quinta-feira, 7 de novembro de 2024

QUAL BARULHO CHAMA A SUA ATENÇÃO?

 Missa do 32º dom. comum. Palavra de Deus: 1Reis 17,10-16; Hebreus 9,24-28; Marcos 12,38-44.

 

            A liturgia da Palavra nos coloca diante de duas viúvas. Elas representam toda pessoa que precisa ser amparada, protegida. Ao meu redor há alguma viúva? Há alguma pessoa desamparada e desprotegida, para a qual eu posso fazer algo? Na verdade, nossas cidades estão cheias de “viúvas”, de mulheres que lutam para sustentar, sozinhas, sua casa e seus filhos. Nossas igrejas também estão cheias de “viúvas”, de mulheres que vêm sozinhas às nossas celebrações: em suas casas, são as únicas que buscam a Deus.

            O profeta Elias, homem de Deus, encontra uma viúva em Sarepta. É uma época de grande fome, por falta de chuva. Elias está com fome e com sede, e pede ajuda à viúva. Esta, por sua vez, não tem praticamente nada em casa: “Só tenho um punhado de farinha numa vasilha e um pouco de azeite na jarra” (1Rs 17,12). Mas Elias provoca a fé desta viúva: “Primeiro, prepara-me com isso um pãozinho, e traze-o. Depois farás o mesmo para ti e teu filho. Porque assim fala o Senhor, Deus de Israel: ‘A vasilha de farinha não acabará e a jarra de azeite não diminuirá, até ao dia em que o Senhor enviar a chuva sobre a face da terra’” (1Rs 17,13-14). E, de fato, não faltou alimento na casa da viúva até o dia em que voltou a chover.

            Às vezes, Deus entra em nossa vida não como Aquele que dá, mas como Aquele que pede. Ele deseja saber se nós vivemos fechados em nós mesmos ou se, mesmo tendo quase nada, não perdemos a sensibilidade de socorrer alguém que esteja mais desamparado do que nós. Deus deseja saber se a nossa fé n’Ele se mantém também no tempo da fome, no tempo do pouco, do quase nada, confiando que “Ele dá alimento aos famintos... Ele ampara a viúva e o órfão” (Sl 146,7.9). Só experimenta o socorro de Deus quem, apesar das suas necessidades, é capaz de socorrer quem está mais necessitado do que ele mesmo.  

            Antes de chamar a nossa atenção para a oferta da viúva, no Evangelho, Jesus nos convida a observar e a tomar cuidado com determinados líderes religiosos que, ao invés de cuidar dos desamparados, estão em constante busca de reconhecimento para alimentar a própria vaidade e afirmar a sua posição de poder. São homens que se afastam da simplicidade, que alimentam um padrão de vida caro e que, quando se aproximam de alguma “viúva”, é em vista de explorá-la financeiramente. São homens que frequentam constantemente as casas das viúvas ricas e nunca encontram tempo para visitar uma viúva pobre. Quando falece um paroquiano pobre, por exemplo, nunca são encontrados para fazer a encomendação do corpo; já quando falece um paroquiano rico, antecipam-se em entrar em contato com a família e prestarem toda a assistência necessária. Quem sabe sua dedicação exemplar, embora hipócrita e interesseira, seja reconhecida e retribuída com uma oferta robusta na missa de sétimo dia?... Em relação a esse tipo de líder religioso, Jesus é muito claro: “Tomem cuidado!” (Mc 12,38); literalmente, “Afastem-se desse tipo de líder religioso!”.   

            Depois de denunciar o péssimo exemplo de alguns líderes religiosos, Jesus convida seus discípulos a aprenderem com a atitude de uma pobre viúva, que depositou no cofre das esmolas do Templo duas pequenas moedinhas. No texto grego, língua em que foram escritos os Evangelhos, as moedinhas se chamam “leptá”. O “leptá” era uma moeda de cobre, a menor e mais insignificante das moedas judaicas. Detalhe: o cofre das esmolas era feito de bronze; quando as moedas caíam dentro faziam barulho. Ora, as ofertas dos ricos faziam muito barulho, pois eles “depositavam grandes quantias” (Mc 12,41)! Quão insignificante deve ter sido o “barulho” das duas moedinhas da viúva!

            Quem é que faz barulho nas nossas comunidades, ao executar um trabalho voluntário ou ao efetuar uma oferta? Não nos esqueçamos de que, quanto mais vazia uma carroça, mais barulho ela faz. Além disso, nossos ouvidos são como os ouvidos de Jesus, capazes de ouvir o insignificante barulho da “insignificante” presença das “viúvas” em nossas comunidades? Sabemos reconhecer e agradecer a doação do dízimo tanto de quem dá “muito” como de quem dá “pouco”? A aplicação do dízimo tem como prioridade as melhorias na Matriz e nas capelas, ou o conforto da casa paroquial ou, pior ainda, as frequentes saídas do pároco para descansar?   

            Para terminar, não nos esqueçamos de que a viúva do Evangelho é a imagem do próprio Jesus: ela “ofereceu tudo aquilo que possuía para viver” (Mc 12,44); da mesma forma, Ele oferecerá sua vida na cruz, pela salvação de todo ser humano. Em outras palavras, Jesus se reconheceu numa pobre viúva e não nos líderes religiosos do seu tempo. Qualquer semelhança com a nossa época não é mera coincidência.

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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