Missa do 16º dom. comum. Palavra de Deus: Sabedoria 12,13.16-19; Romanos 8,26-27; Mateus 13,24-30.36-43.
Cultivar: sem essa atitude, no campo
da nossa vida só cresce mato. Se queremos colher bons frutos, precisamos
cultivá-los. O bem só cresce se for cultivado. Por outro lado, o mal não
precisa sê-lo; basta que não se cultive o bem, para que o mal encontre espaço
para nascer, crescer e tomar conta do terreno. Então, como está o cultivo dos
seus relacionamentos? Como está o cultivo da sua fé, da sua esperança, do seu
amor? É preciso repetir: coisas boas só nascem se forem cultivadas; já as coisas
ruins nascem simplesmente por falta do cultivo das coisas boas.
Quando olhamos o campo do mundo, é
nítido enxergar nele a presença do joio: egoísmo, maldade, indiferença,
desumanidade, mentira, traição, preguiça, má vontade etc. Por que há tanto joio
no mundo atual? Porque muitas pessoas deixaram de cultivar o trigo. “O que me
preocupa não é o grito dos maus, mas o silêncio dos bons” (Martin Luther King).
O mal cresce na exata proporção em que as pessoas desistem de cultivar o bem. Se
há muita coisa ruim no campo da nossa vida, muito provavelmente é porque
desistimos de cultivar atitudes que fariam germinar o trigo, o bem, a vida, a
saúde emocional, a paz e a alegria de conviver juntos.
A parábola do joio tem
propositalmente seu acento no mal. Jesus quer nos tornar conscientes de que,
por mais boa vontade que tenhamos e por mais esforço que façamos em cultivar o
bem, o mal sempre encontrará espaço para surgir. “‘Senhor, não semeaste boa semente no teu campo? Donde veio então o joio?’ O dono respondeu: ‘Foi algum inimigo que fez isso’” (Mt 13,27-28). Nós temos um inimigo: ele
não é uma pessoa de carne e osso, mas um ser espiritual – o diabo. Ele trabalha
incessantemente para semear joio no campo da nossa vida: inimizade, ciúme,
inveja, maldade, desânimo, pessimismo etc. Seu maior interesse não é necessariamente
que nos tornemos pessoas más, mas que simplesmente deixemos de cultivar o bem.
“Enquanto
todos dormiam, veio seu inimigo, semeou joio no
meio do trigo, e foi embora” (Mt 13,25). Todos nós precisamos dormir. Ninguém
consegue vigiar 24 horas por dia. Mas o problema é que esse “dormir” hoje se
desdobrou em distração, em excesso de trabalho, em esgotamento, em preocupação
excessiva com o supérfluo, enquanto se descuida do essencial. Enquanto os pais “dormem”,
o inimigo semeia joio no coração dos filhos; enquanto o marido ou a esposa “dorme”,
o inimigo semeia joio no campo da relação conjugal; enquanto a Igreja “dorme”,
o inimigo semeia joio no coração de muitos fiéis; enquanto passamos horas navegando
no mundo virtual, o inimigo semeia joio no campo da nossa vida real...
Mais
uma vez é preciso ficar claro: a parábola do joio quer nos tornar conscientes
de que, enquanto estivermos no campo do mundo, teremos que lidar com a
realidade do mal. Não existem pessoas que sejam totalmente trigo, nem
totalmente joio, assim como não existem ambientes (casa, trabalho, igreja etc.)
onde só haja joio ou trigo. Se a nossa tendência é querer “arrancar” de uma vez
por todas o mal do nosso meio, Jesus nos alerta que isso nunca funcionará: “‘Queres
que vamos arrancar o joio?’ O dono respondeu: ‘Não!
pode acontecer que, arrancando o joio, arranqueis também o trigo. Deixai crescer um e outro até a colheita!’” (Mt 13,28-30). Enquanto o
ser humano estiver vivo, poderá escolher entre cultivar-se como joio ou como
trigo. Ninguém está definitivamente perdido, assim como ninguém está
definitivamente salvo. Até a hora da colheita, podemos mudar, seja para melhor,
seja para pior.
O
foco da explicação que Jesus nos dá, a respeito da parábola do joio, está na
colheita. Ela inicia o momento do julgamento. Julgar significa separar. O Pai
entregou ao Filho o poder de julgar (cf. Jo 5,22). Justamente porque Jesus
conhece o ser humano por dentro (cf. Jo 2,25), Ele pode separar o joio do trigo.
A primeira coisa de que precisamos tomar consciência é de que haverá uma
colheita no fim da nossa existência: todo ser humano será “recolhido” por Deus
na hora da sua morte. Após ser recolhido, será julgado, conforme as suas
atitudes (cf. 2Cor 5,10; Jo 5,28-29). No momento do julgamento, ocorrerá
primeiro a condenação dos que fizeram o mal: “o Filho do Homem enviará os seus
anjos,
e eles retirarão do seu Reino todos os que fazem outros pecar e os que praticam o mal; e depois os lançarão na fornalha de fogo” (Mt 13,41-42). Depois disso, o
trigo será recolhido no celeiro de Deus: “Então os justos brilharão como o sol no Reino de seu Pai”, da mesma forma como o trigo maduro brilha nos
campos.
A
certeza a respeito do julgamento, da separação entre joio e trigo, deve nos
tornar conscientes de que nada ficará impune, porque Deus não é indiferente às
injustiças praticadas no mundo em que vivemos. Todo ser humano se confrontará
com a sua própria consciência e com as consequências das suas atitudes. Quem escolheu
cultivar-se como joio, colherá as consequências de tal cultivo, assim como quem
escolheu cultivar-se como trigo. E ainda que alguns buscassem fugir à responsabilidade
de cultivar-se, é preciso lembrar-se dessa verdade: “O homem não é produto das
suas circunstâncias, mas das suas decisões” (Victor Frankl). O que nos “define”
como joio ou trigo não são as coisas que nos acontecem, mas o que decidimos
fazer com aquilo que nos afeta.
Confiemos
o cultivo diário de nós mesmos ao Espírito Santo. Ele “vem em socorro da nossa
fraqueza” (Rm 8,26); Ele “intercede por nós” segundo os desígnios de Deus para
que nos tornemos o trigo que fomos chamados a ser. Não entendamos a “demora” de
Deus em intervir na história humana e eliminar definitivamente o mal como
indiferença diante do sofrimento e das injustiças humanas, mas como “indulgência”:
“A tua força é princípio da tua justiça, e o teu domínio
sobre todos
te faz para com todos indulgente... Dominando tua
própria força,
julgas com clemência... Assim procedendo, ensinaste
ao teu povo
que o justo deve ser humano” (Sb 12,16.18.19). A
nossa sede de justiça não deve nos desumanizar, mas nos encher da esperança de
vale a pena retomar a cada dia o nosso cultivo como trigo, não obstante o joio
que cresce à nossa volta.
Pe.
Paulo Cezar Mazzi
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