Missa do 14. dom. comum. Palavra de Deus: Zacarias 9,9-10; Romanos 8,9.11-13; Mateus 11,25-30.
“Uns confiam em carros, outros em
cavalos; nós, porém, invocamos o nome do Senhor nosso Deus. Eles se inclinam e
caem; nós, porém, nos mantemos em pé” (Sl 20,8-9). As palavras desse salmo
nasceram num contexto de luta, de guerra, de combate. Cada um de nós tem sua
luta, seu combate; primeiro, no âmbito interno – temos que lutar contra nosso
instinto de acomodação, nossas tentações e aquelas atitudes que fazem mal a nós
mesmos; além disso, temos lutas ou combates externos – nossa sobrevivência em
um País injusto, desigual e violento, nossa convivência com pessoas más, além do
combate espiritual contra o maligno. Então, se temos lutas e combates dentro e
também fora de nós, a quais armas estamos recorrendo para lutar? Em outras
palavras, em quem ou no quê estamos colocando nossa confiança, para sairmos
vencedores em nossas lutas?
Para vencer as lutas da vida, “uns
confiam em carros, outros em cavalos”. Carros e cavalos eram usados nas
guerras, na época do salmista. Hoje, poderíamos reler este salmo dizendo: uns
confiam no dinheiro, outros na força das armas; uns confiam na ciência e na
tecnologia, outros na disseminação de mentiras e na desinformação; uns confiam
que só um mal maior pode destruir um mal menor, outros deixaram de lutar e abandonaram
qualquer sonho, meta ou ideal que exija deles luta, esforço, determinação. O
fato é que perante a vida ninguém de nós é um expectador que está sentado na
arquibancada, assistindo a uma disputa. Pelo contrário, todos nós estamos em
campo, na luta entre o bem e o mal, entre a vida e a morte, e precisamos nos
lembrar de que a única condição para vencermos essa luta é ter ciência de que “nenhum
rei se salva com exército numeroso, o valente não se livra por sua grande força”
(Sl 33,16); “não é pela força que o homem triunfa” (1Sm 2,9c).
O profeta Zacarias convida a cidade
de Jerusalém, dominada por um império estrangeiro, a exultar de alegria porque
o seu verdadeiro rei vem para salvá-la. Ele não chega montado em um cavalo, mas
em um jumento; ele não vem revestido de soberba e arrogância, mas de humildade.
Sem armas humanas, ele eliminará os carros e os cavalos de guerra, quebrará o
arco do guerreiro inimigo e estabelecerá a paz. Se fizermos memória da entrada
de Jesus em Jerusalém (cf. Mt 21,1-11; Mc 11,1-11; Lc 19,28-38; Jo 12,12-16),
saberemos que esse rei humilde é Jesus. Nós, seus discípulos, precisamos nos
perguntar sobre quais cavalos temos montado e em quais armas temos pego para enfrentar
a luta da vida de cada dia. Como nós esperamos que a paz seja estabelecida em
nosso mundo, quando estamos tão cheios de agressividade e de intolerância
conosco mesmos, com as pessoas, com Deus e com a própria vida?
O apóstolo Paulo nos recorda de que
só existem dois tipos de pessoas na face da terra: os que se apoiam na força da
carne (a ilusão da capacidade humana, fechada em seus interesses egoístas) e os
que se apoiam na força do espírito (os que, apoiados no Espírito de Deus, lidam
com as adversidades de maneira a crescerem, amadurecerem e se tornarem seres
humanos melhores). Aqui vale a palavra que Deus dirigiu a Zorobabel, diante do
desafio de reconstruir o Templo de Jerusalém: “Não pela força, não pelo poder,
mas sim por meu Espírito” (Zc 4,6). Se nos convencermos dessa verdade, nossa
forma de nos posicionar diante das adversidades que sempre aparecerão em nosso caminho
de vida será diferente.
A luta cansa, o combate suga as
nossas forças. Muitos desistiram de lutar e se entregaram à derrota, ao
conformismo, mas nosso Senhor hoje nos dirige sua Palavra: “Vinde a mim todos
vós que estais cansados e fatigados sob o peso dos vossos fardos, e eu vos
darei descanso. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso
e humilde de coração, e vós encontrareis descanso. Pois o meu jugo é suave e o
meu fardo é leve” (Mt 11,28-30). Na época de Jesus, o fardo eram as 613 normas
e regras que os fariseus haviam criado, cuja observância diária era exigida
para se estar com a consciência tranquila perante Deus. Jesus resumiu tudo ao
mandamento do amor (cf. Mt 22,34-40), o qual se traduz concretamente na
seguinte atitude: “Tudo aquilo que você quer que as pessoas lhe façam, faça
você para elas, pois nisso se resume toda a Sagrada Escritura” (citação livre
de Mt 7,12).
A proposta de Jesus poderia ser
distorcida por alguns como uma “vida sem fardo”, uma religião sem exigência
alguma, uma fé reduzida a um caminho sem qualquer obstáculo, uma Bíblia
corrompida em um livro de autoajuda, com indicações precisas para se alcançar
uma vida bem sucedida, sem lugar para lutas ou combates e, sobretudo, sem risco
algum de sermos vencidos pelos embates da vida. No entanto, não existe vida sem
fardo, justamente porque o sentido da vida está em lidar com o fardo que nos é
próprio carregar, entendendo-o como a tarefa que só pode ser realizada por nós e
por mais ninguém.
A libertação da sobrecarga que Jesus
nos propõe se refere às cobranças internas ou externas que nada têm a ver com a
nossa verdadeira missão neste mundo. Por isso, quando nos sentimos esgotados e
começamos a adoecer física e/ou emocionalmente, precisamos nos perguntar se os
fardos que estamos carregando são realmente nossa responsabilidade fazê-lo, ou
se, por ventura, há pessoas folgadas à nossa volta que estão jogando seus
próprios fardos sobre nós com a nossa permissão. Ter ciência e saber respeitar
os próprios limites é condição necessária para não permitirmos que sejam jogados
sobre as nossas costas fardos que não são nossa responsabilidade carregar.
Enfim, uma última palavra sobre o
fardo. Há muitos anos atrás, num determinado país, um repórter fotografou uma
menina carregando sobre suas costas o irmão menor. Ele perguntou à menina: “Ele não é pesado?”, ao que a menina respondeu: “Não, é meu irmão”. Que resposta você
daria à pessoa que lhe perguntasse se seu casamento é pesado, se seu pai ou sua
mãe é pesado(a), se seu trabalho é pesado, se lidar com suas lutas interiores é
pesado, se sua cruz é pesada?
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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