sexta-feira, 14 de janeiro de 2022

PROCURA-SE PELA ALEGRIA

 Missa do 2. dom. comum. Palavra de Deus: Isaías 62,1-5; 1Coríntios 12,4-11; João 2,1-11.

 

Onde encontrar alegria? Toda propaganda de consumo é feita a partir da imagem de uma pessoa que está alegre. A mensagem é simples e direta: consumir tal coisa ou obter tal produto produz alegria na pessoa. No entanto, essa alegria costuma durar cerca de uma semana, depois do produto adquirido. Como essa alegria é efêmera, passageira, a roda do consumo precisa continuar a girar, para que também as pessoas continuem a sentir alegria por um pouco mais de tempo.  

Além de nós entendermos erroneamente que a alegria está condicionada ao consumo – só sente alegria quem pode consumir –, também costumamos condicioná-la aos fatores externos, como se só fosse possível sentir alegria quando as coisas externas estão a nosso favor: se há doença, ou dificuldade financeira, conflitos, desencontros no relacionamento ou problemas a resolver, tudo isso nos impede de estarmos alegres. No entanto, a alegria não é algo que surge em nós de fora para dentro, e sim de dentro para fora; ela não depende de que tudo esteja bem ao meu redor, mas sim da maneira como eu escolhi lidar com as situações adversas do dia a dia.

A falta da alegria está retratada no Evangelho de hoje pela falta de vinho. Na Sagrada Escritura, o vinho é a imagem da alegria, mas não de uma alegria mundana, material, e sim espiritual: é a alegria do coração humano que se sente em comunhão com Deus, fonte perene de alegria. Essa comunhão do coração humano com Deus, por sua vez, aparece retratada no profeta Isaías na imagem de um casamento. Após a experiência do exílio na Babilônia, a cidade de Jerusalém se sentia deserta e abandonada, como uma mulher não amada pelo seu marido. Deus, esposo do seu povo, se dirige a esta cidade prometendo mudar sua situação: ela será chamada “Minha predileta (querida)”, “Bem-Casada”, porque o Senhor, seu esposo, não descansará até que nela sejam restabelecidas a justiça e a salvação. E o profeta conclui: “Como a noiva é a alegria do noivo, assim também tu és a alegria de teu Deus” (Is 62,5).

Isaías empresta a imagem do casamento não para dizer que as pessoas que se casam são alegres e as que não se casam ou se separam não o são. O que ele quer afirmar é que Deus ama cada pessoa na face da terra e trabalha para que na vida dela haja justiça e salvação, condições que possibilitam a verdadeira alegria. No mundo em que vivemos, é cada vez maior o número de pessoas que se sentem rejeitadas, não-amadas, abandonadas, ignoradas, sem importância para quem quer que seja. Pois bem. É justamente a essas pessoas que somos enviados a levar o amor de Deus, a certeza de que o bem de cada uma delas é a alegria do coração de Deus.  

Na festa de casamento, onde estavam Jesus, sua mãe e seus discípulos, acabou o vinho, e Maria foi interceder junto ao seu Filho: “Eles não têm mais vinho” (Jo 2,3). O que é esta falta de vinho hoje? Maria hoje está dizendo a Jesus, a respeito de tantos relacionamentos: Eles não têm mais amor; a paixão que sentiam um pelo outro não amadureceu e não se tornou amor verdadeiro; eles não têm mais fidelidade, respeito e consideração um pelo outro... A respeito de tantas crianças, Maria está dizendo a Jesus: Elas não têm mais alguém que lhes transmita a fé, que lhes coloque limites, que lhes ensine o respeito para com o próximo; não têm uma figura paterna ou materna que seja uma referência de amor verdadeiro... A respeito de tantas pessoas, Maria está dizendo a Jesus: elas não têm mais saúde; não têm um emprego digno e um salário justo; elas não têm meios de sustentar suas famílias... A respeito de tantos idosos, Maria está dizendo: Eles não são mais lembrados, visitados e cuidados por seus familiares; não têm mais gosto em viver; não têm mais fé, esperança e alegria... A respeito de tantos jovens, Maria diz a Jesus: Eles não têm senso de limite e de responsabilidade; não têm direção e sentido de vida; eles têm bens materiais, mas não têm uma razão para viver; não têm uma referência de espiritualidade dentro de casa; estão expostos ao consumismo, às drogas, ao desemprego e à violência...  

A falta de vinho, de alegria, de condições de vida, de sentido de vida é gritante no mundo de hoje. E o único que pode nos trazer o vinho de Deus, a alegria de Deus, é Jesus, esposo da nossa alma, esposo da Igreja. Por isso Maria nos orienta: “Façam tudo o que ele disser a vocês” (Jo 2,5). Seja qual for a situação que estejamos vivendo, Jesus sempre tem uma palavra a nos dizer, uma orientação a nos dar. Quando nos falta o vinho da alegria, precisamos primeiramente reconhecer essa falta; depois, verificar qual é a nossa parcela de responsabilidade para o vinho ter acabado; depois, encher nossas talhas de água sabendo que, se somente Jesus pode converter água em vinho, é tarefa nossa encher as talhas. Isso significa que não podemos reclamar da falta de alegria quando nós mesmos temos atitudes que a afastam da nossa vida.

            Eis a surpresa: “Todo mundo serve primeiro o vinho melhor e, quando os convidados já estão embriagados, serve o vinho menos bom. Mas tu guardaste o vinho melhor até agora!” (Jo 2,11). O vinho melhor, a alegria mais profunda e abundante, surgiu depois da falta, depois da crise, depois da tribulação, depois da angústia... A vida pode tornar-se muito melhor depois que enfrentamos uma determinada “falta de vinho”. Tudo depende de como lidamos com as situações difíceis. Tudo depende de como entendemos a alegria. Por isso, voltemos à pergunta inicial: Onde nós podemos encontrar alegria? Ela normalmente nos é dada em forma de sementes; depende do nosso cultivo. Ela não é encontrada no barulho, na agitação, muito menos na fuga de si mesmo(a), mas está dentro de cada um de nós. Ela não nasce apenas depois que temos um encontro profundo com Deus, mas na própria busca que fazemos d’Ele: “Alegre-se o coração dos que procuram o Senhor!” (Sl 105,3).

            Invoquemos o Espírito Santo. Ele é o vinho novo que Deus deseja derramar nos odres do nosso coração, através de seu Filho Jesus... “Então vem, Espírito Santo, com tudo o que tens e tudo o que És... Ó, vem, Espírito de Deus! Do alto de tua casa traz vinho novo aos odres meus!” (Vinho novo).

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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