo, nós somos – de todos os homens – os mais dignos de compaixão” (1Cor 15,19). Fazer de Deus nossa esperança tendo como objetivo estar entre os “vencedores” deste mundo é assinar um atestado de ignorância em relação à Sagrada Escritura como um todo e, principalmente, em relação ao Evangelho. Tanto o Pai quanto o Filho escolheram estar entre os “perdedores” deste mundo, entre aqueles que o mercado exclui para garantir a sua fome insaciável de lucro, ainda que à custa da desumanização dos mais fracos.

Cada um de nós precisa decidir onde colocar suas raízes, ou seja, onde apoiar-se, no que depositar a sua esperança.

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi   

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