Missa
do 25º. dom. comum. Palavra de Deus: Sabedoria 2,12.17-20; Tiago 3,16 – 4,3;
Marcos 9,30-37.
Quem de nós não se emocionou com a foto
de Aylam Kurdi, um menino sírio de três anos, cujo corpo encontrado na praia se
tornou símbolo da crise imigratória no mundo? Quem de nós não sentiu o desejo
de fazer com ele o que Jesus acabou de fazer diante dos discípulos: pegar uma
criança, colocá-la no meio deles e abraçá-la?
Abraçar uma criança pode não ser
difícil para nós, mas o problema é o que a criança significava na cultura em
que Jesus vivia. Ela não era nada. Era ignorada, desprezada, não levada em
conta. Você abraçaria alguém que, aos olhos do mundo atual, nada vale? Até que
ponto nós também já não nos acostumamos a ignorar, desprezar e não levar em
conta tantas pessoas que cruzam o nosso caminho, se é que as enxergamos?
O que levou Jesus a colocar no meio dos
discípulos uma pessoa “insignificante” aos olhos da sociedade do seu tempo e
abraçá-la? Tudo começou com uma rejeição: os discípulos não quiseram se tornar
conscientes do sofrimento pelo qual Jesus iria ter que passar (v.31). Além de
não quererem entender o que Jesus disse e de ficarem com medo de perguntar –
justamente por medo de se tornarem conscientes de tal sofrimento –, os
discípulos mudaram de assunto e passaram a conversar sobre algo que realmente
os preocupava e que importava para eles: ‘Quem de nós é o maior, o mais
importante, o primeiro?’
Quem é o ‘maior’ na sua empresa ou na
sua sala? Quem é o ‘maior’ na classe do seu filho? Quem é ‘maior’ na cidade? Quem
é o ‘maior’ em nossa Paróquia ou Diocese? Bom, mas por que essa preocupação com
“quem é o maior”? Deixemos que o apóstolo Tiago responda: “Onde há inveja e
rivalidade, aí estão as desordens... De onde vêm as guerras? De onde vêm as
brigas entre vós? Não vêm, justamente, das paixões que estão em conflito dentro
de vós?” (3,16; 4,1).
A preocupação em querer ser o maior é
fruto de algo muito mal resolvido dentro de nós e que se chama ‘sentimento de
inferioridade’. Quanto mais eu me sinto inferior – e se eu me sinto inferior é
porque estou me comparando com os outros, os quais eu considero ‘superiores’ a
mim – mais eu preciso compensar esse sentimento buscando formas de me sentir
superior. Dessa forma, nós nos afastamos da nossa criança interior – da
simplicidade, da bondade e da espontaneidade – e passamos a viver atormentados por
uma única preocupação: eu preciso me destacar; se não for pela inteligência,
que seja pela esperteza; se não for pelo corpo, que seja pelo modelo do carro;
se não for pelo trabalho, que seja pelo dinheiro etc.
O resultado disso é uma sociedade
doente, um ambiente de trabalho doente, uma Igreja doente, porque nós estamos
doentes. Existe cura para essa doença chamada ‘mania de grandeza’? Se você
quiser se livrar dessa preocupação inútil em querer ser o maior, faça uma
visita ao Hospital do Câncer de Barretos, sobretudo na ala infantil. Quando
você vir a quantidade de crianças com câncer e os diversos tipos de câncer que
existem, se dará conta do quanto é inútil a maioria das suas preocupações e do
quanto você tem muito mais do que precisa pra viver e ser feliz.
Nós, padres, também precisamos desse ‘choque
terapêutico’, nós que vivemos atormentados em sermos os maiores: Quem atrai
mais multidões? Quem tem mais “amigos” ou “seguidores” no Face? Quem tem o
Dízimo mais alto da Diocese? Quem faz a melhor homilia? Quem brilha mais aos
olhos do bispo? (E a preocupação inconfessável em muitos: Quem será o próximo a
“sair” como bispo?) Nós também somos doentes, assim como também somos em boa
parte responsáveis pelas “desordens” em nossa Igreja. Nós sabemos muito bem o
quanto de inveja e rivalidade existem entre nós.
Ao abraçar uma pessoa “insignificante”
para a sociedade de seu tempo, Jesus deixou claro que o mais importante aos
olhos de Deus – e que deve ser visto como o mais importante para o nosso
cuidado pastoral – é o mais fraco, o mais rejeitado, o mais exposto à violência
ou à dor no mundo atual. O abraço de Jesus nesta criança nos lembra uma
pergunta: “Você já abraçou seu filho hoje?” Poderíamos desdobrá-la em outras
perguntas: Você já abraçou a sua criança interior hoje? Você já abraçou a sua
fraqueza, a sua ferida, o seu sentimento de inferioridade hoje? Você já abraçou
um ‘estranho’ hoje, aquele para quem ninguém liga?
Dois pequenos lembretes: 1) O descaso com
os “pequenos” da sociedade se volta contra nós em forma de violência. 2) Muito
bom que seu filho seja o “primeiro” da classe. Mas ele também é o “primeiro” a
ser justo, a se preocupar com o próximo, a ser honesto, a não mentir, a cuidar
do meio ambiente, a ajudar os que estão à sua volta?
Pe. Paulo Cezar Mazzi
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