Missa de São Pedro e São Paulo. Palavra de Deus: Atos 12,1-11;
2Timóteo 4,6-8.17-18; Mt 16,13-19.
A época em que
vivemos é marcada pela rejeição a toda e qualquer instituição. Rejeita-se instituições
como o Estado, a Família, a Escola, a Igreja etc. Por que essa rejeição a toda
e qualquer instituição? Porque as pessoas hoje querem fazer suas escolhas e
tomar suas decisões segundo aquilo que lhes convém, e não segundo aquilo que
determinada instituição afirma ser o certo, o correto. Um exemplo concreto: um jovem,
homossexual assumido, que quando criança foi católico, e depois, ao entrar para
a adolescência/juventude passou por algumas igrejas evangélicas, há tempos
atrás postou no seu Face uma espécie
de “convocação” para os demais jovens, no sentido de criarem uma religião sem
igreja; literalmente, como ele mesmo expressou, “uma religião sem doutrina”.
Nós poderíamos
comparar as instituições às raízes de uma árvore. A geração de hoje rejeita raízes
porque não admite ficar “agarrada” a isso ou àquilo: ela quer seguir pela vida
como uma folha livremente levada pelo vento. Mas aqui se esconde uma ironia, ou
mesmo uma contradição: a mesma pessoa que não admite ser “conduzida” por uma
instituição, aceita ser “conduzida”, para não dizer “arrastada”, pelo vento das
circunstâncias do momento. Além disso, quem corta a ligação com as suas raízes
acaba tombando diante de qualquer vento contrário. O resultado é o que estamos
vendo hoje: pessoas fragilizadas, desorientadas, sem referência, que facilmente
tombam diante de qualquer vento que lhes sopre contrário.
Ao comparar Pedro
a uma pedra e ao afirmar: “sobre esta pedra construirei a minha Igreja” (Mt
16,18), Jesus deixou claro que todos nós precisamos de um alicerce sobre o qual
construir a nossa vida; todos nós precisamos de raízes a partir das quais possamos
enfrentar os ventos do mundo que sopram contrários a nós. Mas aqui se esconde
um problema: a pedra-Igreja, fundada por Jesus sobre os apóstolos, se
pulverizou ao longo dos tempos em inúmeros fragmentos, de modo que hoje as
pessoas que procuram por uma raiz, por um fundamento para a sua fé, têm
inúmeras opções, e o que faz com que elas se agreguem a esta ou àquela igreja não
consiste na pergunta: “Qual é a Igreja de Jesus Cristo?”, mas sim na pergunta: “Em
qual igreja eu me sinto melhor?”
Além desse subjetivismo/individualismo
das pessoas, existe a questão da perda de “consistência” da pedra-Igreja. Ela perdeu
boa parte da sua credibilidade quando acreditou poder garantir a sua autoridade
por meio de títulos, de vestimentas e de alguns sinais externos que, ao invés
de fazer com que a Igreja se revestisse de Cristo (cf. Gl 3,27), fez com que
ela se travestisse de farisaísmo (cf. Mt 23,5-7), desfigurando em si mesma a
imagem do seu Fundador, que disse: “Eu estou no meio de vós como aquele que
serve” (Lc 22,27). Mais ainda: para resistir aos ataques do mundo, pareceu mais
prudente à Igreja adotar como raiz a lei e não a graça, a letra e não o
Espírito, de modo que ela passou a ser mais identificada como discípula dos
fariseus do que como discípula de Jesus Cristo, que embora não tenha vindo
abolir a Lei (cf. Mt 5,17), deixou claro que a Lei está a serviço da comunhão
das pessoas com o Pai e não a comunhão das pessoas com o Pai a serviço da Lei
(cf. Mc 2,27; Mt 23). Neste sentido, o Papa Francisco aponta para a
desproporção em que nas nossas pregações
falamos mais da lei que da graça, mais de Igreja que de Jesus Cristo, mais do
Papa que da Palavra de Deus (A Alegria do Evangelho, n.38).
Não há como negar que as
atitudes do Papa Francisco têm devolvido credibilidade e autoridade moral à nossa
Igreja. Além de insistir que “o verdadeiro poder é o serviço”, Francisco afirma
que “há normas ou preceitos eclesiais que podem ter sido muito eficazes noutras
épocas, mas já não têm a mesma força educativa como canais de vida” (A Alegria do Evangelho, n.43). Noutras
palavras, diz Francisco: não podemos “tornar
pesada a vida dos fiéis”, nem “transformar a nossa religião numa escravidão”.
Meditemos sobre o símbolo
das chaves que Jesus entrega a Pedro: “Eu te darei as chaves do reino dos céus”
(Mt 16,19). As chaves podem abrir ou fechar. Segundo o Papa Francisco, a Igreja
deve ser “uma mãe de coração aberto... uma Igreja com as portas abertas (para)
sair em direção aos outros para chegar às periferias humanas... A Igreja é
chamada a ser sempre a casa aberta do Pai... Todos devem participar de alguma
forma da vida eclesial, todos podem fazer parte da comunidade, e sem sequer as
portas dos sacramentos se deveriam fechar por uma razão qualquer” (A Alegria do Evangelho, ns.46 e 47).
Se hoje estamos reunidos
para celebrar as duas colunas da nossa Igreja – São Pedro e São Paulo – não é
tanto para nos colocarmos na defesa desta Igreja enquanto instituição, mas
muito mais para que cada um de nós se reconheça como chamado a ser uma “pedra
viva” (1Pd 2,5) na Igreja que Jesus fundou sobre os apóstolos, no seio da qual
Ele é a pedra principal (cf. Ef 2,20). Na medida em que cada um de nós decide
viver com fidelidade sua vocação de construtor da Igreja de Jesus Cristo como
espaço de acolhida, de cura, de reorientação, de resgate, de conversão etc.,
nós nos tornaremos um sinal vivo que aponta para Jesus Cristo, a rocha
inabalável sobre a qual todo ser humano pode agarrar-se e eleger como verdadeiro
alicerce para a sua vida, neste mundo onde “tudo que é sólido desmancha no ar”
(Marshall Berman).
Pe. Paulo Cezar Mazzi