sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

NÃO BASTA A CHUVA DA GRAÇA DE DEUS; AS SEMENTES DOS NOSSOS ESFORÇOS SÃO ABSOLUTAMENTE NECESSÁRIAS


Missa do 3º dom. do advento. Palavra de Deus: Isaías 35,1-6a.10; Tiago 5,7-10; Mateus 11,2-11.

Na vida precisamos ter expectativas: expectativas quanto à nossa saúde, aos nossos relacionamentos, à nossa vida profissional, ao nosso futuro, à nossa vida de fé etc. É justamente porque tem expectativa quanto à chegada da chuva que o agricultor, mesmo no tempo da estiagem, prepara a terra, lançando nela a semente. Ele tem esperança! Igualmente nós, cristãos, devemos esperar o Senhor Jesus cheios de expectativa, cheios de esperança, trabalhando o chão da nossa vida e lançando nele as sementes que fomos chamados a lançar, isto é, cultivando em nós e no mundo à nossa volta valores como o bem, a verdade, a justiça, o amor etc.
Mas há um problema quando se fala de expectativas: elas podem não se cumprir; elas podem até mesmo nos decepcionar, seja porque são expectativas irrealistas, exageradas, seja porque a vida nos responde de uma outra forma em relação àquilo que esperamos. Quando isso acontece, passamos por um momento de crise, de questionamento, de revisão das nossas expectativas, das nossas esperanças. Assim estava João Batista. Ele havia preparado a humanidade para a chegada do Messias, do Ungido do Senhor, prometido a Israel. No entanto, quando Jesus começou seu ministério, a forma de agir era tão diferente das expectativas de João que ele ficou confuso e chegou a duvidar de que Jesus era realmente o Messias esperado.
Eis, portanto, a pergunta de João a Jesus:  “És tu, aquele que há de vir, ou devemos esperar um outro?” (Mt 11,3). Nós já nos fizemos essa pergunta muitas vezes. Diante do fim de um relacionamento, de uma doença, de um acidente, de uma perda irreparável, de uma tragédia, de um problema enorme ou de um sofrimento intenso, nós começamos a questionar a nós mesmos, a vida e o próprio Deus. Onde foi que nós erramos? Será que não rezamos como deveríamos ter rezado? Será que Deus realmente existe? Se existe, será que realmente vê e se importa com o que acontece conosco? Será que estamos na Igreja certa, na religião certa? Ainda existe sentido em esperar por Deus, por seu socorro, por sua intervenção, por sua salvação?
Depois de responder à pergunta de João, Jesus lhe fez uma observação que é importantíssima também para nós: “Feliz aquele que não se escandaliza por causa de mim!” (Mt 11,6). Feliz aquele que não desistiu de buscar Deus só porque Ele frustrou suas expectativas. Feliz aquele que não jogou Deus fora quando sua imagem a respeito d’Ele se quebrou totalmente. Feliz aquele que não reduziu Deus ao tamanho das suas expectativas humanas, mas permitiu que Ele alargasse o seu horizonte de compreensão por meio de uma sofrida crise. Feliz aquele que desistiu de enquadrar Deus nos seus esquemas humanos e permanece aberto a algo novo que Ele está lhe dizendo, mostrando, ensinando. Feliz aquele que, mesmo não vendo uma nuvem no céu, continua a cultivar o chão da sua vida com a semente da esperança, crendo que, mais cedo ou mais tarde, Deus derramará a chuva da sua resposta à suplica que lhe foi feita.
Eis, portanto, o modelo de expectativa, o modelo de esperança, que o apóstolo Tiago coloca diante de nós: “Ficai firmes até à vinda do Senhor. Vede o agricultor: ele espera o precioso fruto da terra e fica firme até cair a chuva do outono ou da primavera. Também vós, ficai firmes e fortalecei vossos corações, porque a vinda do Senhor está próxima” (Tg 5,7-8). Quem é movido por uma expectativa ou por uma esperança autêntica não fica de braços cruzados, esperando que a vida mude por si mesma, mas se levanta todos os dias e cultiva o chão da sua existência com as sementes daquilo que ele espera colher como resultado dos seus esforços.
São Tiago está nos lembrando de algo importante e óbvio, mas que nós às vezes nos esquecemos: do céu só cai chuva, nunca semente! Se a chuva cai, mas não semeamos nada no solo da nossa existência, a única coisa que crescerá ali é mato. Contudo, se quando a chuva cai, encontra nosso solo trabalhado, semeado, “grávido” de sementes, então os frutos dos nossos esforços, o resultado da nossa esperança ativa (e não passiva!) começam a brotar como fruto de uma parceria entre a graça de Deus e o nosso esforço humano.
Geração estranha a nossa! Queremos colher o que não cultivamos! Queremos colher resultados, mudanças, transformações, mas sem o esforço do trabalho, do cultivo diário, de atitudes firmes e constantes que possibilitem que essas coisas aconteçam. Além disso, às vezes nos recusamos a cultivar atitudes diferentes em nossa vida simplesmente porque não existem garantias de que aquilo valerá a pena, de que realmente vai chover e o fruto do nosso esforço será recompensado. Por isso, o profeta Isaías insiste conosco: “Fortalecei as mãos enfraquecidas e firmai os joelhos debilitados... Criai ânimo, não tenhais medo! Vede, é vosso Deus, é a vingança que vem, é a recompensa de Deus; é ele que vem para vos salvar” (Is 35,3-4). Por isso, o próprio Jesus nos questiona a partir da pessoa de João Batista: “O que fostes ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento? O que fostes ver? Um homem vestido com roupas finas? Mas os que vestem roupas finas estão nos palácios dos reis” (Mt 11,7-8).
Que tipo de pessoas somos: caniços agitados pelo vento, pessoas que se quebram diante de qualquer pancada que levam da vida? Somos pessoas inconstantes, que começam um caminho de autoconhecimento, de mudança, de enfrentamento de uma situação, mas que acabam por abandoná-lo porque as coisas não estão saindo do jeito que esperamos ou planejamos? Que tipo de pessoas somos: delicadas como roupas finas, pessoas que se rasgam diante dos puxões que o mundo nos dá? Somos pessoas sem consistência interna, que ao invés de acolherem a vida como ela é, vivem se refugiando dentro do palácio do seu melindre, do seu capricho, dos seus sonhos infantis de uma vida idealizada, perfeita?
Jesus nos convida a sermos maduros, firmes e realistas como João Batista o foi; um homem que, como nós, teve suas crises, lidou com a frustração de algumas de suas expectativas, mas permaneceu aberto para aquilo que a vida queria lhe ensinar. Não nos cabe controlar o céu e fazer chover na hora em que entendemos ser necessária; nos cabe, sim, cultivar-nos, cultivar o chão da nossa existência, cultivar o solo do mundo à nossa volta, lançando nele as melhores sementes de que somos capazes de lançar, colaborando para o surgimento de uma humanidade nova, de homens e mulheres enraizados em Deus, firmados na esperança que não decepciona, na expectativa que se alimenta da verdade da sua Palavra.  

Oração: Deus Pai, tua Palavra hoje me convida a cultivar-me, a cultivar valores que possibilitem o surgimento de mudanças em minha vida, o surgimento de transformações necessárias para o bem da humanidade. Preciso de sabedoria para rever minhas expectativas, para aprender a esperar confiantemente pela chuva da tua graça no chão árido da minha existência. O Senhor me convida ao trabalho diário de lançar as sementes das transformações que eu desejo, mantendo-me firme nas atitudes que possibilitarão tais transformações, sabendo que elas são fruto de uma parceria entre as sementes dos meus esforços e a chuva da tua graça. Concede-me a força do teu Espírito, para que eu não quebre diante dos ventos contrários e não retroceda diante das dificuldades, mas continue a dar os passos necessários em vista da meta que o Senhor me chama a alcançar em Cristo Jesus, meu Salvador. Amém!

Pe. Paulo Cezar Mazzi


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