sábado, 21 de junho de 2014

O MEDO HUMANO E O CONSENTIMENTO DIVINO

Missa do 12º. dom. comum. Palavra de Deus: Jr 20,10-13; Rm 5,12-15; Mt 10,26-33.

            No Evangelho de hoje, ouvimos Jesus dizer por três vezes “Não tenham medo!” (Mt 10,26.28.31). O medo é um dos nossos instintos mais primitivos: temos necessidade de nos defender de algo ou de alguém que nos ameaça. Do quê ou de quem você sente medo hoje? Tememos pela nossa saúde, pelo nosso emprego, pela nossa sobrevivência. Tememos pelos nossos filhos e pela nossa família. Tememos pela nossa vida, ameaçada pelos bandidos e pela violência sempre crescente. Tememos pelo nosso futuro. Tememos perder coisas e pessoas. Tememos pela nossa velhice. Tememos, enfim, pela morte.
Ao mesmo tempo em que Jesus nos ensina que grande parte do nosso medo provém da nossa falta de confiança em Deus, ele nos faz um alerta: ‘Se é para ter medo, tenham medo de perder a integridade de vocês, o caráter, os valores, a honra, a honestidade, a vergonha na cara; tenham medo de ser tornarem pessoas permissivas, corruptas, adúlteras, imorais, injustas, indiferentes ao sofrimento alheio; numa palavra, tenham medo de perder a alma, a salvação de vocês’.
            Por que Jesus tocou na questão do medo? Porque, ao enviar seus discípulos em missão, para anunciarem o Evangelho a todas as pessoas, alertou-os: “Eis que eu vos envio como cordeiros para o meio dos lobos” (Mt 10,16). Essa é a condição de todo verdadeiro cristão no mundo, desde a época de Jesus até hoje: ser um cordeiro no meio de lobos; ser uma pessoa íntegra num ambiente corrupto; ser uma pessoa justa numa sociedade injusta; ser uma pessoa solidária num mundo marcado pela indiferença para com o sofrimento alheio.
            Embora em alguns países, sobretudo aqueles dominados pelo fundamentalismo islâmico, os cristãos são perseguidos e mortos apenas por se declararem cristãos, nos países do Ocidente você não incomoda ninguém por ser cristão(ã) – isso é uma opção individual, à qual você tem direito – mas você incomoda quando, por ser cristão(ã), se opõe àquilo que é injusto na sociedade. É quando você, em nome do Evangelho, precisa colocar o dedo na ferida, dar nomes aos bois e denunciar ou questionar o que há de injusto no ambiente em que se encontra é que passa a sentir na pele a ameaça dos lobos com quem convive no dia a dia, inclusive se dando conta de que alguns que você considerava cordeiros eram, na verdade, lobos em pele de cordeiro.
            Sentindo-se ameaçado por pessoas que viviam “espalhando o medo em redor” (Jr 20,10), o profeta Jeremias colocou a sua causa nas mãos de Deus, Aquele que conhece o coração de cada homem e sabe distinguir o justo do injusto, e proclamou a sua fé, dizendo: “(...) o Senhor está ao meu lado como forte guerreiro; por isso, os que me perseguem cairão vencidos” (Jr 20,11). Da mesma forma, Jesus nos convida a confiar no Pai: se nenhum pardal, pássaro sem valor algum no mercado, cai por terra, isto é, morre “sem o consentimento do vosso Pai”, tenham a confiança de que o Pai não cuidará de vós, que “valeis” para Ele “mais do que muitos pardais”! (cf. Mt 10,29.31).
            Existem situações reais que nos ameaçam? Sim! Primeiro, porque a vida humana vale hoje tanto quanto os pardais, ou seja, nada; mata-se por qualquer motivo e também sem nenhum motivo. Segundo, porque o mundo odeia quem procura viver como Jesus viveu (cf. Jo 15,18). Contudo, nós precisamos colocar o nosso medo em diálogo com a palavra-chave que Jesus usou para falar da nossa confiança no cuidado que o Pai tem para conosco: CONSENTIMENTO. O Pai conhece tudo da minha vida; sabe até quantos fios de cabelo eu tenho na cabeça. Nada me atingirá, sem o consentimento d’Ele. Essa confiança foi expressa pelo Papa Francisco, quando um repórter lhe perguntou a respeito da sua segurança: ele disse que não sente medo, que sabe que ninguém morre de véspera (entrevista ao Fantástico em 29/07/2013).
            A palavra “consentimento” diz claramente que a nossa vida está nas mãos do Pai, não nas mãos dos homens, assim como a vida do cordeiro está nas mãos do seu Pastor e não nas garras dos lobos que o rodeiam. Por isso, Jesus diz: “Não tenhais medo dos que matam o corpo, mas não podem matar a alma!” (Mt 10,28). A questão, porém, é saber se nós acreditamos que temos uma alma e que ela não pode ser tocada pelas mãos de nenhum ser humano. A questão é saber se nós nos preocupamos em cuidar da nossa alma da mesma forma como nos preocupamos em cuidar do nosso corpo. Se há alguém que representa perigo para a nossa alma somos nós mesmos, na medida em que a mantemos afastada de Deus. Neste sentido, vale a pena lembrar de que quem, por descuido da sua fé, não tem medo de perder Deus, já perdeu tudo, inclusive sua alma.
            Jesus termina este Evangelho nos alertando que sempre chega o momento em que a nossa fé sai do âmbito pessoal e é questionada pelos outros. É quando temos que “sair de cima do muro” e dizer no quê consiste a nossa fé. “(...) todo aquele que se declarar a meu favor diante dos homens... Aquele, porém, que me negar diante dos homens....” (Mt 10,32-33). Só consegue se declarar verdadeiro cristão e discípulo de Jesus Cristo quem se libertou do medo de ser criticado, rejeitado, marginalizado e mesmo perseguido pelos outros. No fundo, a verdadeira ameaça à nossa fé não vem de fora (dos outros), mas de dentro (de nós mesmos): é quando ao invés de sentirmos um saudável orgulho em sermos reconhecidos como “pessoas de Deus”, sentimos vergonha em sê-lo.
            A título de conclusão, recordemos as palavras do papa Francisco aos jovens, no final da JMJ, ano passado: “Tenham a coragem de ir contra a corrente... Não tenham medo de ir e levar Cristo para todos os ambientes, até as periferias existenciais, incluindo quem parece mais distante, mais indiferente. O Senhor procura a todos, quer que todos sintam o calor da Sua misericórdia e do Seu amor”.

                                                                                                                                                 Pe. Paulo Cezar Mazzi



2 comentários:

  1. Missa Perfeita...Era exatamente o que precisava ouvir !!! O Senhor é um enviado de Deus !!!

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  2. Liberte=se do medo, o dinheiro resolve muitas situações mas nem sempre compra aquilo que constitui profundo desejo. Pode comprar por exemplo a cama, mas não o sono,; o livro, mas não a inteligência ou o saber; uma casa mas não um lar; ; o remédio mas não a saúde; a convivência mas não o amor; a diversão mas não a felicidade; o crucifixo mas não a fé, um lugar no cemitério, mas não o céu. Afaste se si o medo, vc não está abandonado como se fosse uma folha solta ao vento, Vc tem um Pai que é o seu criador. Ele o fez à sua imagem imprimindo-lhe a sua vida que é eterna, como a sua é eterna. Desde o dia em que vc começou a existir está vinculado ao seu criador por Ele assistido e guiado. Saiba que o amor de Deus por vc é infinito e não permitirá que se desgarre, se perca nem fique ao léu como se fosse abandonado. Pense e repita sempre na intimidade da sua alma que Deus te envolve em cada instante com o manto da sua proteção. A primeira e a pior de todas as fraudes é engana-se a si mesmo, portanto cuidemos de nossa alma.

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