sexta-feira, 21 de julho de 2017

A INSUBSTITUÍVEL E NECESSÁRIA TAREFA DE CULTIVAR-SE

Missa do 16º. dom. comum. Palavra de Deus: Sabedoria 12,13.16-19; Romanos 8,26-27; Mateus 13,24-30.36-43.

            Como anda sua tolerância em relação ao mal? Como anda sua capacidade de conviver com realidades afetadas pelo mal sem com isso tornar-se uma pessoa má? Enquanto algumas pessoas gostariam de encontrar uma forma de separar todo tipo de maldade e eliminá-lo para sempre da sociedade humana, outras acabam por abandonar o cultivo do bem em si mesmas e se deixam corromper pelo mal, quase que como uma forma de sobrevivência no mundo moderno.
            Jesus, como qualquer ser humano, teve que se deparar com o problema do mal na sociedade humana. Não só isso. Ele certamente foi questionado por muitas pessoas a respeito da existência do mal. Como é possível acreditar na existência de um Deus que é bondade, amor, justiça e verdade, se convivemos todos os dias com situações marcadas pela maldade, pelo ódio, pela injustiça e pela mentira? Como continuar acreditando que vale a pena cultivar trigo em nós e à nossa volta, quando o joio parece crescer sempre mais e fazer-se prevalecer sobre o trigo, neste vasto campo que é o mundo?
Eis uma verdade que precisa ser considerada, se quisermos entender por que o joio tem crescido tanto no mundo de hoje, ao mesmo tempo em que o trigo parece diminuir cada vez mais: “Se todo mal que chegasse a nós fosse interrompido em nós por meio do perdão, o mal no mundo já teria diminuído bastante” (Pe. Sidney Fabril). Se toda semente de joio que o mundo joga em nós fosse barrada pelo cultivo do trigo em nós mesmos, o joio que há no mundo já teria diminuído, e muito.
            A primeira orientação que Jesus nos dá nesta parábola é no sentido de não sermos ingênuos, mas realistas: o mal é uma realidade e está presente como possibilidade dentro do coração de todo ser humano. Portanto, em todos os ambientes, em todas as áreas profissionais, em todas as igrejas e religiões, em todos os povos, raças e culturas, é possível encontrar pessoas que, por diferentes motivos, deixaram de cultivar o bem e permitiram que a erva daninha do mal tomasse espaço no terreno da sua alma. Portanto, não sejamos ingênuos: quem acha que não corre o risco de se tornar uma pessoa infiel, desonesta, injusta ou corrupta, ainda não conhece bem os espaços da sua alma.
            A segunda orientação que Jesus nos dá diz respeito à nossa tarefa de nos cultivar como trigo, mesmo tendo que conviver diariamente com o joio. Por mais joio que possa haver no meio do trigo, ele continua a crescer e amadurecer como trigo. Contudo, se é assim na natureza, nem sempre é assim conosco, seres humanos. É muito comum encontrar pessoas que sempre justificam seus erros, sua má conduta, sua vontade fraca, seu vício, sua consciência corrompida etc., colocando a culpa nos outros (família ou sociedade). Sem dúvida que todos nós somos influenciados pelo meio em que vivemos, mas somos nós que escolhemos qual semente vamos cultivar diariamente no solo da nossa vida.
            A grande verdade da parábola do joio e do trigo é esta: nós somos os únicos responsáveis por aquilo que cultivamos dentro de nós. O cultivo de si mesmo é uma tarefa que cabe à própria pessoa e não pode ser terceirizada. O cultivo da interioridade da esposa é tarefa dela, não do marido, e vive-versa. O cultivo da interioridade dos filhos é tarefa deles, não dos pais, e vice-versa. O cultivo da interioridade dos alunos é tarefa deles mesmos, não dos professores, e vice-versa... E por falar em cultivo, o maior desafio hoje em dia é despertar nas pessoas o desejo de quererem cultivar-se como trigo.
            Nós não nascemos prontos e ainda não estamos prontos; a cada dia estamos nos fazendo, nos cultivando. Até o momento da morte temos a possibilidade de escolher nos cultivar como joio (pessoas que se deixam corromper) ou como trigo (pessoas que lutam para se manter íntegras). Para aqueles entre nós que estão cansados de cultivar-se, talvez desanimados por terem que conviver diariamente com o joio, é importante lembrar que ficar reclamando do joio que existe à nossa volta não nos leva a lugar nenhum. “Importa cuidar do trigo e não perder a paz por causa do joio”, nos ensina o Papa Francisco. Importa investir nossas energias no cuidado e no cultivo do trigo e não gastá-la numa contínua reclamação estéril por causa do joio.
            Eis um fato concreto. Perguntado sobre qual será sua reação se em agosto a Câmara dos Deputados rejeitar a acusação de corrupção passiva de Michel Temer, o Procurador Rodrigo Janot declarou que vai aceitar a decisão da Câmara “com a maior naturalidade possível. Eu fiz o meu trabalho. Cada um faz o seu” (Folha de Londrina, 18/07/2017). O trabalho do trigo é amadurecer como trigo e não se degenerar em joio. Cada um faz o seu trabalho. Cada um cultiva dentro de si aquilo que considera como valor. Algumas pessoas insistem em degenerar a sociedade humana, semeando o joio da corrupção por onde passam. Outras insistem em construir uma sociedade menos corrompida, menos degenerada nos seus valores. Cada um de nós tem que continuar o seu trabalho de cultivar-se como trigo, apesar do joio que cresce à nossa volta.
            Um cuidado que devemos ter, diante dessa parábola contada e explicada por Jesus, é não confundir a proibição de se arrancar prematuramente o joio com o risco de danificar o trigo como sinônimo de relativismo, no sentido de achar que tanto faz cultivar-se como joio ou como trigo; no fim da vida, seremos todos colhidos por Deus, como se fôssemos todos “farinha do mesmo saco”. A parábola afirma justamente o contrário: no momento da colheita, Deus separará o joio do trigo, e destruirá o joio no fogo. Portanto, a necessidade de distinguir o joio do trigo no nosso dia a dia continua não somente válida como também necessária para a nossa salvação. No momento da colheita, seremos questionados a respeito do nosso esforço em buscar nossa integridade, do nosso esforço em não nos corrompermos como pessoas.
            Embora a tarefa de cultivar-se seja exigente, abracemo-la com alegria e esperança, na certeza de que não estamos sozinhos nesse cultivo: o Espírito Santo vem em socorro da nossa fraqueza (cf. Rm 8,26). Além disso, a parábola deixa claro que Deus acredita no trigo que há em nós. Ora, se Ele acredita, nós também precisamos acreditar! Nosso humano, apesar de frágil, guarda em si o potencial de cultivar-se, um potencial talvez confundido ou até mesmo sufocado pelo joio e que, por isso mesmo, precisa ser resgatado, exercitado, acreditado. Enfim, que cada um de nós tenha consciência do joio e do trigo que carrega dentro de si. Sejamos humanos conosco mesmos e com os outros, não desanimando por causa do joio, mas renovando a cada dia a decisão de nos cultivar como trigo.

Pe. Paulo Cezar Mazzi 

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