Missa de
Natal. Palavra de Deus: Isaías 9,1-6; Tito 2,11-14; Lucas 2,1-14; João
1,1-5.9-14.
A Sagrada
Escritura nos ensina que “Deus é Espírito” (Jo 4,24), mas o ser humano é “carne”
(Is 40,6). Enquanto “Espírito” significa vida, força e imortalidade, “carne”
significa aquilo que perece, envelhece, adoece e morre. “Carne” significa aquilo
que apodrece, que se corrompe, que se estraga. Nós somos “carne”! Apesar dessa
verdade nua e crua, o nascimento de Jesus Cristo foi anunciado por João com
essas palavras: “E toda carne verá a salvação que vem de Deus” (Lc 3,6). Por
isso, Santo Agostinho afirmou, em sua homilia de Natal: “Por tua causa Deus se
fez homem. Estarias morto para sempre, se ele não tivesse nascido no tempo.
Jamais te libertarias da carne do pecado, se ele não tivesse assumido uma carne
semelhante à do pecado. Estarias condenado a uma eterna miséria, se não fosse a
sua misericórdia. Não voltarias à vida, se ele não tivesse vindo ao encontro da
tua morte. Terias perecido, se ele não te socorresse. Estarias perdido, se ele
não viesse salvar-te”.
Natal é a festa da “Encarnação”,
pois “a Palavra se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,14). Jesus, Palavra
viva do Pai, por meio da qual tudo foi criado – “Tudo foi feito por ela” (Jo
1,3) – assumiu a nossa “carne”, isto é, a nossa condição humana. Ele assumiu a
nossa carne, justamente para redimi-la, para libertá-la da estreiteza do seu
egoísmo, da cegueira do seu horizonte fechado, do círculo vicioso do seu pecado
e de todo tipo de opressão e injustiça a que o ser humano está exposto neste mundo.
É por isso que o profeta Isaías proclama: “(...) para os que habitavam nas
sombras da morte, uma luz resplandeceu” (Is 9,1), e o Evangelho afirma a
respeito do nascimento de Jesus: “Era a luz da verdade que, vindo ao mundo,
ilumina todo ser humano” (Jo 1,9).
Quando os anjos anunciam aos
pastores: “Hoje... nasceu para nós um salvador, que é o Cristo Senhor” (Lc 2,11), estão afirmando que Jesus nasceu como salvador de todo ser humano. Ele
não nasceu apenas para Maria e José, como também não nasceu apenas para o povo
judeu; ele nasceu para todo ser humano, porque “a graça de Deus se manifestou,
trazendo a salvação para todos os homens” (Tt 2,11), isto é, para todas as
pessoas. Onde quer que exista uma “carne”, isto é, um ser humano ferido,
violentado, injustiçado, fragilizado, desrespeitado, entristecido, sem
esperança, é ali que Jesus quer se fazer presente, assumindo toda a sua
situação de sofrimento para libertá-lo, redimi-lo, salvá-lo.
Se
queremos celebrar verdadeiramente o Natal, precisamos nos lembrar deste
conselho de Deus: “Não se esconda daquele que é sua própria carne” (Is 58,7),
ou seja, não ignore o sofrimento daquele que é humano como você; não se torne
indiferente às pessoas à sua volta; não se desumanize, pois o Filho de Deus se
fez pessoa humana e veio devolver humanidade ao nosso coração, ferido pelo
ódio, adoecido pelo rancor, endurecido pela maldade que há em nosso mundo. “Não
esconder-se da sua própria carne” também significa olhar com coragem e
sinceridade para si mesmo, para aquilo que em você é frágil, imperfeito,
doente, deformado pelo mal, e acolher-se, reconciliar-se com sua própria
história, dialogar com sua própria verdade, admitir sua absoluta necessidade de
ser redimido, liberto, salvo.
A
manjedoura onde Jesus foi colocado após seu nascimento, “pois não havia lugar
para eles na hospedaria” (Lc 2,7), nos remete para tantas situações da nossa
vida onde o ideal foi ocupado pelo real. Quantos ideais, quantos sonhos e
quantos projetos nossos foram desfeitos, modificados, atropelados por
acontecimentos que viraram a nossa vida do avesso? E, no entanto, Deus, ao
permitir que Seu Filho nascesse naquela situação de total desamparo, está nos
dizendo que Ele está conosco em toda e qualquer situação. Embora nem sempre consigamos
perceber, Ele está nos acompanhando nas nossas noites escuras, conduzindo os
acontecimentos de modo que tudo concorra para o nosso bem, segundo o Seu amor e
seu desígnio de salvação para conosco. Portanto, justamente ali, onde pensamos “não
haver lugar” para a vida nascer, para a esperança nos visitar, para a nossa
situação se transformar, é ali que Deus nos surpreende com a sua Providência e
nos revela que a luz sempre encontra uma forma de vencer as trevas.
Porque
Jesus Cristo é “a luz da verdade que, vindo ao mundo, ilumina todo ser humano”
(Jo 1,9), nesta noite de Natal nós suplicamos por todas as pessoas e situações
em nosso mundo que precisam ser iluminadas pela verdade da encarnação, para que
cada ser humano experimente em sua própria “carne”, em sua própria condição de
finitude, de fragilidade, de sofrimento e de morte, a graça da redenção, a
certeza de ser infinitamente amado pelo Pai que enviou seu Filho para nos
salvar.
ORAÇÃO:
“Para os que habitavam nas sombras da morte, uma luz resplandeceu” (Is 9,1).
Deus da luz, em Ti não há trevas! Desce a nós, Pai das luzes! Visita-nos em
nossas trevas. Visita especialmente todas as pessoas que se encontram na sombra
escura da bebida e das drogas, do desemprego, da violência, da angústia, da
depressão ou da falta de sentido para a vida. “Botas de tropa de assalto,
trajes manchados de sangue, tudo será queimado e devorado pelas chamas” (Is
9,4). Deus forte, Príncipe da paz, desarma o coração daqueles que promovem
guerras; livra nosso mundo da violência do tráfico e do trânsito, da
intolerância e da perseguição política e religiosa. Derruba os muros que
levantamos e ensina-nos a construir pontes em nossas famílias, igrejas e ambientes
de trabalho. “Nasceu para nós um salvador, que é o Cristo Senhor” (Lc 2,11).
Que a luz do Teu nascimento, Senhor Jesus, resplandeça sobre toda consciência e
todo coração, de modo que nenhuma pessoa seja tomada pelo desespero, mas experimente
a graça da Tua libertação e salvação. “E a Palavra se fez carne e habitou entre
nós” (Jo 1,14). Habita em nós, Senhor Jesus! Toca em nossa carne, abraça nossa
fragilidade mais profunda, reconcilia-nos com a nossa própria humanidade e liberta-nos
de nós mesmos! Amém!
Pe. Paulo Cezar
Mazzi
Eu sou Padre Edson da Diocese de Guaxupé-MG, da cidade de Guaxupé mesmo, da Paróquia São José Operário. Quero te desejar um Feliz Natal. Parabéns pelas suas homilias. Eu amo! Obrigado!
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